domingo, 28 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Paralaxes"

"Paralaxes"


Eram tardes
De dragões
E libélulas
Sobre a pele,
Uns rabiscos
No caderno
De esperanças
Demais gastas,

Tudo para
Ver se era
Tudo ou nada,
Para ver
Se você
Retornava
Do infinito
Das palavras.

Outros flertes...
Paralaxes
Para a arte
Que se vale
Da saudade?
Era isso:
Tara e olvido,
Ser que salta.

sábado, 27 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Noite"

"Noite"


Noite,
Faz-te
Nave,
Asa
Ou
Ágil
Vento,

Leva-me,
Logo, ao
Átrio
Do
Que
Sinto e
Penso,
Ao
Íntimo
Metro
Do
Que
Mais
Quero,
Deixa-me
Dar
Nós
No
Rabo
De
Cérbero.
Noite,
Faz-te
Mágica
Para
Tudo
Ser
Verso!

Adriano Nunes: "Memória"

"Memória"

Que bom
Que há
A dor,
O rito
Viável
Do que
Conduz
Depois
O ser
Àquele
Sentido
Exato
Que nos
Afirma
Que tudo
Passou,
Sem farpas.
De cada
Vez, uma
Pegada,
Um passo.
Passou!

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Ars poetica"

"Ars poetica"


O verso
Não salva
Ninguém.
Porém
Também
Não mata
E nem
Coloca
A corda
Atada ao
Pescoço.
Parece
Bem pouco?
Não é!
Sequer
Empurra
Alguém
Da beira
Do abismo.
Ou súbito
Dá tiros
Letais
No ouvido.
O verso
É isso
E mais:
Não serve
Pra nada e,
De modo
Insólito,
Além
Do óbvio,
Dá mesmo
As cartas.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "O outro"

"O outro"


O outro.
A face
Do outro,
A voz
Do outro,
O sol
Do outro,
A paz
Do outro,
O gosto
Do outro,
O cheiro
Do outro,
O olhar
Do outro,
O jeito
Do outro,
O tudo
Do outro,
O todo -
Por que
Quiseste
Ser sempre
O outro
Em vida?
O outro -
Por que
Irrita-te
Não-ser?
Não há
Consolo,
Não há
Remédio,
É sério.
Não há
Saída.
Não há
Sequer
O que
Fazer.
O outro
Não pode
Ser mesmo
Teu ser.

Adriano Nunes: "As tripas de Argeon"

"As tripas de Argeon"


Não pode Argeon correr mais,
Com as próprias tripas nas mãos.
Sangue e fezes, fezes e sangue,
A vida posta à vista, atada
À exigência do tudo ou nada.
Não pode Argeon gritar mais.
Não há ar nas cordas vocais.
O mundo por fazer deixado
De lado, entregue aos deuses sádicos.
O suor fede, fede o hálito
Das esperanças arruinadas,
As quimeras sem voz, sem asas,
Tudo intestinamente vago,
Tudo excerto de ação e falha,
Tudo tralha velha e descaso.
Insiste em correr, mesmo em vão,
Argeon. É o tudo que o caça!
É a senhora na janela, estática,
É a criança anêmica, frágil,
É o desejo de todos, claro,
E a inveja - o espetáculo da
Violência, da crença na espada
Esperta, na afiada lâmina.
Argeon corre! Corre rápido!
Esquece as tripas! Toda Esparta!
Atira-te à saída, ao mar!
Esquece a Grécia, as grãs estátuas,
As Parcas repletas de mágoas,
De Zeus as estripulias práticas!
Corre, Argeon! Vê se te salvas!
Vê se podes salvar a carne
Do absurdo, os ossos da palavra,
A pele dos sentidos, dos lapsos!
Segura bem essas entranhas,
Essas tripas sem dono, vai
Aonde puderes, do cais
Da alegria além dos recantos
Intactos do ser à virada
Página do que queres tanto!
Eles querem-te nu, na praça,
Exposto, pra hienas e aves.
Porque querem-te eles sabem.
Foge, corre - cadê as armas?
As tripas jogarás na face
De todos? És tolo! Sim, parte!
Corre, são lobos que virão
De teus planos e sóis atrás!
Argeon, corre! Firme amarra
Essas vísceras podres já!
À existência algum troco dá!
Vê se ainda de ti escapas!


Adriano Nunes

sábado, 20 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Manhã"

"Manhã"

Sol tímido
E canto
De pássaros.
Princípios.
Proezas.
Promessas.
A vida
Refaz-se
Completa,
Às pressas.

