sábado, 30 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: “Este que volta à ágora, sem presa”

“Este que volta à ágora, sem presa”


Em mim não há nada que seja teu.
Disso até bem sei desde quando era
Um ateniense, na arcaica Grécia,
Quando do fígado de Prometeu
O corvo não tinha arrancado mera
Migalha, desde quando a esfera pétrea
De Sísifo repousava no breu

Das sinapses sincréticas de Zeus.
Este que volta à ágora, sem pressa,
Agora sabe como a vez se deu,
Feito metáfora, quase quimera.
Ah, tudo já se espraia e se esfacela,
Por cada ritmo do que aconteceu!
De mim jorram lágrimas de Teseu.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: “Ó, poor pooh-bahs”

“Ó, poor pooh-bahs


Pooh-bahs
Behind the bars,
Cloistered are.

Strange stars
Of crime so far
From the poor

People and their
Desires and scars.
They have grabbed

Their lifes and
Ruined them.
They do not care!

They are happy
With their cruel acts,
Oppressing

The most needy
Human beings.
Ó, poor pooh-bahs!

Adriano Nunes:"Solidão"

“Solidão”


Os indivíduos solitários
Parecem ter dentro de si
O mundo. Parecem levar
Na aljava dos seus pensamentos

Cada sentido, cada mar
De silêncios, a cada passo.
Devem ser felizes sozinhos.
Devem ser tristes também,

Sem que ninguém os interrogue
Sobre a sua luz e o seu norte.
Por que amam demais os matizes

Da solidão? Que ganham, em
Segredo? Que estimado bem
Retêm em seus corações fortes?

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Proteu"

“Proteu”


No meio
De ritos
E ditos
Alheios,
Mais vivo.
Sei sê-los.

Não digo
De mim,
É cedo!
Mas sim
Dos que
Concebo

Da pele
Ao cerne
Do vasto
Desejo
De não
Ser mesmo -

Refiro-me
Àqueles
Que não
Sei - medo? -
Se são
Refeitos,

Por sonhos,
A cada
Momento,
Se são
Do âmago
Efeitos,

Ou se
Só são
Espectros
De outros
Que aceito,

Que vingam
Em mim,
Nos versos,
Sem, - juro! -,
Sabê-los
Inteiros,

Se usam
Meus métodos,
As mãos
Que são
As minhas,
Com jeito,

E instauram
O que
Já penso,
Ainda
Que trêmulos,
- Faceiros? -,

Ou se
São seres
Sós, cegos
De si,
Que, enfim,
Por vê-los

Efígies
Estéticas
Emprestam
À vez
Sóis, louros,
Voz, zelos.

Será
Que não
São, vê,
Ignoto
Leitor,
Espelhos,

Ou isso:
Espanto e
Instinto
Enquanto
A-penas
Escrevo?

Adriano Nunes:"Ser é alvo"

“Ser é alvo”


Madrugada.
Tudo e nada.
À palavra 
Dou-me intacto.
Ser é válido.

Madrugada.
Tudo é nada.
À palavra
Dou-me incauto.
Ser é vácuo.

Madrugada.
Tudo ou nada.
À palavra
Dou-me impávido.
Ser é alvo.

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: “λιμός”

“λιμός”


Não sabemos os nomes
Daqueles que têm fome.
Sabemos qu’ eles são 
Muitos, nesta nação.


Seus risos? Vimos não!
Seus olhos como estão?
Não sabemos seus nomes...
Sabemos das grãs fomes!


Que sonham? Moram onde?
Por que o Estado os esconde?
Em que gelado chão 
Dormem, sem proteção?


Que sabemos, então?
Sabemos mesmo em vão?
Quantos apenas comem
A ilusão do ser homem?

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Proeza"

“Proeza”


Nem tudo
Que quero
Agora
Eu quis
Outrora.

Nem tudo,
De forma
Idêntica,
A mim
Importa.

Nem tudo
É mesmo
Igual.
A busca
É órfica:

Que adianta
Olhar
Pra trás?
A vida
Dá corda...

Até
O meu
Desejo
Já me
Fez sobra.

Se abro
A porta
Pra o que
Em mim
Aflora,

Por que,
Então,
Sentir,
Às vezes,
Sufoca?

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Do prazer"

“Do prazer”

Do desejo
Só desejo
De prazer

Até não
Mais haver
Tal desejo.

