quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Bem mais do que desta vez"

"Bem mais do que desta vez"


Outra noite, sonho aberto,
Livros perto.... E mais desejo
Teu corpo em meu poema,
Com o cheiro das estrelas,
E da lua as mãos ardentes
Sobre a minha tensa tez.

Vem, espectro, que te quero,
Sem as vestes do mistério,
Vem, como súbito verso
Que o impossível incendeia,
Vem, grácil, à minha teia
De oximoros, para o esquema

Do amor, e cantar-te-ei
Bem mais do que desta vez!

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Que este soneto imperfeito é"

"Que este soneto imperfeito é"


Despenca a manhã do báratro infindo,
E ele não sabia que já era 
O seu dia. Entre cacos e Kafka,
Cansaço disfarçado de alegria.

Agora vê o sol se atando, alto,
À pressa de preparar outra aula
Pra universidade, até que, súbito,
Decide ver emeios e mensagens:

"Poeta, Alberto Pucheu​, mesmo saiba 
Que este soneto imperfeito é.
Porém, no corre-corre meu, bem vale,

Imagino, o aniversário cantar-lhe
Poder, para que a existência, num êxtase,
Engendre um grande abraço, de verdade."

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Pra amalgamar-nos com poesia"

"Pra amalgamar-nos com poesia"


Eu - esses escombros incontidos
Daquela tarde em que te perdi
De vista, quando entraste, sorrindo,
Numa loja de móveis antigos. 
Ou numa livraria no Egito?

Reuni, vestígio por vestígio,
Os olhares que nem mesmo vimos
Ante os nossos, destroços de ritos
Do acaso e silêncios de silício.

E, em meu pensamento de menino
Perdido, dei-te o sim e os meus signos. 
Não sonharia que o amor iria
Usar todas as mágicas, um dia,
Pra amalgamar-nos com poesia.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Lola Ridge: "Interim" (Tradução de Adriano Nunes)

"Ínterim" (Tradução de Adriano Nunes)

A Terra está estática
E aprumada no espaço...
Uma grã ave repousando em voo
Entre as vielas das estrelas.
É o descanso do vento...
O vento tem-se agasalhado entre o milho...
Intimamente a sós os dois conversam,
Esperando o zunido de asas.


Lola Ridge: "Interim"

Interim

The earth is motionless
And poised in space …
A great bird resting in its flight
Between the alleys of the stars.
It is the wind’s hour off ….
The wind has nestled down among the corn ….
The two speak privately together,
Awaiting the whirr of wings.


RIDGE, Lola. "Interim". In:____. Academy of American Poets. URL:www.poets.org. Acesso em 22/02/2015.

Adriano Nunes: "Ao humilde plagiário"

"Ao humilde plagiário"


No cosmo digital
O plágio é tão banal.
Não te desesperes bardo
Criativo, pois vários
Versos tive furtados
Por conhecidos vates.
Plágio também é Arte.

Que bem ao plagiário
Deve fazer se sabe
Ele que é um fracasso,
Do criar a excreção,
E que as suas sinapses
São só de xerox máquina?
Poeta inventor, calma!

Faze como eu faço:
Tece um poema e já
Enaltece o falsário,
Para ver se amanhã
A ti ele até faça
Com teus versos furtados
Um canto dedicado.

Cantemos o cantar
Do humilde plagiário!

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "O amor é uma cilada"

"O amor é uma cilada"



O amor é uma cilada -
Diz a amiga do poeta Fred Girauta.
Creditem. Pode ser
Tudo, pode ser mesmo
Nada. Pode até ser
Maneiro, ao seu modo.
E ser do tempo o mofo.

O amor - será que é
Óbvio ou ovni?

Mas calma! Muita calma.
O amor é sóbrio. Aceso

Fósforo frente a alma.
É singular do amor
Ir do ethos ao logos
Na primeira mancada,
E, num piscar de átimos,
Arrancar os seus olhos.
Vem do silêncio ignoto...