Adriano Nunes: "Dawn"

"Dawn"


Shy sun
And song
Of Birds.
Preludes.
Prowesses.
Promises.
Life is
Renewed
Completely,
Promptly.

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Thomas Hardy: "Moments of Vision" (Tradução de Adriano Nunes)

"Momentos de visão" (Tradução de Adriano Nunes)


Esse espelho
Que faz dos homens uma transparência,
Quem o sustenta
E oferta-nos tal espetáculo de peito aberto para ver
De mim e você?

Esse espelho
Cuja mágica penetra como um dardo,
Quem o ergue
E lança nossa mente de volta sobre nós, e nosso cerne,
Até começarmos?
Esse espelho
Opera bem nas horas noturnas de dor;
Por que nesse espelho
Somos tingidos nós nunca nos vemos decerto
Quando o mundo está desperto?
Esse espelho
Pode testar cada mortal, quando desatento;
Sim, esse espelho invulgar
Pode captar falta de vida ou beleza, últimos pensamentos
Refletindo-o – em que lugar?


Thomas Hardy: "Moments of Vision"


That mirror
Which makes of men a transparency,
Who holds that mirror
And bids us such a breast-bared spectacle to see
Of you and me?
That mirror
Whose magic penetrates like a dart,
Who lifts that mirror
And throws our mind back on us, and our heart,
Until we start?
That mirror
Works well in these night hours of ache;
Why in that mirror
Are tincts we never see ourselves once take
When the world is awake?
That mirror
Can test each mortal when unaware;
Yea, that strange mirror
May catch his last thoughts, whole life foul or fair,
Reflecting it—where?
HARDY, Thomas. Thomas Hardy: The Complete Poems. Edited by James Gibson. London: 2001, p. 427.

Adriano Nunes: "Pai"

"Pai"

Em mim,
Concebo-o,
Ó, pai,
Entre os meus
Medos,
Silêncios e
Ais.
Resta o amor
Que, sem fim,
Solto,
Salta
De si,
Supera-se e
Sai
À procura
Do que já
Não há mais.
Por que falta
Alma para
Voltar
Atrás?

Adriano Nunes: "Father"

"Father"

Inside me,
I conceive
You, oh, father,
Among
My fears,
Silences and
Moans.
Love
Remains
Endless,
And escapes
From itself,
Exceeds up
And goes out
Looking for
Something that
There is no more.
Why would my
Heart like
To come back
To the past?

domingo, 14 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Yuliayev e os restos do espelho"

"Yuliayev e os restos do espelho"


Já não basta para Yuliayev
Os pedaços do espelho
Espalhados sobre a mesa.
A vida tem sido tensa
Para todos, ele pensa.
Já não é mais a mesma
Desde que se viu pela
Primeira vez ao espelho.
Presente de Hera, atesta.
Por que os admira, atento,
Enquanto se fere adentro?
Yuliayev respira desejos
E desconfiança. Não segue
Mais a cartilha dos portentos
Inacessíveis ao peito.
Cada fragmento vítreo tece
Uma armadilha em sua mente.
Não é possível que todos tenham
Aquele monstruoso aspecto.
Ah, as serpentes, as serpentes!
Como vieram dar na cabeça?
E essas estátuas sem cor nem
Pretérito, pura pedra, plena perda?
Já não basta para Yuliayev
Ver o sol a pino, a mata verde
A esboçar imensidão e medos.
Os estilhaços são reveses
De si, a ameaça de ser
O que se quer ser, sem vendas,
Sem máscaras. Que sente,
A esta altura, Yuliayev, preso
De seus remorsos, de seus tempos
Ignotos e astutos. Culpar quem?
Os cacos vítreos o perseguem.
A vida segregada e roída seca
Os propósitos do entendimento
Enquanto existência e resto.
Yuliayev quer pagar o preço
Do descaso a que se impôs, certo
De que tudo é rima e metro,
Escandalosamente rima e metro.
Ah, essas revoltas serpentes!
Ah, essas estátuas silentes!
Que fazer ante os desenhos herméticos
Da esperança? Ainda os fragmentos
Ali parecem zombar do cerne de
Tudo, da carne trêmula e fétida,
Do gozo gonorreico da pressa!
Yuliayev recolhe o maior entre
Os pedaços reluzentes.
Os pulsos pululam ululantemente.
A seiva da sede de tudo cede
À ilusão de um outro dia.
Ah, essas traiçoeiras serpentes!
Ah, essas estátuas decadentes!
Tudo a feder depois da quimera!
Tudo a anoitecer como prece e
Pedágio! Que fazer com os nervos
Já sem norte, sem proezas?
Yuliayev, cansado de espectros,
Deita-se: a estética cega
Do desassossego impera.
Ah, essas serpentes sorridentes!
Ah, essas perturbadas pedras!

