"Retratamento intensivo"
Todo poema tem pernas,
Perambula por aí,
Passeia, tonto tropeça,
Às vezes, foge de si,
Vadia, vagueia só,
Vagabundo, solto, bêbado,
Às vezes, fratura um osso,
Fêmur, fíbula, uma vértebra,
Ou surge com pé quebrado.
Todo poema tem braços
Rimados ou livres, laça
Vácuos, abraça metáforas,
Atira pedras, as asas
Inventa com as palavras,
Atiça-se , acena adeus.
Todo poema tem olhos
Vendados e bem abertos,
Flerta o que quer, quando quer
Cega, observa, mira, admira,
Penetra através das frestas
Das pupilas, feito luz,
Profundo, no olhar alheio,
Vasculha os nervos, os músculos,
Desvenda-se por ser único
E muitos, todos e tudo
E nada: pálpebras, prisma,
Ponte, precipício, lágrima.
Todo poema tem língua,
Boca, dentes, lábios, glote,
Grita, bebe, come, morde,
Fala, xinga, berra, cala,
Tem a voz aguda ou grave,
Vibra a fibra da garganta
De grafite da memória,
Das páginas apagadas
Do agora: diz o que diz.
Todo poema tem pênis,
Vulva, vagina, testículos,
Ovários, útero, trompas,
Excita e fica excitado,
Transa, masturba-se, goza,
Engravida, aborta, pare.
E como rejuvenesce,
Ninguém consegue explicar.
Alma? Se há, sabe-se lá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário