domingo, 3 de julho de 2016

Adriano Nunes: "Yaszehim sorri"

"Yaszehim sorri"


Só a sombra de Yaszehim
Ainda perambula pelos campos
De trigo à procura de Yaszehim.
Só as mágoas de Yaszehim
Ainda saem dos olhos da vida
Atrás de Yaszehim, outra vez,
Infinitamente. Só as astúcias
De Yaszehim entendem bem
O que Yaszehim pensa e sente
Quando pensa e sente ser só
Yaszehim. O dia acabará logo.
Outras dores virão. Outros
Momentos para cuspir, longe,
Outras marcas que se forjam
Como memória e esfacelamento.
Virão - como sístoles sísmicas.
Batem à porta. Forte batem
À porta. As desesperanças de
Yaszehim querendo achá-la?
Os campos de trigo, a casa velha
Com vasta varanda de jacarandá:
Tudo podre. Tudo sem âmago.
Nem glória. Nem gozo.
São dez para dez. Yaszehim
Lança-se ao breu dos absurdos
Desmedidos da satisfação.
Não quer cortar os pulsos.
Aprendeu com os pulsos que
Não vale mesmo a pena
Cortar os pulsos. Não quer
Engolir as pílulas do sono das Cinderelas.
Não quer afogar-se na angústia
Dos venenos instantâneos.
Pode ser que dê errado.
E se der errado? Eles chegarão
Sóbrios e sedentos: os desejos,
As culpas, as amarras e os remendos
Do amanhã. Só a sombra
De Yaszehim afaga o corpo
De Yaszehim. Só a sombra
Soçobra por ser a sombra
De Yaszehim. E tudo fede por não ser
Yaszehim. Pode ser que dê
Tudo errado. Como escarrar
O tédio entorpecente e seco
Nas quimeras do tempo, sem medo,
Se tudo der errado? Yaszehim sorri.

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