terça-feira, 29 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Tobe Hooper" (in memoriam)

"Tobe Hooper" (in memoriam)

Tonight
Shadows
And 
Ghosts
And
Monsters
And
Poltergeists
And
Chain saws
Are quiet
And
Silent.

Adriano Nunes: "Leveza"

"Leveza"


Já estive nos arredores do Reno,
Com a rima ferida,
Sentindo-me pequeno.
Sentei-me à mesa de atentas famílias
Inglesas, convidado
Por causa de uns talentos vãos jamais
Comprovados por mim.
Corri de leões em Serra Leoa,
Enquanto coisa boa
Era correr de leões, como dádiva.
"Depois, o mundo escapa!" -
Falava o ser que em mim fazia estada.
Ah, tais sobras de sombras!
Ah, labirinto de laços que assoma e
Assusta e acerta as contas
Com tudo que me sinto ser, enquanto
Dilacera-me o fluxo
Que sempre vem forjado de futuro!
Já estive por aí,
Sem ter norte, contando com a sorte
Dos acasos propícios.
Onde mesmo repousa esse lugar
Que se grava palavra?
Agora me agarro à alegria grácil
De constatar quão mágico
É fincar-me, carne e estímulo, em casa,
Fazer chá de hortelã,
Para mim e minha mãe, nas manhãs
Em que a esperança em nada
Poderia até dar.

Adriano Nunes: "Ars poetica"

"Ars poetica"

Canto o ver-
So curto, o ver
So longo, o verso métrico, medido,
Bem como o verso que não precisa ser escandido.
Canto a verve do vate e o que vale
A pena, mesmo que a calma seja
Pequena: canto a vida
Desde a sua face mais incompreendida.
Canto e já me dou
Por satisfeito. A Safo dediquei
Até alguns sonetos. A Baco
Outros tantos.
É assim, sem mim, que,
Com prazer,
Canto.
E não preciso sequer me convencer
De que ergui um monumento
Que, ao contrário do de Horácio,
Durará apenas
O tempo necessário
E, nem de longe,
Pode durar mais que o bronze.
Entretanto,
Poderão dizer os mais assanhados,
Os experts em vernáculos,
Os arautos da estética kantiana,
Os doutores e os bacanas,
Et cetera et tal,
Na primeira página de algum jornal
De circulação local:
Dele era o canto de fato!


Adriano Nunes: "Da luta" - para Roberto Bozzetti

"Da luta" - para Roberto Bozzetti


Na era
Das feras,
Das iras,
Das liras
Feridas,

Dos erros
Grosseiros,
Dos urros
Espúrios,
De Eros

Só em
Apuros,
De muros,
De miras,
De mídias

Medíocres,
Dos podres
Poderes,
Das pernas
Já bambas,

A gente
Precisa
É mesmo
Viver,
Erguer

A fronte,
A vista, a
Cabeça,
Seguir
Em frente,

Ainda
Que reste a
Tristeza,
Que a gente
Perceba

Que a era
Dos ratos
Impera,
A era
Do horror

Adriano Nunes: "Carmen" - para Carmen Presotto, por seu dia.

"Carmen" - para Carmen Presotto, por seu dia.


Só o verso
Reveste-se
De verve e
De vida.

A vida
Que te
Revira,
Revista.

A lida a-
Inda! És
Assim,
Pra mim:

A vida
De um ver
Diverso.
É certo

Que, enfim,
Mistério
Estético
Não há.

Há só
Cantiga,
Amada
Amiga.

Adriano Nunes: "Estética estratégia"

"Estética estratégia"


Se meu olhar te flerta,
É flecha.
Se meu pensar te pesca,
É pressa
Se meu beijo te breca
À beça,
O amor mesmo começa.

