segunda-feira, 2 de maio de 2016

Adriano Nunes: "Yoravsev e as queixas de Daryn"

"Yoravsev e as queixas de Daryn"


Há pouco, Yoravsev abrira a loja
Que tudo vende e tudo compra.
De vários lugares, muitas pessoas
Vêm à porta do mercado, prontas
Para terem algo. Pouco importa
O valor. Ou o que se entende por
Valor. Da alma ao corpo, do sonho
À vida dura e cruel, mundos expostos
Para todos os mais diversos gostos.
Yoravsev arruma cada peça, com todo
Cuidado. Sabe bem que o seu Senhor
É uma fera ainda sem qualquer modo
Domesticado. E do outro lado do
Bairro podem-se ouvir os gritos soltos,
As queixas histéricas, esses sons
Do alto comando, quase incômodo
Para os que passam. Yoravsev só
Tem um pensamento: tirar o pó
Das horas do inalcançável robótico,
Pois sente que, além de vãos propósitos,
Há uma alegria tirânica e recôndita
Na obediência cega às repetidas ordens
Do Senhor Daryn. Ah, o mercado forte
Do velho Daryn! Parece ser um monstro
Com tantos membros, com tantos olhos
Que monitoram cada coisa posta
À venda. Uns perdem jeitos, juras, joias,
Outros compram rins, rezas, ritos, roubos, rosas.
Outros vendem outros já mortos
De esperanças e desenganos. Moços
Com deliciosos corpos propondo-se
A explodir, desde que lhes possam
Garantir no paraíso dar uma volta,
Ter um harém em troca. Já ouço -
Desculpem-me interromper o negócio
Descritivo! - um grito de horror do
Senhor Daryn: "venham todos! Todos!,
Eis a novidade vinda lá do fundo do fosso
Da mente dos homens! Só hoje
Estão à venda alguns deuses e - ouçam agora! -
A caixa de Pandora! Sim, a de Pandora!
Yoravsev, seu porco preguiçoso,
Traga a caixa para que os senhores
Possam contemplar e preço pôr!"
Bem que Yoravsev poderia, de novo,
Abrir a Caixa. Libertar o nada, o gozo
Espúrio das lembranças, o nome
Letal das ilusões que do amor brotam.
"Yoravsev, seu porco preguiçoso,
Não deixe essa caixa cair, veja o povo
Sedento de desejos por ela, por
Tudo que pode trazer tristeza e dor!"


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