Adriano Nunes: "Os pedaços de Krazaviev"

"Os pedaços de Krazaviev"


Não se espantem.
Não se entreguem ao terror
Com a facilidade costumeira.
Já estão expostos na praça principal
Os pedaços de Krazaviev. Todos,
Sem exceção. Das unhas arrancadas
À voz que da laringe ainda salta.
Os olhos que se assombraram
A ver Medusa, ah, os olhos
Que primeiro roçaram os dias anêmicos
Das emboscadas dos desejos!
A boca dilacerada expondo a língua
Que beijara os pés de Circe mil vezes,
Acreditem, os pés das ilusões mínimas.
As tripas, os nervos, as vergonhas,
O pau ainda ereto, o gozo etéreo e enfadonho,
As córneas, as cores da lógica do amor,
O fígado, o pâncreas, os rins.
Tudo à mostra. Tudo fragmentado.
Tudo sendo Krazaviev.
A vida enquanto vida, a mais leve.
Os cabelos quase amarras, fétidos,
Os dentes cariados, os lábios
Que eram das quânticas quimeras.
Tudo na praça, tudo para todos.
Krazaviev em pedaços, servido
Outra vez, em sua morte cíclica,
Repetida, nefasta, a rir da praça,
A rir da morte. Ah, os pedaços sujos
Do quase corpo, do quase átimo!
Os pés gigantes, as mãos polidáctilas,
O inferno impresso no umbigo,
A bexiga repleta de incertezas,
O reto violentamente usurpado,
Violentamente mistério.
Corram! Corram! Eis os pedaços
Da ignorância de Krazaviev!
Eis as fatias do dorso da angústia
De Krazaviev! As retinas residuais
Da perspicácia sub-reptícia dos sonhos.
Ah, a carne sem carne de Krazaviev!
Ah, as fezes grudadas à pele
Das insônias rebeldes!
Ah, como prometem dar a
Krazaviev uma nova vida, atando
Pedaço a pedaço, remendo
A remendo, um novo ser para
Alegria de todos, das hienas, das aves de rapina.
Ah, eis o coração de Krazaviev
Cravado na estaca do entendimento!
Ah, o cérebro lambuzado das farpas do tédio.
Krazaviev tão mais inteiro a seguir,
Passo a passo, por aí.
Ah, nós os carrascos de Krazaviev!
Ah, como continuamos mesquinhos e perversos!

Adriano Nunes: "Escândalo"

"Escândalo"

Tudo é
Esteticamente
Casca e cerne.
Pode até
Ser que dê certo.
Que é mais leve?
Melhor, sem
Dúvida, é ter-te
Mais perto,
No verso.
Escandalosamente,
Rima e metro.

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Tyrkliuk e o desejo"

"Tyrkliuk e o desejo"


A cama desfeita.
Tyrkliuk a observa
Com íris de tédio
E desassossego.
Pensa, sem reservas,
Que o amor é estéril.
Já não pesa mesmo
O assombro de ser
Tyrkliuk, o ser
Que não mais se aceita.
Pra dar ao desejo
Um fim, que fazer?
Foram tensos tempos
De esquemas e erros.
Foram taras e
Tormentos intensos.
Levados a sério
Gozos, galanteios.
Tyrkliuk se preza
De abdicar da festa
Dos hormônios. Vê
A cama sob flertes:
Gestos, grana e guerras
Íntimas... Ideias!
Talvez, dessa vez,
Tyrkliuk rejeite
Propostas ardentes.
Prenda com os dentes
Do engano a receita
Da alegria, às pressas.
Mas anoitece...
A cama já feita.
O acaso se deita
De bruços. De leve,
A vida em si perde-se.
Tyrkliuk empenha-se,
Em silêncio, em ser
Tyrkliuk, o ser
Venal. Reverbera a
Quântica quimera
Dos ais, porque resta
Outra porta aberta.



quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Linguagem"

"Linguagem"


Alguns brigam
Pela palavra
Adequada.
Outros mais
Se conformam
Com aquela
Que bem valha a
Comunicação.
(Mudar a métrica, não?)
Outros vão
Nem querer
Saber se
Calha a regra
Cara à satisfação
Da rígida forma.
(A métrica esvai-se agora?)
Alguns gozam
Com um não.
Uns estendem
As duas mãos.
Outros fingem
Nada ter
A ver com
A situação.
(Como as coisas estão?)
Alguns enchem os egos
Com os próprios
Erros íntimos.
Outros são
Sinceros mesmo,
Falam pelos
Cotovelos.
Eu prefiro
Estar vivo
E perdido
Entre os signos.
Em saber
Que não sei,
Como insisto!
Solidão
E silêncios
Como amigos,
Pude dar-me,
Sem astúcia
Ou grã arte.