Se meu corpo te cerca,
É certo
Que meu sentir, às cegas,
Conecta
O meu sonhar àquela
Ideia:

De que amar nao é mera
Metáfora,
Mas estratégia e meta:
Conversa
Que se converte em verve,
Em verso e
Vinga e vinga-se e vela.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Até a vírgula"

"Até a vírgula"


Está barato
Tudo de fato
A vida tida
A vida dada
A vida ainda

Tudo com preço
De promoção
O corpo mísero
O corpo mítico
O corpo morto

A prazo à vista
E parcelado
Qualquer virtude
Qualquer vergonha
Qualquer verdade

Paga-se com
Dor dotes dom
Sem fila sem
Firma sem nem
Ser mesmo alguém

Vende-se tudo
Deuses espúrios
Deuses espertos
Deuses estúpidos
De brinde o mundo

Todo alfabeto
Palavra signo
Sentido som
Voz vez vício
Início e fim

O sonho enfim
A chance o charme
O cheiro o sangue
A pele e o osso
O trema e a crase

De oferta farta-se
Quem comprar pode
Do medo à morte
Do tédio à tara
Não sobra nada

De vez em quando
O preço sobe
Fulano é forte
Beltrano berra
Sicrano sofre

Ninguém se espanta
Nem se incomoda
Com os esquemas
Vis sub-reptícios
Reina o mercado

Sem qualquer ética
À venda filho
À venda pai
À venda espírito
Grátis a serpe

E o paraíso
Mas não só isso
À venda a ética
À venda o éden
À venda o hífen

Até a vírgula
O ponto e a reta
O que se pensa
O que se sente
O que bem há

Está barato
Tudo de fato
A vida nítida
A vida ávida
A vida válida

Bem aproveitem
O tempo clama
O tempo chama
Tudo com preço
De promoção

Inferno e céu
Sem nenhum juro
Sem correção
Tudo tudo
O sim e o não

Adriano Nunes: "Ser é risco"

"Ser é risco"


Chove. Penso
Em teu riso,
O que o escrito
Não diz, isto
Que, de imenso,
Faz-se vivo

Em mim, misto
De mar, mito
E portento.
Chove. Sinto
O teu íntimo
Dar-me o infindo

Olhar, centro
Do que arrisco.
Chove. Digo:
"Já não ligo!"
"Nada entendo!"
"Ser é risco".

Adriano Nunes: "Só contigo"

"Só contigo"


Nem metade
Sequer marco
Nem meado
Sequer margem
Nem metâmero

Sequer marca
Nem medida
Sequer mídia
Nem maldade
Sequer mira

Nem matéria
Sequer meio
Nem metáfora
Sequer mito
Tudo, tudo

Só cantando
Só contente
Só contigo
Outros rumos
Sem mais muros

Adriano Nunes: "Por que não, platônico?"

"Por que não, platônico?"


Li tanto Platão
Que agora mais não
Sei o que fazer
Com este prazer

Estranho, de amar,
Sozinho, sem par
Sequer pra jogar
Baralho, nas noites

Infindas, pois foi-se
A razão, às pressas.
Ideias, ah, essas
Ideias que nos

Modelam pequenos,
Que são só venenos!
Querer sem poder,
Querer por querer!

Cegando, cegando...
Idealizando
Tudo, tanto quanto
Dá, qual neste canto.

Adriano Nunes: "Por sonhar-te agora"

"Por sonhar-te agora"


Quem és, corpo e flerte,
Que me flechas forte,
Fixando-me à sorte
Do sol do querer-te?

Quem és, tara e transe,
Que me tomas todo,
Tornando-me um outro
Até que me canse

De ser que me sinto,
Por sonhar-te agora,
Atando-me à aurora
Deste amor faminto?

domingo, 20 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Poetry" - to my dear friend, Australian poet Hamish Danks Brown (for his birthday)

"Poetry" - to my dear friend, Australian poet Hamish Danks Brown (for his birthday)


Poetry is
What it is not
It is light
It is another night
To fight
Against fixed spot
Against impossibilities
Poetry is hot

It burns
The careless and hurried bards
Why is everything so hard?
It hurts
Because it starts it all
Inaugurating several
Cosmos of multiple senses
In this gray world

Oh this we know and
They know it too -
The enemies of poetry,
Those who destroy
Hopes, dreams and simple joys.
What they do not know is
That poetry is stronger than
Their hate and their cruel plan.

