domingo, 27 de janeiro de 2013

Adriano Nunes: "Ensaio sobre a obediência servil, cega"


"Ensaio sobre a obediência servil, cega"


O Brasil está morto. Incendiado. Queimado. Carbonizado. Intoxicado. Sem palavras. De luto. Estou mais morto. Morto de mim para com a minha parte de tudo por pertencer ao instante em que se dá a dor de saber-me semelhante à imagem do que fere, cerca e alicerça toda a vida. Santa Maria precisa de ajuda. Precisamos de ajuda. Precisamos ser melhores conosco e com os próximos. E com os distantes. Médicos, enfermeiros, técnicos em geral, a população brasileira, todos nós devemos nos mobilizar para auxiliar no que for preciso. E precisamos refletir um pouco para não fazermos caos nem falsos juízos. Ateus, cristãos, crentes não têm motivos pra celebrar coisa alguma ou ficar com dogmas à mostra, salivando venenos sobre o como e o porquê do ocorrido, manifestando falsas morais em proveito de um episódio doloroso como esse. Falta de fiscalização nas boates? Há. Tragédias acontecem. Muitas acontecem. O que é inadmissível é ouvir grupos fanáticos se vangloriando diante das mortes de jovens. Pior que a falta da fiscalização da segurança estrutural na boate de Santa Maria foi a falta de humanidade diante do acontecimento em si, durante a saída desesperada das pessoas, isto é, a obediência servil, cega, dos seguranças da boate (num primeiro e lastimável momento, segundo noticiado. Porque, se houve tal empenho em não liberar os jovens, morto estou novamente. Bem mais morto que poderei estar um dia), que, a fim de evitar perdas financeiras, cumpriu bem o papel nazista de invalidar a esperança que as vítimas ainda tinham para viver. Lembra-me tudo os falsos cegos e os cegos mesquinhos de "Ensaio Sobre a Cegueira" de José Saramago. Resta o horror da face mais podre humana, aquela que ainda precisa de comprovante pago para provar que é digna, que pode ter livre acesso à saída do cárcere social.

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