segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Sóis de alegria"

"Sóis de alegria"



Estava a mágica
A construir
O nosso mundo.
Pressas, sentenças,
Planos, sentidos,
E, mais adentro,
Mesmo profundo,
Sutil silêncio.

Porém se houvesse
Prático tempo
Pra dar a volta
Bem por cima...
 - E todos querem
Dar uma volta 
Por si e acima -
Que dor não finda?

Jamais dissemos
Do nosso intento.
Claro é o amor.
Riso e rompantes,
Numa avalanche.
Rimas a dois
Para depois,
O que restou

Ao coração,
Estrada afora,
Mera metáfora,
Antiga anáfora,
Leve ilusão
Que se constata
No tudo-nada
Duma palavra.

Essa que falta,
Essa que brilha
Além da vista,
Do olvido amiga,
Incapturável,
Qual astro, alta,
Inatacável,
Por nossos lábios.

O instante intacto
Rasgando a carne
Da eternidade,
Por nós havia.
Versos rasgávamos...
Éramos tanto
O pranto quanto
Sóis de alegria.





quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Ante os sons do lar"

"Ante os sons do lar"

Do infinito, o sol
Observa o poeta:

Quem lerá a lida
Desse ser na Terra,


Que fará, de grande,

No último instante,
Quando ofusco os seus 

Sumos de sentidos,

Furtando-lhe as noites?
Vigora o silêncio
De grafite, entre
As gretas de luz...

A pino, periga
Sangrar, em calor,
O dia-metâmero,

Ante os sons do lar.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "O amor medido" -

"O amor medido" 


Nem Eros poderia
Mostrar, ao certo, o quanto
Nem a artimanha de
Verter o coração,
Esse bater estranho
No peito, quase nó
Na garganta do agora,
Na língua de grafite.
Somente da alegria
De um verso viria
O alento - Erato o disse:

"O amor é mesmo só,
Raro ramo de vida,
Rastro da amplidão quântica
Que se instalou no âmago
Das chances já perdidas."
E eu sou muito só
Também, e tudo acerta-me.
Dez para qualquer tempo,
E a contraprova dos 
Noves de novo falha.
O amor é uma lágrima.

Amar é amar e
Ponto de exclamação!
Pois bem: conheço onde 
O infinito se aloja.
Na tua atenta boca 
Que me falta, na carne
Astuta que me espanta,
No fogo do teu nome,
Na palavra amor, claro,
Com todos os enganos. 
E as armadilhas? Todas!

Pra os venenos que abriga
O amor não há antídotos.
Assim, por amor, trilho
Pelo atalho que dá
No vasto labirinto
De vontades que vale
A tarde que perpassa,
Algum prático norte
Que, logo, me recolhe.
Motivos pra medi-lo 
Com conceitos ridículos.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Regras para não fazer um poema de amor"

"Regras para não fazer um poema de amor"


Primeiro, jamais exija a 

Reciprocidade. O verso
Requer é luz, amplidão.

Segundo preceito: regra não
Serve, a vida intempestiva
Das metáforas não basta, 


Pra existir não presta a pressa, 
Porque parece que em tudo 
Amor há, que o amor impera.

A última tentativa... 

Impossível construir 
Um poema sem cair

No infinito precipício

Dos tempos e contratempos
Do ritmo do coração.


segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Um poema para depois"

"Um poema para depois" 



Pensei: fazer outro soneto
Para quê? Para dar à lida
A parte que fora perdida
Em mim? Pra não ver obsoleto

O espectro de quem me sinto,
Entre os versos? Ainda alheio
Ao que construir, (De qual meio
Preciso?) o poema distinto

Vem emergindo, alegremente.
Mas em que solo se arquiteta
A sua mágica, e que seta

Atinge-me e tinge-me a mente
E o tempo, inexplicavelmente,
Alçando-me ao infinito, à  meta?



sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Outra sinapse insólita"

"Outra sinapse insólita" 


Penso.

Pêndulos,
Pesos,
Pousos,

Pautas. 
Prática, 

A arquitetura esvai-se,
O instante entrecortado 

Por canais de potássio e
Sódio, tal qual um grito
De silício, contido,
Preso às largas laringes


De grafite, ao cobalto, 

Ao casto cosmo azul.
Seria a folha em branco o
Velocino de ouro, o
Amor entre as metáforas,

O mistério que valha?

Outro verso revolto,

Pouco a pouco, devolve-me
Ao ser outro de mim,
Sintático, sintético,
Simulacro de fins,
E o véu voa, esvoaça. 


Aqui, na minha casa,
Todas coisas estão 

Acompanhadas, mas
O sol da solidão
Logo me agarra, e, enfim,

Constato: tudo raia e

Salta:
Tálamo,
Tela,
Tato,

Tempos,
Traumas.





Adriano Nunes: "caos aquático" - Para Lara Amaral.