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "A trilha inteira"

"A trilha inteira"


Entre as olheiras
E o que o ver queira,
A trilha inteira
Para aprender,
-Ah, que poder!-,
Uma maneira
De feliz ser
Junto a você.
Até fazer
Da vez, à beira
Do bis, certeira
Escolha: ter
Que conviver
Com a cegueira
Do amor, primeira
Certeza, a que
Tudo valer
Faz, com prazer.

Adriano Nunes: "A cantar o amor"

"A cantar o amor"


Se nada der certo,
Ao menos, é certo,
Vingará meu verso,
Distinto, disperso

A cantar o amor
Que pude propor
A ti, ou supor
Que assim era amor.

Se nada for justo
Qual teci, é justo
Que a ti fique junto o
Sonho de conjunto

Adriano Nunes: "Ηχώ"

"Ηχώ"


Palavra dura
Nunca mais dure.
Jamais procure
Escapar das
Cordas vocais.

Será loucura!
Pra que ferir
Alguém com farpas
Tão afiadas?
Pense nos ais!

Sim, permaneça
Presa à cabeça
Até que, súbita,
Desapareça.
Que importa mais?

Palavra dura,
Pra que dureza?
Perca-se inteira
Entre as sinapses.
Não é demais!

Na área de
Broca se finque
E não escape
Pela laringe,
Com sons fatais.

Palavra pétrea,
Para que pressa
De chegar à
Boca? Por que
Só não se esvai?

Adriano Nunes: "No coração" - para a minha mãe

"No coração" - para a minha mãe


Chove e não há
Outra certeza.
Talvez bem caiba
No coração
O que me deixa.
Ah, dor de ser
Quem mais me pinto!
Ah, dor de estar
No labirinto
Das coisas que
Apenas são!
Por que se alastra
Através da
Pele, da carne
Da arte, da
Verve que arde?
Como fazer
Para valer
A tentativa
De à vida já
Ofertar a
Mágica rara
Que se desprende
Destas palavras?

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Ἐρατώ" - para Antonio Cicero

"Ἐρατώ" - para Antonio Cicero


Estamos
Distante
De Atenas
Agora.

De cordas
Suaves
Sons saltam
E alcançam

Orelhas
Atentas.
Não raro,
Alguns

Dispersam-se
E escondem-se
Dos homens.
No bosque,

Pã para
A flauta.
Não há
Mais nada

Intacto!
"A amável!" -
Espalha-se o
Boato

Já rápido.
Até Cloto
E Átropos,
Cansadas,

Suspendem
Seu sério
Trabalho
Com almas,

Pra ouvirem,
Silentes,
A lira
De Erato.

terça-feira, 15 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Pãe & Mai"

"PÃE & MAI"


PAIPODESERMÃE
PAIPODESERMÃM
PAIPODESERMMÃ
PAIPODESERMÃE
PAIPODESEMÃEP
PAIPODESMÃEPO
PAIPODEMÃEPOD
PAIPODMÃEPODE
PAIPOMÃEPODES
PAIPMÃEPODESE
PAIMÃEPODESER
PAMÃEPODESERP
PMÃEPODESERPA
MÃEPODESERPAI

domingo, 13 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Amor"

"Amor"


Amor, somente o teu.
Explico: a vida inteira,
Os passeios na feira,
A astúcia de Proteu.

A tara que bateu.
Aquela dor primeira.
A mesma brincadeira...
Tudo para ser teu.

Amor? Quem te verteu
Em foz, dessa maneira?
Explica-me: a que beira
O sonho de ser teu?

Adriano Nunes: "O que cessa"

"O que cessa"


O que quer
O poema?
Com que esquema
É, não é?

Com que ética
Tudo mede?
Obedece
A que estética?

Feito pena
Por que é leve?
Por que à verve
Dá-se apenas?

O que almeja
Da incerteza?
Que se veja
A beleza?

O poema
Diz-me: pressa
Pra quê? Tema
O que cessa!