Dizem que o amor é ótimo.
Aqui, da escrivaninha,
Lembro os retalhos sérios
Que fundo me fizeram
- Ah, como ser ferido
Novamente eu quero! -
As flechadas de Eros.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Ousa! Ousa!"

"Ousa! Ousa!"

Vem, ó Vida,
Nau precisa,
Leve leva-me
A teu cerne
De beleza,
Pra que tudo
Deste canto
Bem eu cante,
Pra que, junto
A ti, sonhos
Mais eu tenha,
Pra que versos
Mais eu leia,
Pra que músicas
Mais eu ouça,
Pra que gentes
Eu conheça,
E conheça-me
Mais e mais.
Ousa! Ousa!


Vem, ó Vida,
Barco alegre,
Singra, segue
Teu percurso
Neste mundo,
Sempre tesa,
Sempre tela,
Não a mesma,
Mas que mudes
Como um verso
Popconcreto,
Como o vento
Sobre a selva
De silício,
E, assim, dures,
Porque quero
De ti, Vida,
Toda a Vida,
Larga, lícita,
Elo e início.


Vem, ó Vida,
Grã jangada
De emoção -
Nunca um mero
Rastro, apenso,
Mas mar dentro,
Mar em volta,

Mar morável,
Sol se atando
A sóis, quanto
For possível.
Mais que isso:
Amor quântico
Pelos outros
Que te engendram,
Sem véus, vendas,
Sem um fim,
Um poema -
Grácil graça
Ter-te em mim.


quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Ada Limón: "Before""Antes" (Tradução de Adriano Nunes)

"Antes" (Tradução de Adriano Nunes)



Sem sapatos e um reluzente
capacete rubro, subi
na parte traseira da Harley
do meu pai, aos meus sete anos.
Antes do divórcio.
Antes do novo apartamento.
Antes do novo casamento.
Antes da macieira.
Antes da cerâmica nos escombros.
Antes da corrente do cão.
Antes das carpas terem sido devoradas
pela garça. Antes da estrada
entre a gente, havia a estrada
sob a gente, e eu era somente
grande o bastante para não me deixar ir:
Estrada de Henno, abaixo a enseada,
vento bravo, pés de galinha,
e eu jamais atinei que o sobreviver
fosse dessa maneira. Se tu vives,
olhas para trás e imploras
por isto de novo, o perigoso
prazer antes de saber
do que sentirias falta. 


Ada Limón: "Before"*


No shoes and a glossy
red helmet, I rode
on the back of my dad’s
Harley at seven years old.
Before the divorce.
Before the new apartment.
Before the new marriage.
Before the apple tree.
Before the ceramics in the garbage.
Before the dog’s chain.
Before the koi were all eaten
by the crane. Before the road
between us, there was the road
beneath us, and I was just
big enough not to let go:
Henno Road, creek just below,
rough wind, chicken legs,
and I never knew survival
was like that. If you live,
you look back and beg
for it again, the hazardous
bliss before you know
what you would miss.




*Poema inédito de  Ada Limón publicado originalmente em Academy of American Poets. 

LIMÓN, Ada. "Before". In: Academy of American Poets. URL: http://www.poets.org/poetsorg/poem/before-1. Acesso em 19/02/2015.

Adriano Nunes: "E tudo se ajustou"

"E tudo se ajustou"


O que era pra ser
O meu primeiro amor,
Fora quase prazer -
E a iniciar findou.
O que era pra ser
O meu perfeito par,
Veio a se desfazer,
Sem tempo pra sonhar.
Depois, tudo deu pé.
O amor era aceitar
Que amor não era até.
Então, deixei-me amar
Para bem entender
O que seria o amor
Sem amado nem ser.
E tudo se ajustou
Ao jeito do viver.
É poesia o amor -
Eu pude perceber
Quando o tempo passou,
Abalando o meu ser:
Mundos a imaginar
Juntos, até nascer
A emoção de durar,
Qual Le Bain de Manet,
Qual Tocata de Bach,
Ah, o amor que amor é!
Ah, o amor que é amar!