"caos aquático" - Para Lara Amaral



o céu
se solta
água nuvem fúria vento

atento
meu olho
admira a ira do tempo

a vida
cansou
de ser pedra areia cimento

agora
a chuva
esvai-se súbita, vendo

o solo
sugar
os restos do que me penso.






quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Poesia"

"Poesia"


Poesia não é.
Há de ser um dia,
Qualquer coisa ou

Coisa alguma,
Mata virgem, arco-íris, ventania,
Urso de pelúcia, moldura antiga,
Casca de ferida,
Âmago de ululante alegria,

Labirinto

Em que me penso,
Em que me peso,
Em que me pesco,


O Touro de Minos e tudo
Que minto e pronto

Pondero: Que não seria,

Enquanto outro dia
De método e melodia

Em que me sustento,
Em que me sufoco,
Em que me suporto e


Violentamente me sinto,

Óvulo do inesperado,
Óbvio do que quer ser inviolável,
Ovni e desordem,

O mínimo: o mundo mútuo

De signos e significados,

Aquela ida à
Seção de perdidos e achados?
Um achado.




Adriano Nunes: "tanto quanto agora" - Para Fernando Campanella.

"tanto quanto agora" - Fernando Campanella.



entre o imenso lago
e a pequena folha,
o verso me observa.

solto de si, imerso
na contemplação,
o instante encerra

a vida. nem mesmo
o infinito dura
tanto quanto agora.







quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Segundo tempo"

"Segundo tempo"


Pensei, pensei, pensei... E era tudo
Artimanha sináptica,
Trama arquitetada


Pela solidão.
Andei
Um pouco


Pelas avenidas das vaidades, perto
Da orla dos orgulhos, antes da
Hora de decisão:

A meta poderia até dar certo, 

Mas o tédio, a dor, a enraizada raiva,
O ciúme, a cena vista - filtrada


Pelo lobo occipital
Ou imaginada? -
Tudo, tudo, tudo durou mais


Do que poderia, durou
Um segundo a mais, dourou
O que em mim fez-se alma e algaravia.

Voltei
Sem sequer me desvencilhar da ideia.
Era a melhor? Era


O que era e era ter dúvidas de mim
E de toda a roda-viva
Em volta, ante o estopim no peito.

Cerco fechado. Atento 

À vida que não mais teria,
Pus-me a amalgamar a margem do engano  e a


Verter a vida da vida noutra
Alegria. E, 

À socapa,  dormi,

Entre pernas e braços
 - Nunca mais me reconheceria -
Conhecidos. Depois,

Raiaria o dia:
Um corpo exposto, confuso, completo,
Cansado, a planejar dentro do sono


Um pedido de desculpas

Para o ser amado, 
Fazer um poema, 

Ter o prazer de fazer 
Apenas um poema. E, 
Ao leitor traidor, dá-lo. 


Adriano Nunes: "reverso"

"reverso"



ɐuɐƃuǝ ǝs

ɐɯɐɥɔ
oɯns


ɐɯɐ ǝʇ nǝ






sábado, 8 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "um pouco"

‎"um pouco"




queria outro
corpo
outra hora para outra
esperança
outra
paisagem
mudança
outro fim
de semana de luz
queria a luz
imensa luz
imensa verdade de
luz
outra estória
menos repetitiva
a mesma
estória
de quando eu era...

mas eu nunca fui
eu nunca passei por ela
eu nunca
tentei passar
por mim... outro
instante
rompendo o dia
outro
semblante conhecido.
outra vez
(eu
chorando aqui em casa
e ninguém
por perto) a vida,
essa quimera
corrosiva...

ai, a cicuta!
quem me dera e eu
queria
outra chance
de dizer aquele tempo
de dizer aquela vontade
de dizer
que era para estar
à espera de um ponto qualquer
e ...
era eu a cantar a existência
de tudo
e a querer
um único milésimo de segundo
para
perdoar as minhas faltas...

e era outro
a morrer em mim
enquanto me penso
enquanto
pondero
peso
espanto-me:
nada mais sou
nem ouso.






sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "Desejo"

‎"Desejo"


Querer
Que um outro
Bem toque 

Meu corpo -

O teu...
E o meu
Sentir-me
Só, solto.


O eco
De um beijo
Esperto,

O sexo

Completo.
À vez,
O gozo

Do olho

Por todos

Os lados
Do próprio
Pensar.

A mão

Na mão,
O dente
No lábio -

Sináptico
Fulgor

Que se
Formou

Na tarde em
Que te
Sonhei
Em mim.

Alegre 

Meu sonho!
Que agora
Exponho

No verso
Pra ver
Se te
Revelo e

Recordo-te  e
Retenho-te,
Num gozo
Estético.


quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Adriano Nunes: "a lágrima"

"a lágrima"



depois
nós dois
perdemos
os remos
e o cio...

não era
a esfera
aquática,
temática
do rio.

o rio
não era,
a fera
das margens,
vazio.