"Solidão" - Para Péricles Cavalcanti
Renasce o poema.
Tudo é solúvel.
Tudo é solene.
Tudo é sofrível.
Tudo é sortido.
Tudo é sonante.
Tudo é soberbo.
Tudo é sorvido.
Tudo é somado.
Tudo é soturno.
Tudo é sonhado.
O poeta é só.
terça-feira, 30 de dezembro de 2008
segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "Útero" - Para Arnaldo Antunes.
"Útero"- Para Arnaldo Antunes
O poeta é nada.
Tudo é sagrado.
Tudo é silêncio.
Tudo é sorvido.
Tudo é secreto.
Tudo é salubre.
Tudo é sonhado.
Tudo é saudade.
Tudo só sangra.
O poema nasce.
O poeta é nada.
Tudo é sagrado.
Tudo é silêncio.
Tudo é sorvido.
Tudo é secreto.
Tudo é salubre.
Tudo é sonhado.
Tudo é saudade.
Tudo só sangra.
O poema nasce.
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sábado, 27 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "À vida, vasta cova" - Para Eric Liddel
"À vida, vasta cova" - Para Eric Liddel
O que está só por vir,
Por que queremos tanto?
Um novo ano chegando,
Por amor ao devir?
As cruzes do amanhã,
Em breve, nascerão.
Que espera o coração?
Das deusas artesãs,
Um novo ano, sim, vem.
Trazendo duras-novas,
Move-se como nuvem
E nada mais comprova.
Por que tudo convém
À vida, vasta cova?
O que está só por vir,
Por que queremos tanto?
Um novo ano chegando,
Por amor ao devir?
As cruzes do amanhã,
Em breve, nascerão.
Que espera o coração?
Das deusas artesãs,
Um novo ano, sim, vem.
Trazendo duras-novas,
Move-se como nuvem
E nada mais comprova.
Por que tudo convém
À vida, vasta cova?
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terça-feira, 23 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "Máquina poética" - Para José Mariano Filho
"Máquina poética" - Para José Mariano Filho
Não acorda.
À porta da madrugada,
Está desperta
Para o agora,
Desde a Criação.
Sempre pronta
Para o vácuo
Dinâmico da palavra,
A palavra-pólvora,
A palavra-prótese,
Sem trauma,
Sem treva,
Sem trégua.
As suas roldanas,
Os seus ruídos,
Sua roda-viva,
Não seguem leis,
Pouco ponderam.
Os seus parafusos
Soltos, vis vassalos
Do devir,
Sorvem só
O seu ofício: sacrifício
De formas
Disformes
Que devem nascer
Sob o fórceps
Do nada.
Sua engrenagem
Grita,
A vida varre,
Morde a morte
E cansaço ( de que
É feito o seu aço,
Não se sabe)
Não se vê.
A sua alma
Não soa alarme,
Pisca vaga-lume,
Coaxa sapo,
Badala sino,
Mas sangra,
Toda manhã,
Poesia viva
Que não coagula.
Nunca dorme.
Não acorda.
À porta da madrugada,
Está desperta
Para o agora,
Desde a Criação.
Sempre pronta
Para o vácuo
Dinâmico da palavra,
A palavra-pólvora,
A palavra-prótese,
Sem trauma,
Sem treva,
Sem trégua.
As suas roldanas,
Os seus ruídos,
Sua roda-viva,
Não seguem leis,
Pouco ponderam.
Os seus parafusos
Soltos, vis vassalos
Do devir,
Sorvem só
O seu ofício: sacrifício
De formas
Disformes
Que devem nascer
Sob o fórceps
Do nada.
Sua engrenagem
Grita,
A vida varre,
Morde a morte
E cansaço ( de que
É feito o seu aço,
Não se sabe)
Não se vê.
A sua alma
Não soa alarme,
Pisca vaga-lume,
Coaxa sapo,
Badala sino,
Mas sangra,
Toda manhã,
Poesia viva
Que não coagula.
Nunca dorme.
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segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "Queda d' alma" - Para a minha amada mãe.
"Queda d' alma" - Para a minha amada mãe
Dessa
Vez,
Não
Foi
Uma
Lágrima.
Dessa
Vez,
Não
Foi
Só
O
Sangue.
Do
Ver-
So
Jorra a
Minha
Alma.
Dessa
Vez,
Não
Foi
Uma
Lágrima.
Dessa
Vez,
Não
Foi
Só
O
Sangue.
Do
Ver-
So
Jorra a
Minha
Alma.
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sábado, 20 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "Res Est Magna Tacere"
"RES EST MAGNA TACERE"
(expressão latina que significa "calar-se é uma grande coisa"; está na obra "Epigrammata"- IV,80 de Marcus Valerius Martialis)
Seria interessante se pudéssemos saborear todas essas guloseimas que se encontram em cima da mesa de Sinhá, esses brigadeiros, essas surpresas de uva, esses docinhos de coco, os bem-casados, as torteletes, os cajuzinhos, infinitas obras-primas de delicadeza e formas, cores e odores. Os salgadinhos são dádivas, e os nossos sentidos se perdem nesse emaranhado de cheiros, imagens e arquiteturas. É a Festa da Padroeira da Cidade, e Dona Sinhá sabe que tudo tem que ficar impecável. Santo que é Santo numa hora dessas não conhece perdão e é até mesmo capaz de castigar os negligentes.
Todo ano, a cozinha de Sinhá vira um tumulto, um arrastão, uma festa dentro de outra festa, um vai-e-vem de panelas, talheres, formas, mãos, massas, recheios. A meninada vez ou outra arrisca pedir as panelas para uma boa lambida ou, à socapa, furtar um docinho. Sinhá é pura pletora de satisfação e êxtase. Prometera a Padroeira que faria, ano após ano, esse banquete para a comunidade onde mora porque, outrora, fora abençoada com a graça de ficar curada de uma ferida, uma úlcera na perna. Uns diziam que era diabetes, outros amedrontavam a coitada de Sinhá dizendo que era o tal do "cansu", que era pereba de macumba, enfim, só entristeciam a velha Sinhá. A cura veio como bálsamo, e a promessa é paga com a moeda da devoção.