Um prazer
Que já valha
O infinito 

Do teu sexo,
Falso ou vero,
Mais que isto,

Tudo mesmo.

Adriano Nunes: “Πηνελόπη” - para Péricles Cavalcanti

“Πηνελόπη” - para Péricles Cavalcanti


A insônia... Sempre ela,
Pela madrugada, a lançar-me
Nos arredores de Ἰθάκα, antes
Mesmo da chegada de Οδυσσεύς.
Sempre ela a atirar-me aos cães vorazes
Dos portentos do passar das horas.
Por onde perambula Μορφεύς?
Por que não me entrega àquele
Sonho que o porvir e o além revigora,
Sem dores ou culpas peremptórias?
Por que não me afaga o Λήθη?
Silêncio! Quem se aproxima, trôpego,
Do quarto de Πηνελόπη?
Quem ousa observar através das frestas
Da ilusão tudo que se passa, ali,
Entre os móveis e a astúcia humana?
Quem desafia Μῆτις?
Por que há um desfazer de bordados,
Uma pressa em desconstruir o feito,
A arte, o engenho mesmo? Por que há
Uma angústia dilacerante e risonha,
Por trás de cada fio que se solta e pende, livre, fio apenas,
Como se estivesse perdido o sentido
Enquanto tudo é alegremente desfeito?
Quem acaba de dar vez ao devir?
Quem ousa detectar, em silêncio, o ato
Calculado, por amor, por esperança,
Enquanto as Μοῖραι dão êxtase ao existir?

Adriano Nunes: "Modernidade"

"Modernidade"


Entre a lua cheia
E o caos que semeia
Poemas na veia,
A vida passeia.
Beijos densos, ei-a:
A ilusão alheia?
O michê diz: "ei, a
Moeda é a ceia,
Bitcoin, sem mais meia
Conversa. Deixei a
Atrasada aldeia..."
E não titubeia!

Adriano Nunes: "Will"

“Will”


My dear friend Will,
This is a simple poem
That I am trying to compose
For you. Receive it as if
I were giving you an Im-
Measurable fragment
Of everything that I think and feel.
My sweet friend Will,
This simple poem is a rose
That changes its color every instant.
It knows, ó it knows, it always knows
My heart, any heart, full or empty!
Why is chance even inconstant?
Ó, my gracious friend Will,
Friendship is a bridge to good will!
With joy and wonder, my verses will fill...
For you, because this is an
Innocent poem, yes, just one
That I am trying to compose...
While I hide in old drawers some clothes
Of the Infinite and the Solitude.

Adriano Nunes: "Oblivion"

“Oblivion”


Do not just think.
Evenly a pendulum toward
Reason and emotion
You can be.
To be a being more human.
Do not just to look like.
Forget everything
That has already ceased.
And in this never-ending
Balance,
Try to know yourself
At least.

sábado, 16 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Os corpos todos" - para Alberto Lins Caldas

"Os corpos todos" - para Alberto Lins Caldas


Os arredores
De Troia. As chamas.
O horror se vale
Do que aqui pode.
Os corpos todos
Mortos e quase,
Pela memória.
Sangue, suores,
Seiva de ódio e
Do que se clama
Por amor e
Erro, o que morre,
O que já mata.
Ainda há
Um barco intacto.
Se o pegaremos,
Não sei. Sem norte,
Estamos mesmo.
E temos medo
Do que mais somos.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Das saídas"

"Das saídas"

Pode ser
Beco, fresta
- Nada é muito! -
Pode ser
Porta aberta,
- Eis o rumo! -
Pode ser
De emergência,
- Somos únicos!
Pode ser
Pelo ser
- Eis o mundo! -
Pode ser
Pelo verso
- Não é tudo? -
Pode ser
Até mesmo
- Pelos fundos? -
Pelo jeito
Pode ser...
- Nós dois juntos! -

Adriano Nunes: "Saudade"

“Saudade”


Saudade
Dos braços,


- tão rápidos! -

Saudade
Das pernas,

- Elétricas! -

Dos lábios
Que eram

- Que faço? -

Mais que
Dois lábios

- Que festa! -

- Prazer -
Pois laços

- Desfaço-os? -

Que eram
Quimeras

- Que impacto! -

Fixavam
A vida

- A estética? -

Em um
Desejo:

- O acaso? - 
Seus beijos

- Quem dera! -

Só ter.
Seus toques!

