quinta-feira, 1 de junho de 2017

Adriano Nunes: "Nas raspas últimas do desejo"

"Nas raspas últimas do desejo"


Nas raspas últimas do desejo,
Um tumulto entre as sinapses.
Estrondo? Estorvo? Excitação?
Não há como saber se
Ainda vale a pena rasgar-me
Com as miméticas metáforas que
Afiadas foram com o afinco dos outros,
Com a aflição dos sonhos que são
Os sonhos de todos.
O que importa a esta hora mesmo
Em que tudo me fere e forma?
Ah, esquecimento de ser só
A desventura do átimo-nó
Das expectativas de fugir,
De vez, de quem me sinto e penso!
Ah, sulfúrea saudade de não-ser!
No breu desta madrugada,
A vida de tudo do infinito salta.
Até este risco perigoso
De haver deuses e desencontros adentro,
Este risco de engendrar-te, ó gozo
Ante o espelho: palavra quase
Pele e ponte, proezas peripatéticas e carne.
E, subitamente, quanto mais quero
Que não passe o tempo,
Sobre tudo que vinga e arde
A manhã vejo
Lançar-se.

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