sábado, 29 de agosto de 2015

Adriano Nunes: "De cada palavra"

"De cada palavra"


Sertaneja Esparta
Apresento a todos.
"Bata pra matar!
Pra tirar o sangue!"
Era assim o canto
Das brigas, o estímulo
Entregue aos meninos
Da infância perdida,

Instintivo instante.
Sim, os mais crescidos
Colocavam os
Mais novos no círculo
Para tudo ou nada,
Por motivos tolos.
Eu, de tudo solto,
Só queria os mapas,
As pedrinhas, talas
De coqueiro, chimbras,
As tardes infindas
Ante o Velho Chico,
E, com alegria,
Acompanhar o
Meu irmão e primos
Numa pescaria.
O meu corpo frágil
Denunciaria
Que eu não seria
Bom pra aquelas rixas.
Pouco adiantava!
E estava eu lá
Entre socos e
Pontapés, ouvindo
O hino terrível
Da torpe torcida:
"Vai apanhar é?
Bata pra matar,
Pra sangrar até!"
Sem entender se
Eu tinha vencido
Ou tinha perdido,
Saía chorando.
Pra mim foi difícil
Ter que aceitar, claro,
O vínculo mórbido
De que era isso
Desenvolvimento.
Agora me prendo
Às palavras ditas,
À memória aflita
Das insanas brigas
Que travei além
Das brigas não tidas.
E, ali, percebi,
Tenso, tolo, tímido,
Quão importa a vida.
Eu era um menino
Que mapas amava
E os suaves sons
De cada palavra,
Ritmos do inaudito.

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