Cansaço não se vê em sua face suada. O calor do forno e do fogão é que aquece o seu corpo e faz vibrar a sua alma. A decoração de cada deliciosa sobremesa é ímpar, como se cada peça fosse feita para um anjo ou para um deus. Às vezes, ela para, senta-se, pensa, sonha, lembra-se de tudo que passou, de todas as suas investidas para curar a danada da ferida, dos gritos de dor, da coceira infernal, do pus, dos curativos, da imensidão de caixas de antibióticos e antiinflamatórios, das rezas, dos alvoroços. Depois, retorna às atividades, sorridente e cheia de si, dona do pedaço.
Sinhá era uma pecadora comedida. Tinha lá os seus pecados íntimos, seus desejos secretos e mundanos, seus sonhos de mulher casada. A idade agora não lhe permite tais astúcias, mas quando o fogo das vontades carnais eram chamas gigantescas, o seu clitóris via em Zé das Trincas o amante ideal. Fez agorinha mesmo o sinal da cruz para esquecer o obsoleto sentimento que a envolvera no passado. Teme que a ferida reapareça. Tarefa cumprida. O banquete brevemente será servido.
O banho de Sinhá sempre lhe proporciona um momento único, corporal, de reflexão, de sentir como o tempo fez com que o seu corpo envelhecesse, com que os seus cabelos ficassem cobalto, suas mamas despencassem como se pulassem da Torre de Pisa numa tentativa de suicídio. Ela compreendia o desperdiçar de energias na luta que travou contra a amaldiçoada ferida. Perdera a sensualidade, o balançar das ancas, o sorriso lânguido, o olhar de quem está perdidamente à procura de prazer e gozo. O sabonete não desliza normalmente mais.
Quando estava enxugando as pernas para pôr as suas meias elásticas, Sinhá teve um susto, parecia que o mundo estava chegando à curva final, que se apagariam as luzes. Lá, quieta, tímida, brilhante, querendo vingar, vermelhinha de força e desejo, está a feridinha, como se tivesse dormido o sono das ursas polares, como se, voltar a existir perceptível, desse-lhe mais alegria. Sinhá era pavor e receio, frustração e culpa, decepção e mágoa, fé e descrença, rancor e esperança. Mexe aqui, cutuca ali, passa a mão, pega o espelho, alisa, põe pomada, faz o sinal da cruz em cima da ferida, veste a meia e sai.
Que se passa na cabeça de Sinhá nesse momento? Que dúvida ou vontades cercam a sua alma? Será que ela ainda crê na Padroeira ou toda a sua fé se desmanchou feito o chocolate há pouco na panela? E Zé das Trincas voltará ao seu coração e a fazer parte das tentações e dos pecados? Sinhá parte acompanhada por um bando de mulheres, filhas, amigas, empregadas e vizinhas, com todo o aparato comestível, para a festa que se concretiza na pracinha, onde a igreja da Padroeira mantém estadia. Sorri ubiquamente como se a vida lhe enviasse mais um século de eternas graças. Sinhá não é mais a mesma.
Uma catarse de ânimo e gana abraçou fortemente o seu espírito e todos os pensamentos mesquinhos e ridículos evaporaram de sua mente. Nada seria capaz de impedir que a sua promessa fosse quebrada. Nem mesmo Zé das Trincas! Esse aí acaba de cruzar com Sinhá que o cumprimenta, e ela age como se nunca tivessem sequer trocado olhares. A molecada grita pedindo docinhos, e ela dá um, dois, três... E muitas outras crianças se juntam ao grupo e agarram-se à saia de Sinhá, apelando para serem atendidas. A Festa da Padroeira é Sinhá em festa. A ferida não teve força suficiente para dilacerar a paz de Sinhá.
Se não fossem as suas netas choramingando para irem dormir, Sinhá bem que amanheceria no corre-corre da festança. Pronta para despir-se, olhou para o marido e percebeu que o amava muito. Seu João do Brejeiro era um coma. Devia estar sonhando com o tempo em que caçava rolinha, com espingarda de chumbinho, nas roças do pai. A noite estava bastante fria, e Sinhá só faltava retirar as meias. Não teve receio de nada, desceu as duas de uma vez, passou o seu creme para as varizes, orou e outra assombração tomou forma em seu ser: não havia sinais de infecção, ferida, tumor, absolutamente nada. Sorriu.
Deitou-se bem ao ladinho do seu marido e agarrou-o com os braços e as pernas, formando um arco. Sabia que a sua Padroeira não iria abandoná-la. Queria pensar umas delícias de tentações e pecadozinhos leves, mas se proibiu inteiramente, não naquela noite, não depois de todo o medo e prova de que os céus estão vigiando as pessoas, não depois de ganhar mais um dia de bênção e perdão. O padre da comunidade até hoje não entende o porquê de Sinhá nunca ter ido às missas da igreja.
(expressão latina que significa "calar-se é uma grande coisa"; está na obra "Epigrammata"- IV,80 de Marcus Valerius Martialis)
Seria interessante se pudéssemos saborear todas essas guloseimas que se encontram em cima da mesa de Sinhá, esses brigadeiros, essas surpresas de uva, esses docinhos de coco, os bem-casados, as torteletes, os cajuzinhos, infinitas obras-primas de delicadeza e formas, cores e odores. Os salgadinhos são dádivas, e os nossos sentidos se perdem nesse emaranhado de cheiros, imagens e arquiteturas. É a Festa da Padroeira da Cidade, e Dona Sinhá sabe que tudo tem que ficar impecável. Santo que é Santo numa hora dessas não conhece perdão e é até mesmo capaz de castigar os negligentes.