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Expondo a magna astúcia de Cupido"

"Expondo a magna astúcia de Cupido"



De amor está meu peito preenchido.
Portanto dizer isso bem preciso,
Máxime, em decassílabos concisos,
Expondo a magna astúcia de Cupido.

Não vês que estou contente e que improviso,
Sob auspícios, um canto comovido
Contra os tantos tentáculos do olvido?
Não vês que não valeram os avisos?

Pronto: entreguei os pontos. Já admito
Que fora um erro achar que Eros mito
Era. Agora, vê, tenho o como amigo,

E, a todo instante, sou flechado, digo,
Tenho das flechas feito o meu abrigo,
Amante estou do amor que é infinito.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Engendrando um leve laço"

"Engendrando um leve laço"



Vejo: o mar abarca os barcos 
Em sua imensidão plácida... 
E o meu coração, sob mágica, 
Todo encantado, das grades 
Da grã gaiola torácica 
Escapa. Mas a palavra
Singra, de átimo a átimo,

Engendrando um leve laço,
Um verso que é todo cais,
Água, areia, amor e mais.
Revelo o horizonte vasto
Que mina do que se faz 
Arte, enquanto só paisagem.
Vê: o mar é que me capta!

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Primo ictu oculi"

"Primo ictu oculi"


Há alguns anos, o amor
Acenou de longe, mas
Estavas tão distraído
Que sequer deras por isso.
Há poucos meses, o amor
Deixou seu rastro de paz
Sobre tua escrivaninha.
Nem sonhaste que a ti vinha?
Semana passada, o amor
Provou-te do que é capaz.
Em teus olhos pôs as lágrimas
Da saudade que se alastra.
Ontem, fez de tudo o amor
Como já não pode mais.
E como cegaste!... Então
Perdeste o teu coração.
Cantas os feitos do amor,
Hoje, as loucuras e os ais,
Eros e as flechas, bem sabes,
Nesta interminável tarde.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Paul Laurence Dunbar: "Invitation to Love" (tradução de Adriano Nunes)


“Convite ao Amor” (tradução de Adriano Nunes) 


Vem nas noites co’ estrelas clareadas
Ou vem quando a lua felpuda encape-se;
Vem quando as solares douradas barras
Baixam às áreas áureas da forragem.
Vem no crepúsculo cinza aprazível,
Vem na noite ou vem no dia,
Vem, ó amor, sempre que seja possível,
E és bem-vindo, bem-vindo.

És doce, ó Amor, estimado Amor,
Como a aninhada pomba, meigo amor.
Vem ao peito, leva-o pra repousar
Como a ave voa pra o grácil lar.

Vem quando o peito esteja em aflição
Ou quando o coração contente esteja;
Vem com o despencar da folha ao chão
Ou com o purpurear da cereja.
Vem quando o primo anual florir irradia,
Vem quando o verão resplandece e aquece,
Vem co’ invernais amontoadas neves,
E és bem-vindo, bem-vindo.



Paul Laurence Dunbar: "Invitation to Love"



Come when the nights are bright with stars
Or come when the moon is mellow;
Come when the sun his golden bars
Drops on the hay-field yellow.
Come in the twilight soft and gray,
Come in the night or come in the day,
Come, O love, whene’er you may,
And you are welcome, welcome.

You are sweet, O Love, dear Love,
You are soft as the nesting dove.
Come to my heart and bring it to rest
As the bird flies home to its welcome nest.

Come when my heart is full of grief
Or when my heart is merry;
Come with the falling of the leaf
Or with the redd’ning cherry.
Come when the year’s first blossom blows,
Come when the summer gleams and glows,
Come with the winter’s drifting snows,
And you are welcome, welcome.



