quinta-feira, 23 de abril de 2015

Adriano Nunes: "Desde que sós partimos"

"Desde que sós partimos"



Entre imprevistas horas, 
Essa que já não passa.
Entre as nômades nódoas,
Essa que muito a alma
Marca e esse silêncio 
De silício aderido
Ao sonho de cingir
O só-ser, na palavra
Mar - quânticos instintos,
Enquanto mais se despem 
De si os pensamentos,
Como se nós quiséssemos 
A distinta metade
Do que não há, a outra
Fatia da alegria
Ou do desassossego
Que nos modelam dia 
A dia, como se 
Jamais houvesse mesmo o
Que abraçar com o olhar 
De passagem, já livre.

Por consorte a certeza
Tivemos nas intrépidas
Tentativas de achar
Uma trilha pra Ítaca,
A astúcia de ficar 
Em algum ponto entre 
Pasárgada e Macondo, 
O que decerto acalma,
Mas ao peito não basta.
Perdemo-nos sob flertes
Do cansaço e do caos
Que engendramos no âmago. 
Agora, o grã segredo 
Sequer nos quer. Andamos 
Lado a lado qual cães, 
Sem saber das delícias
Do onírico horizonte
Da língua. Passeamos
Repelidos de nós, 
Como se fosse outro 
Tempo em nós permitido,

Pra cantarmos a ode 
Da nossa irreverência,
Pra aceitarmo-nos prontos,
Fracassados e prontos,
Com o furor na fronte
Explícito, exitoso.
E, num piscar de preces
Supérfluas, superarmos 
O que mais nos pensamos 
E sentimos. Nós somos
A feroz ameaça 
Ao que vale um portento,
O límpido sorriso,
Desde que sós partimos
De Troia. Foi preciso 
Esquecer todo o fogo 
A arder, as chamas altas
Chamando-nos por nomes,
Os corpos profanados 
E as cinzas do que ainda 
Vingava mesmo ao longe.

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