terça-feira, 30 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "A verte-se em ver"

"A verte-se em ver"


Primavera. O verde
A verter-se em ver,
Na vontade de
Ser mais que o amarelo
Dos girassóis e
Do sol, ser mais que
As pétalas pétreas
Do imenso desejo
Que é ter o amor perto.
Flor tão bela! Ó elos
Abertos pra o fértil
Poder que contém
A amplidão de um verso!

Adriano Nunes: "Dice" - (para todos que acreditam em Diké)

"Dice" - (para todos que acreditam em Diké)



Depois de tanta
Espera,
Eis que canta
Alto e contente
A esperança,
Sob o auspício
Da primavera,
Ante os portentos
Que afloram
Do que me penso
E sinto, que, pelo
Passar das horas,
Mostra um indício
De que a balança
E a espada
Seguramente são
Sustentadas
Pelas mãos
De Dice,
Para que os homens,
Sem exceção,
Sobre tudo que existe,
Nela acreditem.
Como eu agora.



segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Ó paupérrimo pensar!"

"Ó paupérrimo pensar!" 



O pensamento programa
O pensamento procria
O pensamento persiste
O pensamento prossegue

A poesia é que é leve

O pensamento perpassa
O pensamento promete
O pensamento projeta
O pensamento propaga

A poesia é que é larga

O pensamento pergunta
O pensamento posterga
O pensamento promove
O pensamento palpita

A poesia é que é límpida

O pensamento pragueja
O pensamento permite
O pensamento pondera
O pensamento perscruta

A poesia é que é luta

O pensamento planeja
O pensamento proclama
O pensamento padece
O pensamento protela

A poesia é que é léxica

O pensamento parcela
O pensamento partilha
O pensamento pastora
O pensamento produz

A poesia é que é luz

O pensamento perturba
O pensamento pesquisa
O pensamento perverte 
O pensamento pontua

A poesia é que é lua

O pensamento precisa
O pensamento prefere
O pensamento protesta
O pensamento perece



domingo, 28 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Ode To Oblivion"

"Ode To Oblivion"


Give me, Erato,
Thy lyre
For that 
I can sing a verse
Of love,
So that
The night dissipates
And does not leave
In my head
Any fear
That love is
Worth nothing.

If thou canst not,
Say to Euterpe
That I need
Her flute,
So that
The night ends
And does not leave
In my heart
Any impression
That love does not
Befit
What I wish.



Adriano Nunes: "Ode ao olvido"

"Ode ao olvido"


Dá-me Erato
Tua lira
Para que
Eu fazer
Possa um ver-
So de amor,
Para que a
Noite esvaia-se
Sem deixar
O temor
De que o amor
Nada valha.

Se não podes,
Dize a Euterpe
Que me empreste
Logo a flauta,
Para que a
Noite cesse
Sem deixar
O vestígio
Em meu íntimo
De que o amor
Pra o que almejo
Já não serve.



sábado, 27 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Intrépido Tritão" - Para Gabriel Medina

"Intrépido Tritão" - Para Gabriel Medina


Toda onda,
Da costa oeste americana
Às praias quânticas de Atlântida,
Parece tão pequenina
Para o menino Medina,
Intrépido Tritão
De São Sebastião,
Deliciosa poesia
Que do mar mina.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

T.S. Eliot: "Eyes that last I saw in tears"

Olhos que por fim em lágrimas vi (tradução de Adriano Nunes)


Olhos que por fim em lágrimas vi
Através do corte
Aqui no reino onírico da morte
Reaparece a áurea visão
Eu vejo os olhos, as lágrimas não
Isto é minha aflição.

Isto é minha aflição
Olhos que não verei mais
Olhos de decisão
Olhos que não verei senão
À porta do outro reino da morte
Onde, como aqui,
Os olhos sobrevivem por breve data
Por breve data sobrevivem as lágrimas
E abraçam-nos com deboche.


T.S. Eliot: "Eyes that last I saw in tears"

Eyes that last I saw in tears
Through division
Here in death's dream kingdom
The golden vision reappears
I see the eyes but not the tears
This is my affliction.

This is my affliction
Eyes I shall not see again
Eyes of decision
Eyes I shall not see unless
At the door of death's other kingdom
Where, as in this,
The eyes outlast a little while
A little while outlast the tears
And hold us in derision.


ELIOT, T. S. The Complete Poems and Plays: 1909-1950. San Diego: Harcourt Brace Jovanovich, 1971.