- Que máximo! -

Pra que
Fui dar

- Na vera! -

A volta
Por cima

- Não era? -

Do que
Ainda

- É claro! -

Clamava
Por lógica,

- Qual meta -

Só por
Você?

sábado, 9 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Abraço"

“Abraço”

Elo
Entre o
Olho e
Eros

Sol
Do
Peito
Perto

Certo
É
Que
Quero-o

Átimo
Entre
Laço e
Sexo

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "Outdoor"

"Outdoor"


Quando você veio,
- Não sei bem se era
Março ou fevereiro -
Tão pouco me disse.

Não disse a que veio,
- Ah, não disse mesmo! -
Não disse goodbye
E partiu ligeiro...

Acertou-me em cheio,
Tirou minha paz.
Por que, enfim, me disse
Que me amava mais?

Quando você veio,
Estava uma fera
Sem rédeas, sem freios,
Reconheço! Triste

Estava, sem meios
De nada, já preso
A ideias banais...
Aí você veio!

Adriano Nunes: “A linguagem do amor”

“A linguagem do amor”


A linguagem do amor
É o silêncio - dizem os
Que temem falar sobre
Os sentimentos e os

Que já vítimas foram
Dos seus dolentes jogos.
Outros - e não são poucos! -
Porém, dizem que só

Dizendo muito do amor
É que, a priori, se pode
Entendê-lo melhor.
Há aqueles que, por

Medo ou timidez, logo
Que percebem o modo
De atuar do amor, põem
De lado a fala: os olhos

Usam como propósito.
Porque parece óbvio
Que do amar é ignoto
O sol. Outros dão voto

Para algo como a sorte:
A língua do amor move-se
Sem gramática ou norte.
Uma vez pensei - tolo

No todo - que era o amor
Que ditava do corpo
À alma, todo o escopo
Da linguagem, rei solto

De regras, pouco a pouco.
Que equívoco! O amor foge
Das palavras, dos nomes,
Para fincar-se forte

No coração dos homens.
Todo lugar é onde.
Todo tempo é corte.
Toda voz o consome.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: "In totum" - para o amigo Richard Fonseca (por seu dia)

"In totum" - para o amigo Richard Fonseca (por seu dia)

Se entre
O nada
E o tudo
Há o
Caos múltiplo,

Se entre
O vácuo
Dinâmico
Do mundo
E os deuses

Ignotos,
Já surdos
E mudos,
Há algo
Profundo,

Talvez,
Quem sabe,
Qualquer
Vontade
Ou rumo.

Talvez,
Da idade
O risco
Abrupto,
O sumo.

Adriano Nunes: "Desejo"

“Desejo”


Eu vejo
Você.
Você 
Também
Me vê.
Quem tem
A ver?

Ninguém
Vê que
Você
Eu vejo.
Nem que
Você
Me vê.

Parece
Até
Que flerte
Há entre
A gente.
Desejo,
Decerto:

Há mesmo
Um nexo
Esperto.
Parece
Que é
A lei
Do verso.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Adriano Nunes: “Can you hear the larynx of graphite?”

“Can you hear the larynx of graphite?”


I have had many dreams.
And now my heart is
Complaining about me 
Because there is not any-
Body here to hear
Its beats, be-
Cause I am alone here,
With my endless dreams.
I think that I
Will use those wings
Of wax, to fly high,
Higher and higher.

Against my eyes
Its pleading beats conspire.
Tonight it might hear
Another beat, different from these.
I will be quiet. I will remain quiet.
I will not say anything.
My silence will be
The password of desire.
Can you hear it,
Pulsating unknown infinites?
Can you hear
The larynx of graphite?

terça-feira, 28 de novembro de 2017

William Blake: "The Smile" (Tradução de Adriano Nunes)

"O Sorriso" (Tradução de Adriano Nunes)

Há um Sorriso de Amor
Há um Sorriso de Engano
Há um Sorrir de Sorrisos
No qual se amalgamam ambos
E há um Esgar de Ódio
E um Esgar há de Desdém
E há um Esgar de Esgares
Que em vão tentas esquecer
Pois no Ictus Cordis finca-se
Fundo na Espinha Dorsal
E Sorriso sem ter sido
Mas Sorriso só somente
Que entre o Berço e o Jazigo
Vez só Sorrir pode ser
Mas quando Sorriso é
Finda as Misérias até

