sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Adriano Nunes: "O fotógrafo" - Para Tiago Pires Corrêa

"O fotógrafo" - Para Tiago Pires Corrêa



Da lente cristalina à vítrea lente,
O liame, o lance, o além, a lembrança,
Alguma coisa que nunca se alcança,
O frágil ver que se esvai conivente.

Da retina, a rotina, a leve dança
Das imagens, o que se quer presente,
O nítido registro, o inconsciente
Que interage, que sobre a vida avança.

Eis revelado o gozo, o gesto gasto,
A paisagem do pensar, o momento
A modelar-se, à máquina, sedento.

A foto não seria um sentimento,
Pelo argênteo nitrato, pelo vasto
Circo cromático, do amor o rasto?

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Adriano Nunes: "Cego interesse"

"Cego interesse"



Como se opor
À lida desse
Cego interesse,
Álacre amor?

Além de amor,
À vida desse
Certo interesse, 
O que propor?

Que se quer para
Satisfazer
Labor, lazer,

O que separa,
De forma clara,
Pranto e prazer?

domingo, 17 de novembro de 2013

Adriano Nunes: "À semelhança de um conceito"

"À semelhança de um conceito"



Porque provaram existir o amor,
Todos passaram a cumprimentar-se,
Num sincronismo alegórico, até
Mesmo tedioso, mas era a festa
Do amor e seu magno império de luz.

Os jornais declaravam: não é farsa
Nem ilusão, vive-se o impressionante
Tempo da Ciência, tudo está à prova!
Depois, por analogia, provaram
Haver deuses, o além, o aquém, etês.

E ergueram monumentos, grãs estátuas,
O íntimo ordenaram, pelas  leis
Da igualdade dogmática criaram
Cartilhas destinadas a moldar
Todos à semelhança de um conceito

Que fora proclamado por miríades
De seres que se afirmavam eleitos,
Os membros da amórfica maioria.
Como robôs feitos em série, eram
Símiles: roupas, gestos e pensar,

Cantavam a existência incontestada
De tudo e não sabiam que eram máquinas.
À mercê da astúcia, da adequação,
Era vital ser igual, dar-se à máscara
Das quânticas quimeras, porque estava 

Provado que o ser humano existia.
Queimavam  rebeldes, pela igualdade!
Os livros recolhiam, pela igualdade!
A opressão, a exclusão, pela igualdade!
A miséria, a morte, pela igualdade!








sábado, 9 de novembro de 2013

Adriano Nunes: "Pétrea tradição"

"Pétrea tradição"



Aprendemos, cedo,
Que preciso era
Remover as montanhas, todas ela.
Era o magno milagre da existência
Poder dar às montanhas outro templo.
São montanhas as montanhas, decerto,
Querem junto ao ápice o firmamento,
Nuvens como coroas reais querem.
E fiéis à pétrea tradição ser.
Que se movam nossas taras e metas.
Tudo em nós aparenta mesquinhez.
Tudo em outro nos desafia sempre.

Áurea flor desabrocha, longe, além...
É preciso através do olhar colhê-la,
Vertê-la em contentamento, em um verso.
Sóis se somam... Prova-nos o mover
Visto de dentro da calota, o édito
Quântico dado ao âmago, de vez.
Ai, eis que agora a mágica é desfeita
E, ser montanhas, todas elas, vemo-nos,
Com  nossos preconceitos tão concretos,
Com nossas hipocrisias tão retas,
Com a nossa ganância tão desperta!
Que deuses pretendem obter deveres?