Todo ano, a cozinha de Sinhá vira um tumulto, um arrastão, uma festa dentro de outra festa, um vai-e-vem de panelas, talheres, formas, mãos, massas, recheios. A meninada vez ou outra arrisca pedir as panelas para uma boa lambida ou, à socapa, furtar um docinho. Sinhá é pura pletora de satisfação e êxtase. Prometera a Padroeira que faria, ano após ano, esse banquete para a comunidade onde mora porque, outrora, fora abençoada com a graça de ficar curada de uma ferida, uma úlcera na perna. Uns diziam que era diabetes, outros amedrontavam a coitada de Sinhá dizendo que era o tal do "cansu", que era pereba de macumba, enfim, só entristeciam a velha Sinhá. A cura veio como bálsamo, e a promessa é paga com a moeda da devoção.
Cansaço não se vê em sua face suada. O calor do forno e do fogão é que aquece o seu corpo e faz vibrar a sua alma. A decoração de cada deliciosa sobremesa é ímpar, como se cada peça fosse feita para um anjo ou para um deus. Às vezes, ela para, senta-se, pensa, sonha, lembra-se de tudo que passou, de todas as suas investidas para curar a danada da ferida, dos gritos de dor, da coceira infernal, do pus, dos curativos, da imensidão de caixas de antibióticos e antiinflamatórios, das rezas, dos alvoroços. Depois, retorna às atividades, sorridente e cheia de si, dona do pedaço.
Sinhá era uma pecadora comedida. Tinha lá os seus pecados íntimos, seus desejos secretos e mundanos, seus sonhos de mulher casada. A idade agora não lhe permite tais astúcias, mas quando o fogo das vontades carnais eram chamas gigantescas, o seu clitóris via em Zé das Trincas o amante ideal. Fez agorinha mesmo o sinal da cruz para esquecer o obsoleto sentimento que a envolvera no passado. Teme que a ferida reapareça. Tarefa cumprida. O banquete brevemente será servido.
O banho de Sinhá sempre lhe proporciona um momento único, corporal, de reflexão, de sentir como o tempo fez com que o seu corpo envelhecesse, com que os seus cabelos ficassem cobalto, suas mamas despencassem como se pulassem da Torre de Pisa numa tentativa de suicídio. Ela compreendia o desperdiçar de energias na luta que travou contra a amaldiçoada ferida. Perdera a sensualidade, o balançar das ancas, o sorriso lânguido, o olhar de quem está perdidamente à procura de prazer e gozo. O sabonete não desliza normalmente mais.
Quando estava enxugando as pernas para pôr as suas meias elásticas, Sinhá teve um susto, parecia que o mundo estava chegando à curva final, que se apagariam as luzes. Lá, quieta, tímida, brilhante, querendo vingar, vermelhinha de força e desejo, está a feridinha, como se tivesse dormido o sono das ursas polares, como se, voltar a existir perceptível, desse-lhe mais alegria. Sinhá era pavor e receio, frustração e culpa, decepção e mágoa, fé e descrença, rancor e esperança. Mexe aqui, cutuca ali, passa a mão, pega o espelho, alisa, põe pomada, faz o sinal da cruz em cima da ferida, veste a meia e sai.
Que se passa na cabeça de Sinhá nesse momento? Que dúvida ou vontades cercam a sua alma? Será que ela ainda crê na Padroeira ou toda a sua fé se desmanchou feito o chocolate há pouco na panela? E Zé das Trincas voltará ao seu coração e a fazer parte das tentações e dos pecados? Sinhá parte acompanhada por um bando de mulheres, filhas, amigas, empregadas e vizinhas, com todo o aparato comestível, para a festa que se concretiza na pracinha, onde a igreja da Padroeira mantém estadia. Sorri ubiquamente como se a vida lhe enviasse mais um século de eternas graças. Sinhá não é mais a mesma.
Uma catarse de ânimo e gana abraçou fortemente o seu espírito e todos os pensamentos mesquinhos e ridículos evaporaram de sua mente. Nada seria capaz de impedir que a sua promessa fosse quebrada. Nem mesmo Zé das Trincas! Esse aí acaba de cruzar com Sinhá que o cumprimenta, e ela age como se nunca tivessem sequer trocado olhares. A molecada grita pedindo docinhos, e ela dá um, dois, três... E muitas outras crianças se juntam ao grupo e agarram-se à saia de Sinhá, apelando para serem atendidas. A Festa da Padroeira é Sinhá em festa. A ferida não teve força suficiente para dilacerar a paz de Sinhá.
Se não fossem as suas netas choramingando para irem dormir, Sinhá bem que amanheceria no corre-corre da festança. Pronta para despir-se, olhou para o marido e percebeu que o amava muito. Seu João do Brejeiro era um coma. Devia estar sonhando com o tempo em que caçava rolinha, com espingarda de chumbinho, nas roças do pai. A noite estava bastante fria, e Sinhá só faltava retirar as meias. Não teve receio de nada, desceu as duas de uma vez, passou o seu creme para as varizes, orou e outra assombração tomou forma em seu ser: não havia sinais de infecção, ferida, tumor, absolutamente nada. Sorriu.
Deitou-se bem ao ladinho do seu marido e agarrou-o com os braços e as pernas, formando um arco. Sabia que a sua Padroeira não iria abandoná-la. Queria pensar umas delícias de tentações e pecadozinhos leves, mas se proibiu inteiramente, não naquela noite, não depois de todo o medo e prova de que os céus estão vigiando as pessoas, não depois de ganhar mais um dia de bênção e perdão. O padre da comunidade até hoje não entende o porquê de Sinhá nunca ter ido às missas da igreja.
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quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "A voz do poeta"
"A voz do poeta"
Grácil alegria
Da incontida lida.
Tudo abrigaria...
A gasta memória, a
Secreta saída, a
Astúcia ilusória,
O que o amor projeta.