William Blake: "The Smile"

There is a Smile of Love
And there is a Smile of Deceit
And there is a Smile of Smiles
In which these two Smiles meet
And there is a Frown of Hate
And there is a Frown of Disdain
And there is a Frown of Frowns
Which you strive to forget in vain
For it sticks in the Hearts deep Core
And it sticks in the deep Back Bone
And no Smile that ever was Smild
But only one Smile alone
That betwixt the Cradle & Grave
It only once Smild can be
But when it once is Smild
Theres an end to all Misery

BLAKE, William. "The Smile". In:______. Poetry Foundation. Acesso em 28/11/2017.

Adriano Nunes: "Anywhere"

“Anywhere”


There or here.
Everything is
As everything 
Is. Like this.


Here or there.
All thoughts flare
Because they’re
Free in the air.

There or here.
Here or there.
All matters matter.
Ear is to hear.

Eye is to see.
All doubts dare.
There or here.
Here or there.

Adriano Nunes: "Cantar basta"

“Cantar basta”


Madrugada.
Das duas passa.
Talvez, nada
Mais me faça
Feliz. Alma -
Quanta para
Quê? Quem capta
A vez rara
Do que calha
Quando mágica
Faz-se a fala?
Solto, em casa,
Ser me afaga:
Dou-me asas...
Cantar basta!

Adriano Nunes: "Também este soneto"

“Também este soneto”

Já noite alta. Imerso
Em princípios e regras,
Em conceitos diversos,
Vou-me, assim, desfazendo,
Como se fosse essa a
Lida que me interessa.

Entre artigos e textos
Jurídicos me perco.
Da doutrina ao que atestam
Os precedentes, vejo
Quão complexo o Direito
É, cheio de incertezas.

Também este soneto
Estranho-o ao concebê-lo!

sábado, 25 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Pela arte"

"Pela arte"

Ler-te em cada
Canto da
Sala, em toda
Casa, sem
Mais mancada,

Dar-te, enfim,
Outro verso,
Outro abraço,
Cais diverso
Em que caço o

Mar sem fim
Do ser, laço
De algum bem
Que enfeitou
Nosso sonho.

Editar-te
Feito o dia
Que renasce,
Feito arte
Que irradia.

Reviver-te
No que vale
E componho,
Quase estrondo:
Por amor.

Adriano Nunes: "A beleza"

“A beleza”


Nem a lua
Sobre o teto.
Nem aquela
Bela estrela

Tão distante
Que parece
Um planeta
Que se deixa

Voltas dar
Em seu eixo,
Por não já
Ser ao sê-la,

Piscar, lá.
Nem o báratro
De um olhar?
Não se esqueça

Do reflexo
Sobre o mar!
Sequer rastros
De um cometa

Que pareça
Ser estrela.
O que quer
Que bem seja.

Talvez vácuo
Vasto, o átimo
Do pensar
- Verve acesa! -

Que há noite,
Sobre tudo
Que há, sobre
As certezas...

Que mais há
Nesta noite,
Sobretudo?
A beleza?

domingo, 19 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Entre esperanças"

“Entre esperanças”

Novembro esvai-se.
Quase dezembro.
Quase me lembro
Do que não arde
Mais, nesta tarde.
Quase outro ano.
E foram tantos!
Presa, contida,
A eternidade!

Sem ti, segui.
Doeu bastante
Naquele tempo,
Porque do amor
O fim é, antes
De tudo, corte
Demais sangrento.
Ah, livre olhar
Que molda a arte

Do que não há
Entre esperanças
Sem norte! Sorte
De quem em ti
Pode pousar!
O verde estando
Mesmo presente
E assombros que
Do sol se valem:

Marrom e cinza,
O campo aberto
Mais se estende...
Ser de repente?
Sem ti, que tenho
Feito de ti
Em mim, se quase
Não há mais nexo
Para a saudade?

Adriano Nunes: "Manhã"

“Manhã”

Não sei
Se segue
O carro
Dourado
De Hélio
A trilha
Por Zeus
Traçada.