Adriano Nunes: "Sem saída" - para a minha mãe

"Sem saída" - para a minha mãe


Às vezes, tudo dói.
Os astros no alto infindo,
Os deuses além do que me peso e sinto,
O que há entre os mais íntimos.
Como agora.
Como dor
Que não soçobra.
Como dor
Que, por tanto doer,
Apavora.
Como o desejo que explode
O desejo de norte,
A vida sem vida lá fora.
Como a vida sem saída.
Que saída?
Aquilo que o poema esconde
E escapa por onde
Não dá para saber.
Às vezes, tudo brilha

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Ode à coriza"

"Ode à coriza"


Entre espirros e prurido nasal,
Outro decassílabo vem surgindo.
Parece que tudo é líquido e lindo,
Mas certo é que se faz um carnaval:

Mucosa congesta e muco caindo...
Contra a minha vontade, água e sal
Despencam lentamente natural,
Lacrimejam meus olhos, reluzindo.

Arre! De anti-histamínico preciso!
Até, quem sabe, de um antigripal...
Cada poema tem seu ritual!

Assim, entre espirros, et cetera e tal,
Vou construindo versos e, indeciso,
Em meu ser afogo-me, qual Narciso.

Adriano Nunes: "Poética"

"Poética"


Verter-te
Em verso
Pra ter-te
Pra sempre,

Pra ter,
À verve
Do ser,
Teu sexo

Complexo e,
Perplexo,
Querer-te
Prazer.

Adriano Nunes: "Entre o ver e a verve"

"Entre o ver e a verve"


Imerso no rubro quadro 
O azul quase intacto
Quase vermelho quase
Azul por inteiro e

Entre o ver e a verve
O polvo se põe e se ergue
Quase se move mesmo
Mesclado ao mar vermelho

Quase de si escapa
Tentáculos e massa encefálica
Tem vermelho no meio
Do azul como recheio

Do ver que mais salta?
Água que se reparte?
Algas à parte?
Quase nada

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Lógica"

"Lógica" - para Friedrich Nietzsche


Nada é real-
Mente igual.

Adriano Nunes: "Política"

"Política"

De pato
Inflável
Nas ruas
A agro
É pop,

Da casta
Acéfala
Que dança
Em nome
Da Pátria -

Que pátria?
Dos patos
De plástico?
Da classe
Histérica

Que bate
Panela?
Que, à parte,
Já sabe
Ser média?

Dos votos
Na Câmara
Simbólicos,
Do óbvio
Propósito

Das malas,
Da grana
Roubada
Às marchas
Apáticas,

Das provas
Que calam,
Do voo
Do ovo
Às vias

De fato,
Política,
Aqui,
É mesmo
Negócio

De espertos
Larápios,
Corruptos
Sem um
Escrúpulo.

O povo?
Tão tolo,
Tão dócil,
Tão povo,
Ao fundo

Do poço
Vai fundo,
Sorrindo,
Sofrendo,
Seguindo,

Qual tolo
Rebanho,
Vai junto...
Ser massa
É tudo.

Adriano Nunes: "Do ovo" - para Ricardo Silvestrin

"Do ovo" - para Ricardo Silvestrin


O po
Vo no
Fun do
Do po
Ço pôs
To do
O por
Vir no
Vo o
Do o
Vo po
Is to
Lo fo
Ra o
Tem po
To do

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Farol" - para Caetano Veloso

"Farol" - para o amado amigo Caetano Veloso


Somente a flor do querer para ver-
Ter-te numa canção, pelo prazer
De compor a emoção, para fazer
Valer o sonho, o amor, todo o viver.

Somente à foz do saber para ver
Se ao ter-te inteiro aqui, pelo lazer
De alargar a ilusão, e refazer
A lida, a verve, o verso avulso a haver

Noutra página alva, alvo incer-
To, do início, que fez brilhar, crescer
De "a" a "z", cá, moreno tom de nascer...

Semente, ser mais mente, amanhecer:
Mais do que podem metro e rima, o cer-
To do ser, farol deste acontecer.

sábado, 5 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Verdades" - para Péricles cavalcanti