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Gurkov e as peras podres"

"Gurkov e as peras podres"


Observa fixamente Gurkov
As três peras sobre a velha mesa.
Ele sequer sabe que as três peras 
Bem são o mundo todo. Vontade
De rir amalgama-se à vontade
De gritar de dor, como se quase
Nada mais valesse a pena. Mira-as,
Decifra-as pelo cheiro. Quem dera
Não fosse verdade não ter a
Verdade à vista, carniça e corte
Nas inconsequências do desejo.
Verdade gasta, vendida a prazo
Nos delírios do poder sem prazo.
As peras estão podres - eis os gritos
De ameaças à civilidade
Comportada, blasé e sem norte.
Nem a morte daria jeito nisso! -
Pensa Gurkov, já desafiado
Pela aparência impura das peras.
Que fazer com as três peras que
Cantam e dançam no breu da mesa
De pinho, cheias de sebo e séculos?
Gurkov ajeita os recantos éticos
Do tédio. Poderá ser que o átimo
De suspense se dissolva entre
A ânsia mais densa e os poucos dentes.
As peras estão podres. A vida
Surge cariada e carcomida
Pelo esfacelamento do gozo:
Tudo não precisa ser de novo
Covardia e remorso, silêncio.
As peras de tudo estão por dentro.
Acabaram de engendrar a lei
Capital: Gurkov não é mais rei!
Vão devorá-lo daqui a pouco.
Vão jogar seus restos aos mais moços,
Os que prometeram ser bons cães
De guarda. Os dóceis sem amanhãs!
Vão cuspir Gurkov, as peras podres.

Philip Larkin: "Home is so sad" (tradução de Adriano Nunes)

Philip Larkin: "Home is so sad" (tradução de Adriano Nunes)

"O lar está tão triste"

O lar está tão triste. Qual como deixado,
Moldado ao conforto dos últimos que vão
Como se a reconquistá-los. Ao invés, despojado
De qualquer um para agradar, fenece então,
Sem coração para pôr o furto de lado
E volta de novo ao que se iniciou feito,
Leda cena de como tudo deve ser,
Há tanto frustrada. Como foi podes ver:
Olha para cada talher e para os quadros.
A música no banco do piano. O vaso.

Philip Larkin: "Home is so sad"

Home is so sad. It stays as it was left,
Shaped to the comfort of the last to go
As if to win them back. Instead, bereft
Of anyone to please, it withers so,
Having no heart to put aside the theft
And turn again to what it started as,
A joyous shot at how things ought to be,
Long fallen wide. You can see how it was:
Look at the pictures and the cutlery.
The music in the piano stool. That vase.


LARKIN, Philip. The Complete Poems. New York: Farrar, Straus and Giroux; Reprint edition (April 2, 2013).

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "O poema"

"O poema"

Entra.
O
Lar
Dos
Signos
Múltiplos
Quer
Mesmo
Isto.
Senta-te.

Estes
Versos
Sem
Medo,
Mágoa,
Pressa.
Sempre
Uma
Hora
Resta
Para
Dar
Um
Passo
Mágico.
Pégasus
Bate
Suas
Asas.
Vem!
Sobe,
Monta
No
Dorso
Do
Sonho.
Voa
Em
Busca
Do
Risco
Menos
Nítido,
Foge
Das
Cercas
Do
Cérebro.
Vai
À
Ítaca,
Desce
ao
Hades,
Brinca
Com
Cérbero,
Quebra
As
Regras
Da
Morte.
Tudo

Bem
Podes.

