quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Adriano Nunes: "Às dez e seis em ponto"

"Às dez e seis em ponto"


Ele, o funcionário número um.
Sabe todos os prazos.
Sabe todas as regras.
Não sorri, não acena
Pra ninguém em seu reino
De Ninguém. Vez ou outra
Escuta ser chamado
Disso, daquilo, de ser burocrata.
Ajeita o terno bem
Alinhado, e até o nó na gravata.
E tudo segue e passa.

E tudo passa e segue.
E carimba e despacha.
E despacha e carimba.
Olha atento pra os lados.
E despacha, e carimba e
Despacha. Tudo às claras.
Dez dias! Trinta dias!
Trinta dias! Dez dias!
Sem autentificação. Sem recibo.
O prazo está vencido.
Noutra sessão. Repito:

Não é comigo! Recibos!
Ele, o funcionário número um.
Sempre a cumprir as ordens
Que vêm de cima e acima.
Sempre a cumprir as ordens
Que nem mesmo sabe de quem. É quem?
Sabe todas as regras.
Sabe todos os prazos.
Eis a regra: a quase tudo se nega
Se não estiver rigorosamente
No estatuto vigente.

Duas horas para o almoço.
Nada conversa que não seja a meta
A ser cumprida. A vida
É um exemplar ponto sem atrasos.
Nunca precisou esquivar-se de
Protocolar atestados, licenças.
Não tem tempo pra papo
Que queira convencê-lo
De urgência ou emergência.
Hoje não veio ao trabalho.
Duas pontes de safena.




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