"Verdades" - para Péricles Cavalcanti


Só há verdades para aqueles
Que querem saber de verdades.
Não adianta dizer que cabe
Numa verdade o que bem se quer.
Melhor é supor, antes tarde
Que nunca, que não há qualquer
Verdade. Deste modo, porém,
Cai-se num relativismo cego e
Perigoso. Sem a verdade
Nem mesmo esta afirmação de
Que não há verdades. Então, bem
Vê, há, ainda sem querer, ao menos,
Verdade. A que a lógica traz:
A que não se oculta jamais.
Por isso, imerso em versos, alheio
Ao que vinga falso ou verdadeiro,
Tento satisfazer - por quê? -
O ego de vate. O que quero
Que não mais seja verdade? E, atrás
Do que ficou pra trás e olvidado,
Sigo, lendo, compondo a arte
Que me ofertam Euterpe e Erato.
Não te afetas a existência plena?
O acaso diz: "queres que te atendas?"
Já não me importo com o fado
De estar em conflito em mim. Faz-se
Vital, pra a beleza suprema,
Isso: tudo virará poema.

Adriano Nunes: "Melodia"

"Melodia"


luizmelodia
luizmelodip
luizmelodpé
luizmelopér
luizmelpéro
luizmepérol
luizmpérola
luizpérolan
luipérolane
lupérolaneg
lpérolanegr
pérolanegra

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Estranheza"

"Estranheza"


O mundo. Podre como sempre
Pode ser. Cruel como sempre
Pode ser. Injusto com quem
Parece desvendar os seus mistérios.
Tudo é discurso e prática lesivos.
Tudo é algaravia, e massa acéfala
A girar, a sangrar e a seguir, como testa-de-ferro.
E não basta a alegria cega e frenética.
Não basta a dose de espanto e tédio.
O horror fétido atiça a fúria e mostra os dentes.
Ser gente é não compactuar com o outro, parece.
Ser gente é fazer parte do medo.
Do grande medo de tudo que é ser gente.
Somos obrigados a ficar lerdos e
Calados. A ficar à mercê do tempo de
Escravizar-nos, por causa da esperança que
Já não mais consegue deixar de ser
Manca e maliciosamente nefasta e ética.
Porque é esta a ética dos moralizadores secos.
Porque esta é a ética do rebanho que se verte
Em ordem legitimadora de violências e degredos.
Ah, tarde de não querer saber de nada mais e além!
Ah, instante de horror perigosamente nonsense!
Ah, cercas e farpas de ideologias frias e férteis,
Que têm engendrado assassinos e heróis e deuses!
Porque não há não há um abismo apenas,
Todas as vozes se perdem.
Todos os ecos se adensam em metas e méritos, em mescla
De todos os absurdos iridescentes.
Somos um erro. Sempre um erro. Sem conserto,
Ao que tudo indica. Desde a morte séria
De Antígona à ratoeira de Hamlet. Ao peso
Da existência de algum Buendía. Aos sem
Expectativa de nada. Ao silêncio
De tudo que tudo represente.
Ao horror mesmo.

Adriano Nunes: "Amor mesmo"

"Amor mesmo"


Já amei pernas,
Braços e peitos,
Olhos e flertes,
Lábios e até
Unhas do pé.
Aqui, confesso:
Muito amei mechas
Mesmo amarelas,
Risos e pele
Flácida, tesa,
Músculo e orelhas,
Partes pudendas
E o grã mistério
Por trás do sexo.
Amor, porém,
Intenso e além,
Só pelo verso.

terça-feira, 1 de agosto de 2017

Adriano Nunes: "Foi mais que isso"

"Foi mais que isso"

Já não te digo,
Astuto amigo,
Como de Cila
E de Caríbdis
Escapei vivo,
Sem mais feridas,

Como em perigo
Estive, ainda
Que a dor explícita
Não fosse. Digo:
Foi mais que isso.
Que em mim se finca?

Dirão que minto.
Que importa? Sigo
Pelo caminho
Do mar, qual filho
Do deus Posídon.
Sonhar, que implica?

O lar marítimo
Afaga o íntimo
Do que me sinto.
Ah, Circe é linda!
Grego perdido,
Não quero Ítaca,

Pra nada ligo.
Melhor explico:
A mim persigo,
Como quem fisga
Acaso e lida,
Ocaso e prisma.

Assim fugi
Do que limita,
Livre do vínculo
Que une o mito
À vida, misto
De ais, saída.

Já não te digo,
Silente amiga,
Quanto feliz
Fui, sem destino,
Nos véus das idas,
Nas despedidas.