Adriano Nunes: "Escape"

"Escape"

Come
In!
The
Home
Of
Multiple
Signs
Wants
It.
Sit
Down.
Read
These
Verses
No
Fear,
No
Hurt,
No
Hurry.
An
Hour
There
Is
For
You
Give
A
Magic
Step.
Pegasus
Whisks
Its
Wings.
Come!
Go
Up,
Ride
On
The
Back
Of
Dream.
Fly
Looking
For
A
Hidden
Danger,
Escape
From
The
Brain
Prisons!
Go
To
Ithaca,
Travel
To
Hades,
Play
With
Cerberus,
Break
The
Rules
Of
Death.
Now
You
Can
Do
It
And
More.
Try!
Plough
The
Time
Of
Rhythms
And
Rhymes!

Adriano Nunes: "Science of love"

"Science of love"

In a broader way
Everything becomes a field
As experience says.
With a close look
I can see defects
And what was strange
To illusion. I am afraid
To have more heart
Than a million certainties
In my head.
To me what does it lack?
Another microscope
For this obvious,
For what? Why
Do my eyes shine
When my mind flies
Looking for aesthetic skies?

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Ciência"

"Ciência"

De modo mais amplo
Tudo vira um campo.
Com o olhar estreito
Dá pra ver defeitos
E o que era alheio
À ilusão. Receio
Ter mais coração
Do que mil certezas
Em minha cabeça.
Outro microscópio
Para tanto óbvio
Pra quê? Por que, em mim,
Não desvendo mesmo o
Que me assombra assim?

Adriano Nunes: "Proeza"

"Proeza"

Da argila ao símio,
O homem ainda
Está-se construindo.
Apenas falta
Da matéria-prima
A alma da alma.
Às vezes, de pedra
Tem o coração.
Às vezes, detesta
A solidão.
Já criou deuses chatos
Que agora brigam
Entre si
Pelos direitos
Da criação.
Às vezes, é símile
Na distinção.
De galho em galho,
Do íntimo paraíso
Fez estardalhaço.
Um dia, quem sabe,
Volte a ser um
Macaco de barro,
Qualquer meio reciclável
Que não só se adore e
Adore arte.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Adriano Nunes: "Apenas"

"Apenas"


Se achares
Que mares
Ou outros
Bons ares
Não valem
A pena,
Apenas
Repara
Em volta,
E tudo
À prova
Bem põe.
Depois,
Percebe
Que leve
A vida
Ser pode.
Teu norte
Ser deve
Um outro
Poema.
Então,
Com sóis
À mão,
Escreve-o,
Sem véus,
Sem traumas,
Palavra a
Palavra.
E isto
Já basta
A ti.
Não vês
O início
Aqui?

Adriano Nunes: "Garatzazyn e os porcos" - para Alberto Lins Caldas

"Garatzazyn e os porcos" - para Alberto Lins Caldas

Tudo está fedendo
Dentro do pensar
De Garatzazyn.
A melancolia,
A bruta alegria,
Os desejos densos!
Tudo demais fede
Até esta lida
Que se mostra leve
Às vezes. Desperta,
Agora, a pocilga
Emite grunhidos
Além do infinito.
Ah, gritam os porcos
Por Garatzazyn!
Eis a vida, assim,
Gordurosa e hipócrita.
Os sonhos já lama
E esterco, já lixo
E remendo, já
Suor e as tais tênias.
Gritam os seus porcos
Pela paciência.
O fedor é nada.
Esta bosta podre
Não é nada. O hoje
Não é nada. O sopro
De esperança não
Acha o coração.
Garatzazyn se
Confunde co'os porcos.
Não sabe se gosta
De se confundir
Com a carne pronta
Para o abate. Sabe
Mesmo o quê, Senhor,
Este miserável
Porco de camisa
Colorida e calça
Jeans suja, barata?
Gritam os seus porcos
Desesperançados
De si, do que se
Pode ser tão óbvio.
Os porcos têm pena
De Garatzazyn.
Eles sabem quando o
Levarão pro abate.
Têm medo de que
Garatzazyn sangre e
Não morra, que a carne
Saia por aí
Gritando por alma.
Tudo está fedendo
Dentro do pensar
De Garatzazyn.
Não há mesmo como
Desse horror limpar-se.
Basta a novidade
Do olhar que se esvai
Para nunca mais.
Cochicham os porcos
Que Garatzazyn
Tem dentes de sabre,
Que devora a si
Vez ou outra, quando
Dá, quando as hienas
Vão embora, fartas.
Fuxicam os porcos
Toda madrugada.
Eles sabem da
Machadada e do
Descaso contínuo.
Da argila ao símio
Algo se conforma.
Garatzazyn salta
Do cercado gasto
Sobre a vara atávica.
É agora! É agora!