DUNBAR, Paul Laurence. The Complete Poems Of Paul Laurence Dunbar. New York:Dodd, Mead and Company, 1922.
DUNBAR, Paul Laurence. The Complete Poems Of Paul Laurence Dunbar. Echo Library, 2008.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Encontrei-te, enfim, verso amado"

"Encontrei-te, enfim, verso amado"


Encontrei-te, enfim, verso amado,
Num caderno, sem capa, antigo,
Sob caixas e trapos guardado.
Talvez o fiz para um amigo
Que até pode ter-me esquecido.
Encontrei-te! Agora te afago
Para que não temas o Olvido
Das gavetas, o grave estrago.
Encontrei-me em ti, sim, de fato,
Metro a metro, fundo, e o infinito
Despido num autorretrato.
Não vês, laringe de grafito,
Que exalas o êxtase exato
Do existir, o amor irrestrito?

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

William Carlos Williams: "A Love Song" (tradução de Adriano Nunes)

“Uma Canção de Amor” (tradução de Adriano Nunes)


Que tenho a dizer para ti
Quando nos encontrarmos?
Já -
Finco-me aqui pensando em ti.

A mancha do amor
Está sobre o mundo.
Áurea, áurea, áurea,
Ela devora as folhas,
Mancha com açafrão
Os aguçados galhos que se inclinam
Pesadamente
Contra um céu brando grená.

Luz não há-
Apenas espessa mancha de mel
Que escorre de folha em folha
E galho em galho
Corrompendo as cores
De todo o mundo.

Estou sozinho.
O peso do amor
Tem-me feito flutuar
Até minha cabeça
Chocar-se contra o céu.

Vê-me!
Meu cabelo está banhado com néctar -
Carregam-no estorninhos
Em suas asas negras.
Vê, por fim,
Meus braços e minhas mãos
Ociosos ficando estão.

Como posso afirmar
Se pra sempre de novo te amarei
Como amo desta vez?


William Carlos Williams: "A Love Song"


What have I to say to you
When we shall meet?
Yet—
I lie here thinking of you.

The stain of love
Is upon the world.
Yellow, yellow, yellow,
It eats into the leaves,
Smears with saffron
The horned branches that lean
Heavily
Against a smooth purple sky.

There is no light—
Only a honey-thick stain
That drips from leaf to leaf
And limb to limb
Spoiling the colours
Of the whole world.

I am alone.
The weight of love
Has buoyed me up
Till my head
Knocks against the sky.

See me!
My hair is dripping with nectar—
Starlings carry it
On their black wings.
See, at last
My arms and my hands
Are lying idle.

How can I tell
If I shall ever love you again
As I do now?



WILLIAMS, William Carlos. The Collected Poems Of William Carlos Williams. New York: Hardcover, 2 v., W W Norton & Co Inc, 1991.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

A. E. Housman: "Could man be drunk for ever..." (Tradução de Adriano Nunes)

"Pudesse o homem estar embriagado" (Tradução de Adriano Nunes)


Pudesse o homem estar embriagado
Pra sempre com bebida, amor, ou brigas,
Eu acordaria cedo de bom grado,
E deitar-me-ia à noite sem rezingas.

Mas os homens em tempos sóbrios são
E meditam sob trancos e barrancos,
E se eles meditam, eles firmam
Sobre seus corações as suas mãos.


A. E. Housman: "Could man be drunk for ever..."


Could man be drunk for ever
  With liquor, love, or fights,
Lief should I rouse at morning
  And lief lie down at nights.

But men at whiles are sober
  And think by fits and starts,
And if they think, they fasten
  Their hands upon their hearts.



HOUSMAN, A. E. The Collected Poems of A. E. Housman. New York: Holt Paperbacks; Revised edition (April 15, 1971).

domingo, 8 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Sob a ilusão que até os trai"

"Sob a ilusão que até os trai"


No carnaval, todos iguais
São. Tempos e taras totais.
Sequer menos. Nem mesmo mais.
Cada um co' a máscara banal
Do ser que se sonha integral.