Que vibre e se acenda
A admirável chama
Do que se proclama,
Que em si transcenda,
A voz do poeta!
Grácil alegria
Impõe-se eruptiva
Agora, à derivaDa incontida lida.
Tudo abrigaria...
A gasta memória, a
Secreta saída, a
Astúcia ilusória,
O que o amor projeta.
Que vibre e se acenda
A admirável chama
Do que se proclama,
Que em si transcenda,
A voz do poeta!
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segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
Adriano Nunes: "Apenas possíveis"
"Apenas possíveis"
O meu coração
Ainda se prende
Ao poema. Tende
A ver que só são
Apenas possíveis
Essas inconfessas
Pancadas às pressas.
Os nítidos níveis
Desses vingativos
Versos são divinos.
Meço meus motivos:
Sou mesmo menino
Nesta Arte. Cativo
Do caos repentino.
O meu coração
Ainda se prende
Ao poema. Tende
A ver que só são
Apenas possíveis
Essas inconfessas
Pancadas às pressas.
Os nítidos níveis
Desses vingativos
Versos são divinos.
Meço meus motivos:
Sou mesmo menino
Nesta Arte. Cativo
Do caos repentino.
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quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Adriano Nunes: "Aquisição fabulosa" - Para João Cabral de Melo Neto.
"Aquisição fabulosa" - Para João Cabral de Melo Neto
Lapidar o poema.
Lançá-lo limpo à língua,
Sem o peso do vácuo.
Palavra por palavra,
Sem prematura pressa.
Palavra por palavra,
Sem proezas supérfluas.
Palavra por palavra,
Sem pretensões precárias.
Para depois de pronto,
Aos deuses, devolvê-lo,
Sem o peso do véu.
Lapidar o poema.
Lançá-lo limpo à língua,
Sem o peso do vácuo.
Palavra por palavra,
Sem prematura pressa.
Palavra por palavra,
Sem proezas supérfluas.
Palavra por palavra,
Sem pretensões precárias.
Para depois de pronto,
Aos deuses, devolvê-lo,
Sem o peso do véu.
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sábado, 1 de novembro de 2008
Adriano Nunes: "Soneto IV" - Para Péricles Cavalcanti.
"Soneto IV" - Para Péricles Cavalcanti
O pensamento
Pesa o poema.
Por que supõe
Ser assim leve
Como uma pena?
Por que sequer
Nada pondera
Ou principia?
O pensamento
É mesmo cego.
Por que não vê
Que só o poema
Tudo suporta,
Tudo sustenta?
O pensamento
Pesa o poema.
Por que supõe
Ser assim leve
Como uma pena?
Por que sequer
Nada pondera
Ou principia?
O pensamento
É mesmo cego.
Por que não vê
Que só o poema
Tudo suporta,
Tudo sustenta?
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sexta-feira, 31 de outubro de 2008
Adriano Nunes: "Soneto VIII"
"Soneto VIII"
Quando te vejo, tudo vibra,
Minha vida, todo universo.
Parece que nada mais quero.
É como se perdesse a fibra.
Depois, o meu mundo é desfeito,
Mas permanece tua imagem.
Eu nunca sei por que interagem
Os sonhos dentro do meu peito.
Mesmo confuso, não te busco
Nas batidas do coração.
Quando banido desse brusco
Desejo da minha visão,
Quase pára. Tudo rebusco
Na minha alma: que solidão!
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domingo, 19 de outubro de 2008
Adriano Nunes: "Inconfidente"
"Inconfidente"
lutava por algo possível.
bra
ços
per
nas
mãos
pés
expostos sob a luz dos postes.
pe
da
ços
do
bra
sil
enforcaram o homem ali.
ca
be
ça
tron
co
membros
minas: tudo findava abril.
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sábado, 18 de outubro de 2008
Adriano Nunes: "À noite" - Para Carlos Drummond de Andrade
"À noite" - Para Carlos Drummond de Andrade
À noite,
Penso os versos.
Às vezes,
Nada mais quero.
Então,
Quase absorto
Decido dormir, mas
Aqui
Vinga o indivisível:
Abro um livro...
À noite,
Sinto estar comigo.
Às vezes,
Reinam regra e ritmo.
À noite,
Penso os versos.
Às vezes,
Nada mais quero.
Então,
Quase absorto
Decido dormir, mas
Aqui
Vinga o indivisível:
Abro um livro...
À noite,
Sinto estar comigo.
Às vezes,
Reinam regra e ritmo.
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Adriano Nunes: "O poema"
"o poema"
papel tinta
quase mundo
quântico universo
quase vácuo
o poema
sempre tudo.
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Adriano Nunes: "Dar-se ao infinito"
Adriano Nunes: "Dar-se ao infinito"
Cora-se de
Azul o cosmo.
Da chuva à chama,
Acha-se o ver
Verde e amarelo,
O sol a pino,
As novas nuvens,
Manto-algodão.
Fósforo aceso...
Alto revoa a
Ave, no avião
Pousa o chão, Sísifos.
Ponte e promessa e
Prisma e projeto e
Primeira aurora
Para despir-se
Do agora: glosa
E mote e moda
E modo e moto-
Contínuo e música.
O coração...
Ele não sabe
Desse querer
Dar-se ao infinito.
Cora-se de
Azul o cosmo.
Da chuva à chama,
Acha-se o ver
Verde e amarelo,
O sol a pino,
As novas nuvens,
Manto-algodão.
Fósforo aceso...
Alto revoa a
Ave, no avião
Pousa o chão, Sísifos.
Ponte e promessa e
Prisma e projeto e
Primeira aurora
Para despir-se
Do agora: glosa
E mote e moda
E modo e moto-
Contínuo e música.
O coração...
Ele não sabe
Desse querer
Dar-se ao infinito.
