domingo, 3 de setembro de 2017

Adriano Nunes: "Como se dá a alma"

"Como se dá a alma"


Eu sei que eu poderia te ofertar
O mar e as ondas altas,
O ar e para voar as asas,
O que não há,
Toda álea,
O que pode já o pensar,
Até a alegria que Spinoza retrata.

Ah, eu dei para me conformar
À tua ausência vasta,
À tua outra casa,
Àquela viva valsa
Que insiste em povoar a mente cansada,
Porque, dizem, que o amor basta,
Porque disseste: "basta, não é nada!".

Eu sei que eu poderia chegar a
Teu ser, com o furor lírico de uma rima rara,
Presentear-te com o que pode a fala,
O silêncio de um átimo que te caça
Pelos arredores e corredores das palavras,
Eu bem que poderia voltar atrás...
Mas por que parece não dar mais?

As plantas secaram, rasguei as cartas nunca enviadas,
Deixei também de dá-las!
Ah, furtei-me de ir mais fundo sem traumas,
Deixei o medo cercar-me qual dádiva,
Cantei o tédio e a raiva mais demorada
Para ver se me sonhavas.

Ah, eu poderia dar-te céus e estradas
E tudo que tudo enfim significa às claras,
O lado de lá, as ilhas Galápagos, Saaras,
Gobis, Atacamas, as montanhas geladas,
Atlântida, Macondo, Ítaca, Esparta!
Ah, eu poderia retirar de tudo o que tudo exala,
Só para te dar, como se dá a alma.

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