Será
Que Apolo,
De novo,
Sob manha,
Furtou
Do dia
As rédeas,
A saga,

E brinca
Co’ a sina
De tudo
Que a vida
Anima?
Ah, clara
Aurora
Sináptica!

terça-feira, 14 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Saudade"

“Saudade”

A tarde
Desfaz-se.
Que fiz
De mim?
Que anseio?
Que vale
Ser mesmo?

Feliz
Quem é,
Se antes
Do fim
Até
A álea
Lançada

Já não
Diz nada?
Desfaz-se
A tarde
Perante as
Palavras
Sem rédeas.

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Ars poetica"

"Ars poetica"

A arte
Com calma
Tem carne
E alma,

Não tem
A pressa
Que tudo
Tem, mas

Bem antes
De ter
O que
Tem tudo,

A arte
Tem tempo
Pra ter
Seu tempo

No mundo.
Pois bem:
A arte
Vez tem.

Alexander Posey: "Autumn" (tradução de Adriano Nunes)

"Outono" (tradução de Adriano Nunes)

No sonhador silêncio
Da tarde, uma
Veste áurea é tecida
Sobre o prado e a mata;
E o pássaro, há pouco
Caído do cosmo,
Acenos cordiais espalha,
E o ar é preenchido com
Folhas rubras, que, caindo,
Erguem-se de novo, como sempre,
Com um suspiro inútil para
Repousar - e é Outono.

Alexander Posey: "Autumn"

In the dreamy silence
Of the afternoon, a
Cloth of gold is woven
Over wood and prairie;
And the jaybird, newly
Fallen from the heaven,
Scatters cordial greetings,
And the air is filled with
Scarlet leaves, that, dropping,
Rise again, as ever,
With a useless sigh for
Rest—and it is Autumn.

POSEY, Alexander. "Autumn". In:_____. The Poems of Alexander Lawrence Posey (Crane & Co., 1910). This poem is in the public domain.

sábado, 11 de novembro de 2017

Adriano Nunes: “Canção da manhã”

“Canção da manhã”


Alto cantam os pássaros
A aurora anunciando.
Não só os galináceos 
Sobre o muro. Rápidos
Ritmos de periquitos
Vêm além e contínuos,
Como se fossem hinos
Em louvor matutino
À vida do que ferve
Ante a força das rédeas
Do deus Hélio. Decerto,
Os cavalos despertos
Estão! Sonhos tão novos!
Ah, quantos vãos propósitos
Abrem bocas e olhos
Pra desejos ignotos!
Avexam-se avestruzes
Ao primo raio. Urge
O devir que mais supre
O sol de cada um.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Adriano Nunes: “Yarelitzev”

“Yarelitzev”


Naquele dia, Yarelitzev morreu.
Não se ouviu pranto.
Não se ouviu pio de corujas.
Não foram vistos peregrinos na estrada
Que leva a Kranóvia.
Seu corpo estendido no piso frio do quarto
Apenas indicava que nada mais poderia
Ser feito para Yarelitzev.
Precisamos ter um pouco de calma.
Não se deve ter pressa para dizer dos mortos
Que eles não mais poderão ter sonhos,
Que eles não mais poderão ter sorte,
Que eles não mais poderão ter somas ou subtrações
Entre as subidas e descidas de escadas,
Entre o abrir-fechar das gavetas e o tilintar das moedas.
Sim, devemos ter cautela.
Os mortos podem não estar tão mortos
Como pensamos. Pode ser que sejamos
Nós os mortos e tudo se passa em flashback,
Como tortura ou alívio,
Como escárnio ou experiência de laboratório.
Naquele dia, sem saber por que morreria,
Entre o caos e o determinismo perigoso
Dos ponteiros do grande relógio da sala,
Yarelitzev constataria que a vida é breve.
Não se ouviu grito de desespero.
Lágrimas, quem poderia tê-las visto?
Ninguém acusou ninguém.
Nem o vazio de tudo pulsou seu horror.
A vida continua em Kranóvia. São dez para as dez.
Tudo se refaz. Parece que
Em algum lugar da casa, há um sentido
De ilusão ou desatino: o corpo
Despido, sem movimento algum.
Ah, vão dizer: é o velho Yarelitzev!
Será que irão mesmo dizer
Que a vida fora injusta e cruel
Para o velho Yarelitzev?
Naquele dia, Yarelitzev morreu.
Não se viu luz nas línguas de marfim.
Não se ouviu o uivo dos lobos.
Não foram vistos Dioniso e o séquito de ébrios na estrada de silêncios
Que leva ao vácuo da álea
De haver tudo e nada, perto do fim.
Seu corpo, outra metáfora, no liso piso do quarto
Apenas indicava que nada mais poderia
Ser feito para Yarelitzev.
Ninguém jamais perguntou se
A felicidade ao velho Yarelitzev
Ainda à verve serve?