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quinta-feira, 16 de outubro de 2008
Adriano Nunes: "Enlatado"
ENLATADO
CONS)C(ERVA
DORR(I)ETOS
ÂNGU)R(LOSI
GUAI(C)SQUA
TROL)U(ADOS
QUAT(L)RORE
TRÓG)A(RADO
QUAD(R)RADO
CONS)C(ERVA
DORR(I)ETOS
ÂNGU)R(LOSI
GUAI(C)SQUA
TROL)U(ADOS
QUAT(L)RORE
TRÓG)A(RADO
QUAD(R)RADO
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terça-feira, 14 de outubro de 2008
Adriano Nunes: "Entrave"
"Entrave"
E eu que sustentava
O peso das tuas manias,
Que suportava calado
Todos os teus devaneios,
Que faço agora?
Que farei
Da cama e dos livros,
Depois? Como maliciar
As minhas fraquezas de
Menino
Perdido?
Como fecharei a porta
Dos fundos?
Não mais terei coragem
De apagar as luzes?
Os demônios
Da solidão,
Como exorcizarei?
Os meus sonhos
Por quais campos de intrigas
Andarão?
As minhas dúvidas
Que farão
Das horas
Quando descobrirem
Que já foste
Embora?
E eu que achava
Que eras só um poema
À-toa.
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quarta-feira, 8 de outubro de 2008
Adriano Nunes: Crítica musical de "Maré" de Adriana Calcanhotto
Crítica musical: "Maré" – Adriana Calcanhotto
por Adriano Nunes
que faz um artista retomar um tema e conduzi-lo à máxima
experiência, a retoques implacáveis e sutis, a uma peneira, um filtro?
maturidade. sim, amadurecimento – mar de cimento – firme mar de ondas criativas
que vão-e-vêm cada vez melhores, cada vez mais querendo roçar a tez da areia –
a praia nua da boa música. e a praia de adriana calcanhotto é a sua música.
ao encerrar o cd “a fábrica do poema” com a décima quinta
canção intitulada “minha música”, a cantora e compositora adriana calcanhotto
diz em seus últimos versos: “minha música quer só ser música: minha música não
quer pouco.”
talvez, à época desse disco, calcanhotto não tivesse noção de
que a inspiração, o seu dom, a sua racionalidade, a sua sensibilidade, a sua
música trariam à tona uma maré cheia de pérolas, sereias, portos, segredos,
mulheres, saídas... para lá: três! sim, uma trilogia, não obrigatória, mas um
passo (ou uma braçada? ou um mergulho?) para alcançar o esplendor-reflexo do
seu canto marítimo.
“maré” é o novo cd de adriana calcanhotto. é uma sequência
tardia, pensada, cristalina e bela, do seu cd "maritmo". se neste é o
paragolé que impera, naquele é o azul em linhas desconexas, em areia azul
turquesa, mulher sem razão: sereia. assim é “maré”, álbum dedicado ao poeta
baiano waly salomão, amigo e companheiro de composições.
a música de abertura e que dá nome ao cd, composta por
adriana e moreno veloso, remete-nos à expectativa do que virá a ser esse mar
poético e deliciosamente musical que a autora pretende que nós, ouvintes,
críticos, fãs de música e poesia, naveguemos: “o mar se dá como imagem” ou
“será só linguagem”? são os violões de adriana e de moreno as ondas que ecoam
pelas batidas de domenico lancellotti. aqui o mar não é para tragédias ou
descasos; é para o azul do céu, para as esperanças, para as notas que emergem e
mergulham como golfinhos.
“seu pensamento” composta por dé palmeira e adriana
calcanhotto traduz o ceticismo da compositora para lugares além-mar, sólidos,
firmes – “pés na pedra”, “estacionamento”, “na terra”, “areia”, “apartamento"
– onde? – movidos poeticamente pelo “vento no cabelo” e pelas “voltas na
terra”. como não pensar nos cellos de moreno veloso e no piano elétrico de
kassim?
a música “três” dos marítimos irmãos marina lima e antonio
cicero antecipa o encantamento das sereias. seus compositores presentearam o cd
com uma canção bem dilacerante – nossa alma parece ser fisgada por uma das três
tentativas harmônicas de expressar o mar ali oculto: “o sol”, “naufragar” e
terminando “ao mar”. “três” é boa demais!
eis que começa “porto alegre", criada por péricles
cavalcanti para homenagear a cidade natal de adriana calcanhotto. alegre,
musicalmente envolvente, popular, sem preconceitos, mitológica: a estória de
ulisses, envolvida pelo ritmo calipso, ao partir da ilha de ea onde reside a
feiticeira circe, para cruzar com as sereias – “amarrado num mastro, tapando as
orelhas”. ficar atento aos poderosos cantos da encantadora sereia marisa monte.
as batidas leves e soltas do violão de adriana e o arranjo de
metais de rodrigo amarante transformam “mulher sem razão” no divisor de águas
melódicas do disco. feita por dé, bebel gilberto e cazuza (o poeta gravou esta
canção em seu disco burguesia – faixa 11), “mulher sem razão” é um liame que
faz de “maré” uma sequência-corpo de “maritmo”, já que neste há a belíssima
canção “mais feliz” do trio mais feliz e sem razão.
a partir daí, o disco projeta o lado intimista e poético –
diga-se de sua admiração pela poesia – da cantora: “teu nome mais secreto”
possui fragmentos do poema “madeiras do oriente” de waly salomão (de “pescados
vivos”, editora rocco, pg. 55) – são as “grutas ignotas” ou conchas do mar?
e o momento segue com “sem saída” de cid campos e augusto de
campos, “para lá” de adriana e arnaldo antunes – pura poesia: o mar ganha
dimensões incalculáveis; entretanto, deve ser explorado todo o seu infinito.
kassim e torquato neto nos brindam com a doce “um dia desses”
e “onde andarás” de caetano veloso e ferreira gullar é re-encontrada intacta
pela escafandrista adriana calcanhotto. o cd está prestes a acabar e a viagem
pelo “sargaço mar” de dorival caymmi só nos indica agora que direção tomar:
ouvir tudo novamente como se fosse a chance enigmática de encontrar a pérola,
ali, escondida na ostra acústica.
produzido por arto lindsay e adriana calcanhotto, “maré” é,
sem dúvida, o melhor lançamento do ano em música: marmorável!
