segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Adriano Nunes: "Duykrashlanain vai à feira" - para Carmen Silvia Presotto

"Duykrashlanain vai à feira" - para Carmen Silvia Presotto​



Dizem que já passou a peste negra,
Que se pode sair de casa,
Que se pode, sem receio, ir à feira.
Sim, elas estão começando.
Há rumores de que não existem santos,
De que estão se aventurando
No mar, que ocorrem muitos naufrágios,
Que a Terra não é quadrada.
Como sabemos disso? As feiras
Têm-nos mostrado a vida,
A morte, o medo, a esperança,
A mentira, a moda, a astúcia, a ganância.
Vejam: lá vai Duykrashlanain 
À feira, atrás de especiarias
Da alma, condimentos para as 
Suas quimeras quânticas, mágicas.
Afirmam que na feira vendem de tudo,
Até mesmo o futuro!
Duykrashlanain acha que poderá 
Vender alguns versos metrificados,
Alguma de suas canções medievas,
Alguns contos sem graça.
Tudo se pode fazer nas feiras.
Mesmo a justiça, não se espantem,
Tem sido vendida lá.
Sempre quem quer pagar por ela há.
Sempre há quem quer pagar por qualquer coisa.
Assim, com o ar venal e vadio, segue
Com os papéis sujos de expectativas e
Aventuras. Ao percurso soma-se e sonha.
À caminhada, passa por castelos abandonados,
Cadáveres roídos expostos, resquícios 
De que a peste era um suserano
Sem piedade. Ou mais que isso.
Ainda é manhã. Talvez à tarde
Ele chegue ao fervor da feira, 
Ao cerne da feira. É a vez primeira 
De Duykrashlanain. A primeira!
Para ele a feira é algo sem fim.
Duykrashlanain não imagina que 
Ela construirá o mundo.
Que ela devorará qual Cronos os que engendra
Em poucos segundos.
Parece que podemos ver, 
Daqui, algumas tendas, muitas tendas.
Cavalos, bois, cabritos, escravos.
Duykrashlanain está encantado 
Com o que ainda não viu.
Certamente os seus versos metrificados, 
Suas histórias sem graça, campestres
Não lhe mostrem ao que a vida serve.
Não importa. Nada importa.
Duykrashlanain contente vai à feira.
É a sua vez primeira, e assim seja!
Cansado está de ver gente morta,
Obediência gordurosa e cega.
Ele demasiadamente espera
Poder saber das novidades além-mar,
De Caríbdis e Cila, das Sereias,
Das terras distantes, dos piratas.
Outra coisa é só conotação barata,
Supõe, ele que carrega seu ser numa aljava.
Ah, como quer saber do mar
Duykrashlanain! Apenas do mar!



Adriano Nunes

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