Adriano Nunes: "Angústia"

"Angústia"

Meu ser e o vácuo
Inescapável
Do quarto... Átimo
De alívio paira

Sobre a palavra
Que se faz dada
À foz da fala.
Que mais me marca

Enquanto a alma
Ignota vaga
Por aí? Crava-se,
Em mim, o nada.

Adriano Nunes: "Esperança"

"Esperança"


O mundo
Lá fora
Fervilha.

Profundo,
Perigoso,
Distante.

Enquanto,
Adentro,
Em mim,

Há ilhas,
Sem fim,
De gozo e

Espanto.
Apenas
O tempo

É, antes
De ser
Meu tempo,

Instante.
Portanto,
Portento.

sábado, 4 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Relâmpagos"

"Relâmpagos"

Aflito
Eu grito:
Erato,
Que faço

Pra estar
Em mim,
Urgente,
Imerso,

Pra atar,
Pra sempre,
Na mente,
Tal laço?

Euterpe,
Que verve
Mais serve
Ao verso?

Diante
Do vácuo
Silente
Do quarto,

Relâmpagos
Sinápticos,
Rabiscos
Diversos.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Corpo"

“Corpo”


Não há tempo
Que seja só raro.
Não há espaço
Que seja só centro.
Há, máxime, claro,
Este pensar o
Mundo adentro
Enquanto me caço.

Adriano Nunes: "Ilusión"

"Ilusión"


Ven, palabra, ven
No hay más saga
Que alegre me haga
No hay nadie también

Ven, palabra alada,
Con tus sentidos
Y ritmos imprevistos...
¡Ven parir el mundo!

Ven, hecho brasa
U otra cosa brava
Que alivio traiga...
O tormento, ven,

Palabra loca,
Ven, allá de la boca,
Del ser-palabra,
¡Ven a ser todo y nada!

Adriano Nunes: "Angústia" - para a minha mãe

"Angústia" - para a minha mãe


Angústia. Esta palavra
Entre palavras que se lançam leves
À amplidão da página alva.
Esta palavra que diz do porvir,
Do que ainda não é,
Do que já fere, fermenta, maltrata.
Quase corpo. Quase âmago. Palavra.
Talvez, fosse um bálsamo
Sabê-la, desde logo.
Saída de algum absurdo báratro?
Talvez, fosse possível
Prevenir-me de minhas sinapses,
Dos seus assaltos de dor, dúvida e tormento.
Talvez, fosse necessário
Rasurá-la, sob as incógnitas dos desejos,
Do amanhã, do não haver nada.
Ah, mas ela surge, abrupta, no verso
Como se quisesse dizer que está presente,
Que tem força, táticas e estratégias exatas,
Que tem fôlego para fazer o peito ser sentido apertado,
Como se não houvesse outra coisa
A não ser sabê-la intacta, de fato.
Angústia. Tudo abraça átimos...
Quem, quem mesmo escapa
Da semântica inocente e fatal das áleas?
Angústia. Esta palavra
Entre signos, sons e detalhes
Da cada artefato da casa, do vácuo do quarto...
Talvez, revele as minhas tristezas estranhas,
As entranhas do que minto.
Talvez, dilacere a delicadeza, por instinto.
Palavra dada a labirintos de insônias,
Chás de hortelã, livros tantos, auroras flagradas.
À flor do que me basta, quem me sinto?

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

Adriano Nunes: "Judith Butler"

"Judith Butler"


She comes like a strong wind
That knocks down fences,
That destroys prejudices and violences,
She comes like a dragonfly
That in the air dances,
That gives hope to our soul.
She comes with her calm, as Thinker.

She comes like a colossal wave
That stands up against the hate
Of those who hate,
Against the nefarious dogmas,
Against the pernicious status quo,
Against hypocrisy. She comes
With her festive joy.