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segunda-feira, 6 de outubro de 2008
Adriano Nunes: "Aniversário" - Para Antonio Cicero (pelo seu dia!)
"Aniversário" - Para Antonio Cicero (pelo seu dia!)
não apagar as velas.
deixá-las acesas.
não cortar o bolo.
dá-lo – meu pedaço
para quê? o sol
não se reparte
e ilumina tudo.
apenas cantar-te!
amar-te,ó poeta,
o acontecimento
como vier.
assim é a arte.
balões, bardos, bares
presentes, ausentes,
memórias: mas quando
nós nascemos mesmo?
brotar do tempo
que já não sobra.
lembrar que ainda
há muito a fazer.
que fazer então
nesta tua hora
com o coração?
que outro prazer
sempre mais importa?
viver? criar?
tudo?
nada?
sonhar-te e beijar
a tua alma!
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segunda-feira, 22 de setembro de 2008
Adriano Nunes: "06 de agosto de 1945"
"06 de agosto de 1945"
o vácuo
assas-
sino
o nada
a que-
bra
do dna
a queima-
dura
na alma
a macabra
nuvem
de neutrinos
o calor
sorrindo
vindo de ci-
ma e caindo
desumana-
mente
sobre
hiroshima.
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Adriano Nunes: "O silêncio" - Para Cecília Meireles
"O silêncio" - Para Cecília Meireles
que nem o sexo
dos
anjos
que nem o nexo
de
augusto
que nem o plexo
do
braço
que nem o quanto
de
tudo
que nem o traço
do
espelho
que nem a traça
do
entulho
que nem o truque
da
caixa
que nem a troca
de
vícios
que nem a pedra
de
drummond
que nem o podre
da
alegria
que nem o padre
do
sermão
que nem o pranto
do
poeta
que nem o som
da
raiva
que nem o sim
da
noiva
que nem o cem
do
século
que nem o san-
to
remédio.
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Adriano Nunes:"Isca"
"Isca"
Ela está pronta para mergulhar
Um peixe
Um pequeno peixe
Um feixe além do olhar
Outro peixe
Outro pequeno peixe
Ou o eixo do desejo que há?
Ela está pronta para mergulhar
Outra isca
Outra aguerrida isca
Outra isca perdida
Outro anzol
Outro anzol preso ao que finda
Outra isca arisca
Ela está pronta para mergulhar
Um peixe ao menos
A mesma isca
Outra isca outra isca outra vida
A mesma metade da isca
Outro peixe pequeno
Um sapato velho
Sob o sol
Vinga outro verso
E o agora a alegria de tecê-lo fisga.
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domingo, 21 de setembro de 2008
ADRIANO NUNES: "Desamparo"
DESAMPARO
DEUSDECI
DASESOME
OUSEDESC
EATÉAQUI
NOPAPELE
TERMINAO
UNIVERSO.
DEUSDECI
DASESOME
OUSEDESC
EATÉAQUI
NOPAPELE
TERMINAO
UNIVERSO.
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ADRIANO NUNES: "Frêmito"
FRÊMITO
SO ( NOS( DES
( EM
MIM )F
AÇO )SO
)NHO
EM( DES( NÃO(
O SO
M ) SE )FAZ
)NÓS
BE ( LÁ( EM(
SÓ( D
OR
ME ) O SOL
)SI ) R
EVER) RA
SO ( NOS( DES
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)NHO
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O SO
M ) SE )FAZ
)NÓS
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SÓ( D
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ME ) O SOL
)SI ) R
EVER) RA
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sábado, 20 de setembro de 2008
ADRIANO NUNES: "Adução"
ADUÇÃO
ASABRA
ÇOUSOA
SABRAÇ
OUSOAS
ABRAÇO
ASABRA
ÇOUSOA
SABRAÇ
OUSOAS
ABRAÇO
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ADRIANO NUNES: "Incerteza"
INCERTEZA
INCER
TATEZ
TALVE
ZAZUL
TREVA
INCER
TATEZ
TALVE
ZAZUL
TREVA
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Adriano Nunes: "Cisco"
"Cisco"
V I O N I R
A C L A C A
M S A I U Q
O C I T P O
A N I T E R
V I T R E O
C R I S T A
L I N O A Q
U O S O I R
I S C O R N
E A V O C E
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sexta-feira, 19 de setembro de 2008
Adriano Nunes: "Deleite" - Para Caetano Veloso
"Deleite" - Para Caetano Veloso
pescar
silen-
- cio -
sa-
mente
o sol.
amar o
santo –
canto no
canto
que se des-
pe. des-
prende-se
além
cá:
transamba.
servir
à língua
(léxica
leve
libé-
lula
louca
linda)
beijar o ver-
náculo:
ecoar
de lábios
glote
úvula.
pôr o seio
à flor
do âmago
ao meio.
do cacto
à luz
do mar
de araca-
ju à tez
do araçá
da lapa
à voz
de ca-
da eco
pondera
e rever-
bera:
concha
acústica
do caos.
dentro
o que
pensa
calha.
lavar
os pratos
e depois
ir – ou
rir? – ao
cinema
ver godard.
sol-
ta-se
e tu-
do ali
amplia.
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segunda-feira, 15 de setembro de 2008
Adriano Nunes: "Da vidraça"
"Da vidraça"
Eu observo a chuva
que cai.
Sinto a tentativa dela,
tão bela,
de chegar até a mim.
A tarde vai cinza
ficando.
As pombas se encolhem
e vão se alojando
como podem.