Depois, a outra, a que lhes cai
Bem, a que da cara jamais
Sai, na medida, artesanal,
Assume o papel principal,
Além do bem, além do mal.
No carnaval, todos iguais
São: animados animais
Sob a ilusão que até os trai.
Cada um co' a máscara ideal
Do ser que se fez afinal.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Flecho-me, amor"

"Flecho-me, amor"


Canto-te, amor.
Sequer há modo
Pra agir de outro
Modo. Conforto-me
A ouvir teu nome
Dito por sóis
De um oximoro.
E mesmo gozo.
Eis o propósito
De amar-te e só:
Quão me renovo!
Flecho-me, amor,
Com o teu fogo.
E tudo posso.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

William Carlos Williams: "The Red Wheelbarrow" (traduzido por Adriano Nunes)

"o rubro carrinho de mão" (tradução de Adriano Nunes)

tanto depende
de um
rubro carrinho
de mão

polido pelos pingos
da chuva

perto dos alvos
pintinhos


"o rubro carrinho de mão" (tradução de Adriano Nunes)

tanto depende
dum
rubro carrinho
de mão

polido pelos pingos
da chuva

perto dos alvos
franguinhos




William Carlos Williams: "The Red Wheelbarrow"

so much depends
upon
a red wheel
barrow
glazed with rain
water
beside the white
chickens.


WILLIAMS, William Carlos. The Collected Poems Of William Carlos Williams. New York: Hardcover, 2 v., W W Norton & Co Inc, 1991.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Adriano Nunes: "Apenas o que à razão escapa"

"Apenas o que à razão escapa"


O desejo é uma farra sináptica.
O espírito estala.
O corpo sem comandos capta
Apenas o que à razão escapa .
O coração - Ícaro com asas -
Quase do tórax à garganta salta.
Assim, conheci-te: ousadia e olhar,
Numa esperança renovada,
Na fila do supermercado, a esperar
Pelo instante de o refrigerante pagar.
Deliciosos desejos quem descarta?
Ah, e as palavras, as palavras,
De que adiantam? Nada.
Mas arriscamos algumas, para
Ver se o acaso nos ampara.

Adriano Nunes: "Aviso à porta da lembrança"

"Aviso à porta da lembrança"


Tum-Tá!
Ela poderá te acertar.
Tum-Tá!
Ela poderá te lesar!
Tum-Tá!
Ela poderá te matar!
Tum-Tá!
Não tem momento nem lugar.
Tum-Tá!
Não é mesmo a perdida bala.
Tum-Tá!
Não é bomba que cai do ar.
Tum-Tá!
Eis a paixão desenfreada!
Tum-Tá!
Ela só quer a prima falha.
Tum-Tá!
Ela mais quer qualquer mancada.
Tum-Tá!
Ela quer me deixar sem fala!
Tum-Tá!

Adriano Nunes: "Deixa-me ser este e até outros"

"Deixa-me ser este e até outros"


Com as verdades todas fica.
Elas não devem muitas ser,
E que a mim importam que sejam?
Antes o céu alvo e azulado
A admirar as dálias do alto,
Sereias, Caríbdis e Cila.
Antes o prazer fugidio
E o existir em êxtase, em cio.
Deixa que eu possa desdizer
Que já não te amo. Bem fica
Co' as verdades que tantos cegam.
Antes o mar e o cais e os barcos.
Nenhuma direção precisa.
Quaisquer portos além de Ítaca.
Deixa-me ser este e até outros
Se eu puder. E se só puder
Numa portentosa mentira.
Com Medusa deixa-me um pouco
Desconversar, enquanto a lâmina
Não dilacera o seu pescoço.
Fica com todas as verdades
Que em ti interagem e agem.
Delas coisa alguma me digas.