She comes against all oppressions,
Against patriarchy and its damaging effects .
She comes against binary conformism,
Against cruel censorship,
Against the dangerous stupidity of common sense.
Everything for her goes by.

She comes because she must come,
Because it is necessary to fight
Against the darkness
Of terror and ignorance.
She comes like a bird.
To teach us
How it is still possible to fly.

Yes, against tyrants she comes,
She comes like a bomb!

domingo, 29 de outubro de 2017

Adriano Nunes: "Ars poetica"

"Ars poetica"


A minha cabeça
Diz: desobedeça!
A minha ilusão 
Diz: tens a razão!
Pobre coração,
Não diz mais nada,
Cansou de infeliz
Ser e dar mancada.

A minha cabeça
Quer outra incerteza.
A minha emoção
Quer ficar acesa.
Tolo coração,
Não quer mais alma,
Cansou do que quis,
De manter a calma.

A minha cabeça
Pensa até ter mão!
Minha solidão
Baila entre as tretas
Do meu coração.
Ah, por que me fiz
Em migalhas, para
A voz que me ampara?

sábado, 28 de outubro de 2017

Hart Crane: "October- November" (tradução de Adriano Nunes)

"Outubro-Novembro" (tradução de Adriano Nunes)


Sol de verão indiano
Com plumas rubras que chicoteia a bruma, -
Afunda-se através do filtro de treliças
E doura a prata nos assentos sujos.
Agora ouro e púrpura fulguram
Nas árvores que parecem dançar
Em delírio;
Então a lua
Em uma louca laranja labareda
Inunda a noite de penduradas uvas.


Hart Crane: "October- November"


Indian-summer-sun
With crimson feathers whips away the mists,—
Dives through the filter of trellises
And gilds the silver on the blotched arbor-seats.
Now gold and purple scintillate
On trees that seem dancing
In delirium;
Then the moon
In a mad orange flare
Floods the grape-hung night.


CRANE, Hart. "October-November". In:_____.Academy of American Poets. URL: https://www.poets.org/poetsorg/poem/october-november. Acesso em 28 de outubro de 2017.

Adriano Nunes: "Μοῦσα"

"Μοῦσα"


Não há
Instante
Estético
Em que
Teu ser
Poético
Não marque
Presença.
És arte!

Estás
Em cada
Parte
Das Odes
De Horácio
Ou de
Fragmentos
De Safo.
Não tardes!

Sim, digo
A ti:
Não é
Tão fácil
Assim.
Do grego
Ao grácil
Latim,
À carne

Do átimo,
Ah, quanto
Aos versos
Antigos
Bem devo,
O metro e
O ritmo
Notáveis!

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Adriano Nunes: "Las rosas"

"Las rosas"


Las Rojas
Y blancas
Mis rosas
Se mueven
Al viento.

¡Ah, sólo
Mis ojos
Están
Atentos
Cogiendo

Las hojas,
Los brotes
Y los
Colores!
¿Por qué

Ningún
Camino
Persiguen,
Si riesgo
Hay siempre

En toda
Salida
Querida?
¡Ah, vengan
A verlas!

¡Las blancas -
Hay tantas!
¿Las rojas -
Qué alojan
Ahora?

¡Ah, vengan
A verlas,
Las rosas
Del Tiempo
Hermosas,

Con sus
Espinos
Nocivos,
Su estética
De olvido!

Adriano Nunes: “Prometeo”

“Prometeo”


¿Por qué es necesario
Rasgar el corazón
De todo lo que hay
Entre lo que espero
De las esperanzas
Y los vestigios
De lo que me pienso
Y siento, cuando sólo,

Cuando la mirada
Parece que sólo
Quiere engendrar
Las tantas lágrimas?
¿Por qué es necesario
Dejar el pecho
Apretado, estar
Triste, para entender

La frialdad de los acasos,
La violencia de los deseos,
De los sentidos?
Ah, cómo rehacerme
De los horrores de los ecos
Del ego, de la existencia?
Ah, cómo saber si aún
Arde el instante raro

De la libertad,
De lo que parece estar
Siempre nos podando,
Siempre nos prometendo
Que, de algún modo,
Vamos a romper las cadenas
Y liberarnos de las bicadas
De los cuervos hambrientos y rabiosos?