Eu, que nada posso
ou possuo, vou
sufocando um grito
de angústia
e desespero.
Da vidraça,
eu vejo
as minhas lágrimas
despencarem
do céu.
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Adriano Nunes: "CASULO"
"CASULO"
O OVO
A VEZ
O ÓVULO
A ÚVULA
( A VOZ )
OU VOCÊ VEM
OU OUVE
OU VOCÊ VÊ
OU VOA
( A VOZ )
A ÚVULA
O ÓVULO
A VEZ
O OVO
O OVO
A VEZ
O ÓVULO
A ÚVULA
( A VOZ )
OU VOCÊ VEM
OU OUVE
OU VOCÊ VÊ
OU VOA
( A VOZ )
A ÚVULA
O ÓVULO
A VEZ
O OVO
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domingo, 14 de setembro de 2008
Adriano Nunes:"Uma lágrima" - Para Cecília Meireles
"Uma lágrima"- Para Cecília Meireles
Sai
do meu coração
e vai
aos olhos,
mas
não me importo:
Depois cai
nas
profundezas
do seu
insólito
propósito.
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ADRIANO NUNES: "noitedia"
NOITEDIA
ANOITEODIA
ANOITEODIA
ANOITEODIAANOITEODIAANOITE
ANOITEODIAANOITE
ANOITE
ANOITEODIAANOITE
ODIA ODEIA
O TE
DI
O
ANOITEODIA
ANOITEODIA
ANOITEODIAANOITEODIAANOITE
ANOITEODIAANOITE
ANOITE
ANOITEODIAANOITE
ODIA ODEIA
O TE
DI
O
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Adriano Nunes: "Dona Adélia Prado"
"Dona Adélia Prado"
As coisas de casa.
Aquelas conversas familiares
Enfeitadas de sorrisos
E gritos e... Televisão ligada,
Cheiro bom de comida ainda
No fogo, alguém batendo
À porta, vizinha querendo
Panela, fósforo, óleo
Ou sei lá emprestado.
Só um pouco, dona Adélia,
Não é que o gás, mulher, acabou
Agorinha!
E tudo da vida...
A mesma vida que depois de tudo
Sempre nos põe lágrimas no âmago e
Poeira nos sentidos.
Virgem Maria!
Ri e transcendi:
“ CU É LINDO “.
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Adriano Nunes: "Cérbero"
"Cérbero"
Cérebro: o cão devasso do meu inferno.
Cérebro: o cão devasso do meu inferno.
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Adriano Nunes: "Água benta" - Para a minha mãe
"Água benta" - Para a minha mãe
Cai do céu, água.
E ao céu volta evaporada.
No extremo sul
e no extremo norte,
fica congelada.
Mas ainda assim é água.
Corre com os rios
e nas poças fica parada.
Às vezes, inodora,
incolor, insípida, outras
vezes turva, salgada,
contaminada.
Apesar de tudo ainda é água.
E quando brota
lá, na fonte da alma,
é que se percebe
o seu valor:
Agora é uma lágrima.
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sexta-feira, 12 de setembro de 2008
Adriano Nunes: "Κίρκη" - Para Antonio Cicero
Κίρκη
Para Antonio Cicero
Ouve-me, agora, tão bravo guerreiro:
À Grécia, tua glória, nunca tardes!
De tudo, que terás? Tantos alardes?
Ainda assim partindo, finca-te inteiro.
Cala-te e vai. Sereias? Talvez Arte
De encantar teus ouvidos, teu segredo.
Os meus versos marítimos, concedo
Para Antonio Cicero
Ouve-me, agora, tão bravo guerreiro:
À Grécia, tua glória, nunca tardes!
De tudo, que terás? Tantos alardes?
Ainda assim partindo, finca-te inteiro.
Cala-te e vai. Sereias? Talvez Arte
De encantar teus ouvidos, teu segredo.
Os meus versos marítimos, concedo
A ti - Sabes viver preso destarte?
Que poderá tal mar vivo, violento,
Se tudo pronto está para a partida
E o Destino veloz vem se movendo
Contra toda intempérie desta vida?
E qual engano, amando-te, não tenho?
Guarda-te. Não há dúvida devida!
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quinta-feira, 11 de setembro de 2008
Adriano Nunes: "Por Que Zé Matou Maria?"
"Por que Zé matou Maria?"
Chegada a hora, tudo deveria ser rápido e total. Aquela cadela vai me pagar! Porra, logo eu que a amava tanto! Bem que me avisaram. Bem que eu devia ter seguido os conselhos de Dona Santinha. Olha compadre, esse tipo de mulher eu conheço tanto quanto as rugas que tenho. Basta um arzinho de capricho, e você verá os desejos dela tomarem corpo e alma. Basta um galanteio e um assovio para que as carnes tremam, e a libido cresça feito capim. Não, comadre. A Senhora está enganada. Maria não fará nunca uma coisa dessa. Puta que pariu! E logo com o João! Logo com o meu amigo João! Dez em ponto. Peixeira na cintura. Taquicardia de quem está com medo ou vai arrepender-se logo. Um Pai-Nosso. Bandido também reza e faz toda encenação de alma boa. Droga! Oi, Zé! Por que não vem deitar, homem? Parece que viu um fantasma! Calma...
O dia amanheceu vermelho. Ei Zé, que pressa é essa? Hoje é dia de sinuca, viu. Vamos estar todos lá, no bar do Seu Serafim. João disse que vai apostar contigo duzentos contos. A vida tem dessas ciladas. Zé e João continuarão amigos. Ninguém soube do paradeiro de Maria. Dizem as más línguas que ela fugiu com Toninho para perto do mar. Dona Lila acha que ela foi embora, lá para a capital. Zé demonstra uma tristeza de abandono. Ninguém é feliz completamente. João ainda suspira quando se lembra das noites em que ele e Maria trepavam como bichos em desespero. Mas... E Maria? Por onde será que anda a danada? O quintal. Sim, o quintal. Lá está Maria deitada. Plácida, estática, pó. Desfigurada. Sem poesia. Sem João. Sem poder ver a luz do dia. Com os vermes a penetrarem em suas intimidades.