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Et cetera" - Para Marcelo Diniz

"Et cetera" - Para Marcelo Diniz


Há quem
Com versos
Completa-se.
Ser pode
Leitor.
Espera-se
Que seja
Poeta,
O que
A arte
A si
Agrega.
Por isso,
Consigo
Conversa e
Contente
Conserva-se


E faz
Valer
A vida e
Dá vez
À voz
Que estava
Retida
No abismo
Mais íntimo -
Semente
Dispersa
E o vento
Que a leva,
A mágica
Que nasce
Das primas
Sinapses,

A foz
Estética
Pra tudo,
Que é
Capaz
De tudo,
A verve
Voraz
Que gera
Mil mundos,
Teus mundos,
E os deles,
E outros
Que só
O verso
Encerra,
Et cetera.

Guillaume Apollinaire: "Un poème"

"Um poema" (Tradução de Adriano Nunes)

Ele entrou
Ele sentou-se
Ele não vê o pirógeno nos cabelos rubros
O fósforo flamba
Ele partiu



"A poem" (Tradução para o inglês por Adriano Nunes)

He came in
He sat down
He does not look at the pyrogenic in red hair
The match flambes
He went out



Guillaume Apollinaire: "Un poème"

Un poème

Il est entré
Il s'est assis
Il ne regarde pas le pyrogène à cheveux rouges
L'allumette flambe
Il est parti


APOLLINAIRE, Guillaume." Il y a". In:____. Poèmes à Lou. Préface de Michel Décaudin. Paris: Gallimard, 2014, p. 67.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Para o que se quer"

"Para o que se quer"


Depois do analgésico e
Do chá de cidreira,
De algumas promessas
A santas diversas,
Ao Olímpico e a Hera,
Às musas estéticas,
Depois de querer
Arrancar meu cérebro
E lançá-lo a Cérbero,
De sentir que certo
Nada dava, que
Mágica nem prece
Resolveram mesmo,
(Ou sob todo efeito?)
Passou a enxaqueca.
Que alegria intensa
Sinapses bem ter
Para o que se quer
Fazer, como um verso!

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Adriano Nunes:"Primavera" - para a minha amada mãe

"Primavera" - para a minha amada mãe


Os crisântemos
Do que prezo.
Girassóis
Do que penso.
Margaridas
Do que canto.
Violetas
Do que sinto.
Dálias rubras
Do que quero.
Alvos cravos
Do que busco.
Rosas rosas
Do que trago.
Lácteos Lírios
Do que lembro.
As papoulas
Do que posso.
As orquídeas
Do que invento.
As cravinas
Do que sonho.
Os narcisos
Do que amo.
Azaleias
Do que verso.
Toda flor
Do que sou
A abraçar -
Quem me dera! -
Cada pétala
Da palavra
Primavera
Que me estreia.
Bem-me-quer?
Mal-me-quer?



Adriano Nunes: "O que soa" - Para Leoni Siqueira

"O que soa" - Para Leoni Siqueira


De passagem,
A paisagem
Não escapa
À retina
Que, esperta,
Tudo capta.

Assim, de
Bicicleta.
O que soa
Poesia
Na lagoa,
Pra quem via.

Uma imagem
Da alegria!

Adriano Nunes: "Song for later" - To Caetano Veloso

Adriano Nunes: "Song for later" - To Caetano Veloso



Song for later



This is
My song,
Glad song.

With it
I will 
Be young.

I will
Sing it
For a

Long long
Long time
It's mine!

Because
It is
The song

That plays
In my
Free mind,

It plays
For me
No end.

This is
The song
That I

Did, here,
Alone,
With stanzas

Of three
Short verses,
My heaven.

This is
What I
Think I

Know just
Can do
For thee,

So little!,
My light,
Poetry!




domingo, 21 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Nem apenas as serpentes sinápticas"

"Nem apenas as serpentes sinápticas"




Do que me peso, penso e sinto,
Surge súbito labirinto.


Nele não há só o Touro de Minos.
Nele não há só fios de Ariadne.
Nele não há só os tortos caminhos
Que me engendram todo, roto e sozinho.


Nem apenas as serpentes sinápticas
Do engenheiro alado, o progenitor
Do jovem pelo sol apaixonado.
Nele não há só as pedras erguidas,


O líquen, o lodo, o liame, a lábia
De Teseu. Nem só os véus e os vestígios
Das vísceras das virgens devoradas.
Nele não há só a praia de Creta 


À minha espera, nem o cosmo alto
Que dizem ser, do Deus do raio, o paço.
Ou sequer a vista das velas que
Voltarão vivas e negras à Grécia.


Desse emaranhado, báratro infindo,
Salta, bem mais do que o salto de Egeu

Ao mar, além do meu corpo, um eu outro,
Labirinto ligado a labirinto, 


A áurea aurora, o ritmo e o risco de
Querer saber de mim, ao menos, ode

Ao íntimo, do homem ao menino,
O elo que ainda não se perdeu.






sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Guillaume Apollinaire: "Épigramme"

"Epigrama" (Tradução de Adriano Nunes)


Minha jardineira adorada,
Tu que almejas saber por que
Em tuas costas nem triscada,
Como sei, dás a desconhecer
Que jamais se bate em mulher,

Sim, Senhora, com Flor Rara sequer.

