sexta-feira, 24 de julho de 2015

Adriano Nunes: "Nos poços de vós"

"Nos poços de vós"


Aqui tudo é dor.
Os olhos são dor.
As duas mãos dor são. 
Mesmo o coração,
Que forte dizia
Ser, sente que não
Tem outra razão.
É dor. Como tudo.
O sorriso súbito.
Toda a algaravia
Que vingara um dia.
Os pés esgotados.
Até os sapatos!
O que se forjou
E o que fora em vão.
Os laboratórios
De astúcias e ódios.
Os negros negócios
Da alma. A palavra
Dor o instante abarca.
E sequer há mais
Que dor. Eis o mundo
Exposto, desnudo.
Pra sempre, pra todos.
De que em vós gostais?
Do alheio? Do outro?
Em vós tudo é dor.
Porque desististes
Da realidade,
Da carne que arde
Nos poços de vós,
A adaga persiste
Em vos perfurar.
A libido triste.
A lamúria em riste.
O marmóreo mar
Do que mal se disse
Do amor. As desculpas
Vãs, esfarrapadas.
Paródias, pancadas,
Outra vez. A culpa
De querer compor
Vossa vida, à custa
Somente de máscaras.
Mas, sabeis, dor passa!


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