"Beleza e poesia:
os liames da indeterminação" (parte I)
Vez ou outra, alguns
escritores, máxime poetas, quando indagados sobre o que é a poesia, vêm munidos
de respostas que nos levam a crer/creditar/supor que a poesia é uma forma de
revolução contra qualquer coisa estabelecida ou mesmo não-estabelecida e que, por
isso, a beleza de um poema residiria em sua existência fora de qualquer padrão
presumido, suposto, imaginado. Vê-se, então, o grande e grave engano que esses
autores cometem por causa da própria definição que dão à poesia.
Assim,
analisando essas teses, sob os ditames da razão e também sob os juízos
estéticos, desde logo deve ser percebida a primeira tentativa sub-reptícia de
que, por essa via estética subversiva, tudo que fosse estranho,
não-convencional, destituído de quaisquer regras ou recursos formais seria, por
lógica, novo, e tudo que fosse novo, consequentemente, seria belo. Então,
teríamos, também por dedução lógica, que admitir que os erros grosseiros e
inaceitáveis gramaticais fossem perdoados em nome de uma arte que se pretende
obra de arte, teríamos também que admitir que palavras desconexas, postas
aleatoriamente, sem constituir qualquer sentido semântico, léxico,
constituiriam poemas e estes deveriam ser tomados por belos.
Se se quer que a
poesia seja o contra, primeiro dever-se-ia perguntar: contra o que
especificamente? E por quê? Contra a linguagem comunicativa? Mas um poema em si
não pretende mesmo comunicar nada. Não seria por isso, tendo em vista o
conceito kantiano de o poema ser uma finalidade sem fim, que esses escritores
achem, por causa dessa razão, que a poesia deva ser o incomunicável in totum?
Não seria então preferível o silêncio a quaisquer rabiscos destituídos do
mínimo necessário de inteligibilidade? Ainda nesta perspectiva, acreditam
certos poetas que têm que romper com algo, seja presente, passado ou futuro.
Portanto, demarcam a linha de beleza nesse estágio de rompimento. Concretizam o
seu padrão de beleza no rompimento, mas não apresentam um juízo estético capaz
de justificar o que eles aceitam como belo. E quando propõem um pretenso juízo
de gosto são ineficazes para universalizá-lo e destituí-lo de interesse.
Pois
bem, chegamos ao cerne do problema estético: incapazes de em seu juízo de gosto
afastar quaisquer interesses, propõem, à socapa, um juízo estético impregnado
de suas ideologias políticas, reacionárias ou não, de seus arquétipos
religiosos, de seus dogmas mais fecundos e cheios de raízes profundas, dando à
poesia, além da ausência de beleza, um caráter panfletário, quando muito, pois,
numa miríade de vezes, só querem não fazer parte de coisa alguma,
principalmente da bela poesia.
Adriano Nunes
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