Guillaume Apollinaire: "Épigramme"

Épigramme

Mon adorable jardinière
Toi qui voudrais savoir pourquoi
Nul ne tape sur ton derrière
Ne sais-tu donc pas comme moi
Qu’il ne faut pas battre une femme

Et même avec une Fleur Rare oui Madame




APOLLINAIRE, Guillaume. Poèmes à Lou. Préface de Michel Décaudin. Paris: Gallimard, 2014, p. 229



quarta-feira, 17 de setembro de 2014

William Carlos Williams: "A Sort of a Song"

"Um tipo de canção" (Tradução de Adriano Nunes)


Deixe a serpente esperar sob 
a erva daninha 
e a escrita 
seja de palavras, lenta e ágil, afiada 
para atacar, calma para esperar, 
insone. 
- Através de metáforas para reconciliar 
as pessoas e as pedras. 
Componha. (Sem ideias
mas nas coisas) Invente!
Saxifraga é minha flor que quebra
as pedras.



William Carlos Williams: "A Sort of a Song"



A Sort of a Song

Let the snake wait under
his weed
and the writing
be of words, slow and quick, sharp
to strike, quiet to wait,
sleepless.
-- through metaphor to reconcile
the people and the stones.
Compose. (No ideas
but in things) Invent!
Saxifrage is my flower that splits
the rocks.



WILLIAMS,William Carlos. The Collected Poems of William Carlos Williams. Edited by A. Walton Litz and Christopher MacGowan. W W Norton & Co Inc, 1991.

Adriano Nunes: "Solilóquio"

"Solilóquio"


Que correto
O centauro
Nesso esteja.

Não é fácil
O amor ver
Apartado

Do meu peito,
'Inda que
Perto. Creio

Refazer
Novo leito
De desejo.

Jovem, ela,
E tão bela!
Desespero-me

Por ti, Héracles,
Estou cega,
Sem remédio!

Que algazarra
Alta chega
Pelas áreas

Do castelo?
Que portento
Ou veneno

Hermes traz-me,
Que dor vem
Apressada

Atacar-me
Fundo, certa
De que errei?

Leonard Cohen: "Love Is A Fire"

"Amor é chama" (Tradução de Adriano Nunes) 


Amor é chama
Todos inflama
Todos deturpa
Do mundo a escusa
por ser feio


Leonard Cohen: "Love Is A Fire"

Love is a fire

Love is a fire
It burns everyone
It disfigures everyone
It is the world's excuse
for being ugly



COHEN, Leonard. Poems And Songs. Edited by Robert Faggen. London: Everyman's Library, 2011, p. 102.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Leonard Cohen: "Gift"

"Presente" (Tradução de Adriano Nunes) 


Dizes-me que o silêncio
está mais perto da paz do que os poemas
mas se por meu presente
Trouxesse-te o silêncio
(pois conheço o silêncio)
Tu dirias
Isto não é o silêncio
isto é um outro poema 
e devolvê-lo-ias para mim.



Leonard Cohen: "Gift"



Gift

You tell me that silence
is nearer to peace than poems
but if for my gift
I brought you silence
(for I know silence)
you would say
This is not silence
this is another poem
and you would hand it back to me





COHEN, Leonard. Poems And Songs. Edited by Robert Faggen. London: Everyman's Library, 2011, p. 31.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Erga omnes"

"Erga omnes"



Eu com
O tempo,
Um pacto.

Eu com
O olvido,
Compacto. 

Eu sem
O amor,
Que impacto!

Eu, só,
Sem mínimo
Contacto.

Eu com
Migalhas,
Um facto.

Eu só
Comigo,
Intacto.




Adriano Nunes: "Jus constitutum"

"Jus constitutum"


Eu com
A coisa,
Um facto.

Eu com
Um outro,
Um pacto.

Eu só
Comigo,
Intacto.

domingo, 14 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Carta a Circe"

"Carta a Circe"


Da alma
À carne
Aflita,
Lancei-me
A átimos,
A istmos,
A ímãs,
Atado
A um mastro.
Mar alto!

Do íntimo
Azul
Virente
Da água
À proa,
Caríbdis
E Cila,
Calíope e
Cantigas...
O fado!

Dos lábios
Da orla
À aurora,
A voz
Vazava,
A íris
Buscava
A areia
Da praia.
Eu, náufrago

Em Ítaca!
A volta
Sonhada
Ou medo
Do tudo
Ou nada?
Penélope
Bordara
Do amor
Os cacos!




quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Cantada"

"Cantada" 


Eis a noite
Sem estrelas,
Fria e feia.

