"Kalininka e Mretieva brincam na lama"
Kalininka e Mretieva brincam
Na lama, sozinhas.
Não sabem de onde vieram
Tanto lixo, tanto barro molhado.
Sabem que estão sozinhas.
Mas não sabem que são
Os restos descartados
Da enxurrada, após ruir a
Barragem. Sequer sabiam da
Existência de uma barragem.
Elas não estranham não poder ver
Onde se fincam as suas casas.
Tudo é lama e destroços.
Elas não sabem que os dois mortos
Que levados são pela corrente
De argila e falha e politicalha
São seus pais de fato.
Kalininka, com cuidado, limpa
A face de Mretieva.
Elas sorriem. São pequenas ainda.
Por que será que escaparam
Do desastre? Por que se melam
Com argila e esquecimento?
Agora, passa um cão sem asas.
Um meio gato que era gato, decerto.
Olhem lá, observem bem,
O Sr. Trukov emerge do nada!
A Sra. Walenikova está sem os seus
Óculos importados, arrastada
Sendo pelo lodo sujo severo.
Pensam ambas as meninas:
Devem estar brincando qual elas.
Kalininka e Mretieva cansaram
Da brincadeira de fingir
Que não há apenas
Elas duas ali.
E sorriem. E andam atoladas
Na lama como se patas
Tivessem. E tropeçam.
Os helicópteros no alto!
Dizem juntas: eles também
Querem brincar no barro!
Elas não podem entender
Que tudo não passa
De um jogo baixo, nefasto.
E que, por baixo do barro podre e mesclado,
Seu vilarejo desaparece.
Os vestígios denunciarão os culpados.
A vida ferve!
A tristeza denunciará os culpados.
A lida não é leve!
A dor denunciará os culpados.
A lama já os molda - tudo é rápido!
A barragem desgastada
Denunciará os culpados,
Cedo ou tarde. Qual mágica.
Tudo é mesmo emendado!
Os corpos destroçados apontarão
Para os culpados.
Tudo é mesmo lama!
Até os bichos soterrados
Já soletram bem os nomes de todos
Os culpados. Os culpados!
Kalininka e Mretieva brincam, sozinhas,
Na lama, cansadas
De ver que só há lama. Não veem as lágrimas
Que delas saltam?
Lágrimas e lama. E lembranças.
Assim é o caos, assim é o nada.
Só Kalininka e Mretieva não sabem
Que somos todos os culpados.
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