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Adriano Nunes: "Poético amar"

Poético ar”


Chove. Tudo enquanto
Tudo, quase pranto.
Que rima à vez dar
Para recordar

Quando for manhã, 
E a existência - vã -
Não mais for, pois, já 
Em nós dois sóis há

Que brilhem demais?
Chove, além dos ais...
Entre o cais e o mar
Do que dá pra amar.

Chove? Madrugada
Para tudo ou nada.
Aqui, nunca está...
Por que agora está

Em minhas sinapses,
No correr do lápis,
No nó do sonhar,
Poético ar?

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Adriano Nunes: "Inquietud extraña"

"Inquietud extraña"


¡Otra tarde!
Otro tiempo que en mi corazón arde.
¿Qué quieren mis ojos de ilusión?
¡Ah, cómo yo quise dar al poema todo
Que cada rima y cada metro pueden!
¡Ah, cómo yo quise dar a la vida del verso
La verve indestructible de la alegría y del sueño!
¡Otra tarde!
Otro rincón de asombros y miedos.
¡Ah, cómo yo quise dar a mis esperanzas
Todas las posibilidades de infinitos!
¡Ah, cómo yo quise romper con las reglas rígidas
De las indiferencias de conocidos y desconocidos,
De los personajes que abrigué en mí
Sólo para cantar el instante de luz
En que ya no son necesarias las lágrimas!
¡Otra tarde!
Otro porvenir que me mira,
Mientras escribo.

Adriano Nunes: "Brasil"

"Brasil"


Brasil -
Comédia?
Tragédia? 
É certo
Que a coisa
É séria!
País
Que não
Tem como
Ser como
Bem quis,
Lugar
Em que os
Tais liber
Ais made
In China
Dependem,
Demais,
Pra sempre,
Qual vírus
Ou tênias,
Do Estado.
E como
Dependem!
E os tais
Comunas
Jamais
De luxo
Abdicam!
Ter mais
Não é
Ter tudo!
Há quem
Entenda?

Adriano Nunes: "Nihil"

Nihil



No hay nadie. 
No hay nada
Para ser como usted.
Ni siquiera las palabras!
¡Ah, corazón que,
Casi ahora, casi
De la caja torácica
Salta!
No hay nadie...
No hay nada.

sábado, 21 de outubro de 2017

Adriano Nunes: "Ícaro"

“Ícaro”


Ver-te em voo, ver-
Tente do ser, verve
Da vida que ferve,
Do que se faz ver.

Ver-te avulso, ver-
So, semente leve
Que se leva e serve
À vez do viver.

Ver-te vácuo a ver-
Ter-se em ultraleve e
Voar - tudo é breve! -
Sem nada antever.

Richard Wilbur: "The House" (Tradução de Adriano Nunes)

Poema de Richard Wilbur (vencedor de 2 Prêmios Pulitzer em poesia: em 1957 e em 1989. Falecera este mês, no dia 14, aos 96 anos) traduzido por mim:

"A casa" (Tradução de Adriano Nunes)

Às vezes, ao acordar, os olhos fecharia
Pr' última olhada à casa branca qu' ela viu
No sono sozinha, e que título não possuía
E não tinha ainda entrada, pra seus cicios.

O qu' ela me disse daquela casa dela?
Portão branco; terraço; basculante à porta;
Andar de viúva acima da costa pétrea;
Ventos de sal que irritam abetos à volta.

Agor' ela está lá, onde quer que ser possa?
Somente um homem tolo esperaria achar
Tal paraíso feito por sua mente utópica.
Noite após noite, meu amor, eu pus o mar.


Richard Wilbur: "The House"


Sometimes, on waking, she would close her eyes
For a last look at that white house she knew
In sleep alone, and held no title to,
And had not entered yet, for all her sighs.

What did she tell me of that house of hers?
White gatepost; terrace; fanlight of the door;
A widow’s walk above the bouldered shore;
Salt winds that ruffle the surrounding firs.

Is she now there, wherever there may be?
Only a foolish man would hope to find
That haven fashioned by her dreaming mind.
Night after night, my love, I put to sea.

*From Anterooms: New Poems and Translation by Richard Wilbur. Copyright © 2010 by Richard Wilbur. Houghton Mifflin Harcourt Publishing Company. Disponível em: https://www.poets.org/poetsorg/poem/house.