Falta um átimo,
Teu langor
Pra compor-nos

Sem transtornos,
Língua a língua,
Na entrelinha

Das delícias
Desmedidas,
Das carícias

Mais ariscas,
Tara e teia
Que à tez somos,

Teu calor,
Qual um átomo
De plutônio.




terça-feira, 9 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Neither the tricuspid valve"

"Neither the tricuspid valve"



O, see, my heart, 
Naive heart! 
At first 
You gave to love 
All chordae tendineae , 
Not even sweet words work. 
After the mitral valve.
What can still save you?
The left ventricle
Was made a toy.
The aorta and vena cava,
With which you delighted
The body, from neck
To the hallux bone,
You gave them, in a hurry!
Do you understand that to
This love only
Matters what must turn dust?
And thus you donate
Your coronary arteries.
What arbitrary
Decisions! My Heart,
Foolhardy heart!
What should be done?
The burden of each
Repeated heartbeat
Attached to the mediastinum
Does not serve for anything.
You do not have reason.
You have been in prison.
O, see, my heart,
Unstable heart,
Why do you want the illusion of
A contraction to run from love?

Adriano Nunes: "Nem a valva tricúspide"

"Nem a valva tricúspide"



Ó, vê, meu coração, 
Ingênuo coração! 
Primeiro deste ao amor
Todas as cordoalhas,
Mas nem cantada calha.

Depois, a mitral valva.
O que ainda te salva?
Do ventrículo esquerdo
Fora feito um brinquedo.
A aorta e as veias cavas,
Com as quais encantavas
O corpo, do pescoço
Até o hálux osso,
Entregaste, com pressa.
Percebes que interessa
Ao amor, esse amor, só
O que ir deve ao pó?
E, assim, as coronárias
Doaste. Que arbitrárias
Decisões, Coração,
Incauto coração!
Que bem fazer então
Resta? Para que a lida
De baques repetidos,
Presa ao mediastino,
Se não tens sequer tino?
Ó, vê, meu coração,
Instável coração,
De que vale a ilusão
De com a contração
Tirar de ti o amor?




Adriano Nunes: "Que me absorve, e leva"

 "Que me absorve, e leva"



Pela janela, a aurora observo.
Zéfiro que chega,
A áurea beleza
Exposta, co' engenho, 
Por Apolo, o deus
Gerado de Leto,
De Zeus, predileto.

Um ignoto ver
Que me absorve, e leva
Vidas ao meu verso.
Claro renascer
Para tudo, o que
Em mim bem retenho,
Os desejos meus,

O que se conserva.
Pela vidraça, a manhã vejo.
Talvez seja Eros
Que agora aparece.
Ou serás tu que
Ouviras o apelo
Dessa minha prece?

O amor? Como tê-lo
Muito além do peito,
Do que nem desfeito
Pode mesmo ser?
Tudo resplandece.
Tudo se aconchega
No olhar, com leveza.





Adriano Nunes: "Ode a esta alegria"

"Ode a esta alegria"



Enquanto me decanto
Com o que amo e canto,
De rimas, minha lida
Ecoa construída, 

Nada mais fere tanto,
Nem promessa nem pranto.
De ritmos, minha vida
Povoa-se, e incontida

Lança-se à folha em branco,
Cobre-se da alegria
Qu' eu sequer poderia
Imaginar, sou franco,

Haver no mundo, um dia.
Ei-la: um saltimbanco
Que finge ser o manco
Baco, numa comédia.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Às dez e seis em ponto"

"Às dez e seis em ponto"


Ele, o funcionário número um.
Sabe todos os prazos.
Sabe todas as regras.
Não sorri, não acena
Pra ninguém em seu reino
De Ninguém. Vez ou outra
Escuta ser chamado
Disso, daquilo, de ser burocrata.
Ajeita o terno bem
Alinhado, e até o nó na gravata.
E tudo segue e passa.

E tudo passa e segue.
E carimba e despacha.
E despacha e carimba.
Olha atento pra os lados.
E despacha, e carimba e
Despacha. Tudo às claras.
Dez dias! Trinta dias!
Trinta dias! Dez dias!
Sem autentificação. Sem recibo.
O prazo está vencido.
Noutra sessão. Repito:

Não é comigo! Recibos!
Ele, o funcionário número um.
Sempre a cumprir as ordens
Que vêm de cima e acima.
Sempre a cumprir as ordens
Que nem mesmo sabe de quem. É quem?
Sabe todas as regras.
Sabe todos os prazos.
Eis a regra: a quase tudo se nega
Se não estiver rigorosamente
No estatuto vigente.

Duas horas para o almoço.
Nada conversa que não seja a meta
A ser cumprida. A vida
É um exemplar ponto sem atrasos.
Nunca precisou esquivar-se de
Protocolar atestados, licenças.
Não tem tempo pra papo
Que queira convencê-lo
De urgência ou emergência.
Hoje não veio ao trabalho.
Duas pontes de safena.