Corre Zé! Vem depressa! Maria ligou para Dona Santinha e disse que está arrependida e quer voltar, se você perdoá-la. Tudo já está resolvido. Dois tiros e só. Sangue para todo lado. O amor evoca certos demônios que a nossa desnatureza não sabe por que os compreende. Ou violentamente os vinga.
Maria chegou numa terça-feira. Era tarde. Chovia. João chorou de alegria e seu coração quase para. Zé gostava tanto dela que não se importava mais com os comentários ruidosos e cheios de treva. O amor enfim vencerá. A noite veio leve. João gozou em cima mesmo do púbis toda a sua força de homem que sabe mesmo como se faz uma noite valer a pena. Dois tiros! Meu Deus! Meu Deus! Que pesadelo terrível! Dois Pais-Nossos. Muitas desavenças e Ave-Marias.
Maria menstruara. O medo de estar grávida denunciaria sua traição. Zé tem gala rala. É “goro”. Todos sabem. Das três mulheres que já teve, nenhuma deixou a marca do seu suor como herança. Muita raiva. Muito sexo. Nada.
Sexta-feira. Meia-noite. Nenhum grito. Maria deixava de ter esperanças. Dizem que ela viajou para visitar umas tias num interiorzinho distante daqui. Bem que Dona Santinha tinha razão.
Chegada a hora, tudo deveria ser rápido e total. Aquela cadela vai me pagar! Porra, logo eu que a amava tanto! Bem que me avisaram. Bem que eu devia ter seguido os conselhos de Dona Santinha. Olha compadre, esse tipo de mulher eu conheço tanto quanto as rugas que tenho. Basta um arzinho de capricho, e você verá os desejos dela tomarem corpo e alma. Basta um galanteio e um assovio para que as carnes tremam, e a libido cresça feito capim. Não, comadre. A Senhora está enganada. Maria não fará nunca uma coisa dessa. Puta que pariu! E logo com o João! Logo com o meu amigo João! Dez em ponto. Peixeira na cintura. Taquicardia de quem está com medo ou vai arrepender-se logo. Um Pai-Nosso. Bandido também reza e faz toda encenação de alma boa. Droga! Oi, Zé! Por que não vem deitar, homem? Parece que viu um fantasma! Calma...
O dia amanheceu vermelho. Ei Zé, que pressa é essa? Hoje é dia de sinuca, viu. Vamos estar todos lá, no bar do Seu Serafim. João disse que vai apostar contigo duzentos contos. A vida tem dessas ciladas. Zé e João continuarão amigos. Ninguém soube do paradeiro de Maria. Dizem as más línguas que ela fugiu com Toninho para perto do mar. Dona Lila acha que ela foi embora, lá para a capital. Zé demonstra uma tristeza de abandono. Ninguém é feliz completamente. João ainda suspira quando se lembra das noites em que ele e Maria trepavam como bichos em desespero. Mas... E Maria? Por onde será que anda a danada? O quintal. Sim, o quintal. Lá está Maria deitada. Plácida, estática, pó. Desfigurada. Sem poesia. Sem João. Sem poder ver a luz do dia. Com os vermes a penetrarem em suas intimidades.
Corre Zé! Vem depressa! Maria ligou para Dona Santinha e disse que está arrependida e quer voltar, se você perdoá-la. Tudo já está resolvido. Dois tiros e só. Sangue para todo lado. O amor evoca certos demônios que a nossa desnatureza não sabe por que os compreende. Ou violentamente os vinga.
Maria chegou numa terça-feira. Era tarde. Chovia. João chorou de alegria e seu coração quase para. Zé gostava tanto dela que não se importava mais com os comentários ruidosos e cheios de treva. O amor enfim vencerá. A noite veio leve. João gozou em cima mesmo do púbis toda a sua força de homem que sabe mesmo como se faz uma noite valer a pena. Dois tiros! Meu Deus! Meu Deus! Que pesadelo terrível! Dois Pais-Nossos. Muitas desavenças e Ave-Marias.
Maria menstruara. O medo de estar grávida denunciaria sua traição. Zé tem gala rala. É “goro”. Todos sabem. Das três mulheres que já teve, nenhuma deixou a marca do seu suor como herança. Muita raiva. Muito sexo. Nada.
Sexta-feira. Meia-noite. Nenhum grito. Maria deixava de ter esperanças. Dizem que ela viajou para visitar umas tias num interiorzinho distante daqui. Bem que Dona Santinha tinha razão.
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quarta-feira, 10 de setembro de 2008
ADRIANO NUNES: "Roentgen"
ROENTGEN
O RADIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOPACO
RADIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOPAC
ADIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOPA
DIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOP
IOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIO
OTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADI
TRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERAD
RANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERA
ANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTER
NSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTE
SPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENT
PARENTERADIOPACORADIOTRANSPAREN
ARENTERADIOPACORADIOTRANSPARE
RENTERADIOPACORADIOTRANSPAR
ENTERADIOPACORADIOTRANSPA
NTERADIOPACORADIOTRANSP
TERADIOPACORADIOTRANS
ERADIOPACORADIOTRAN
RADIOPACORADIOTRA
ADIOPACORADIOTR
DIOPACORADIOT
IOPACORADIO
OPACORADI
PACORAD
ACORA
COR
O
O RADIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOPACO
RADIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOPAC
ADIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOPA
DIOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIOP
IOTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADIO
OTRANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERADI
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RANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTERA
ANSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTER
NSPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENTE
SPARENTERADIOPACORADIOTRANSPARENT
PARENTERADIOPACORADIOTRANSPAREN
ARENTERADIOPACORADIOTRANSPARE
RENTERADIOPACORADIOTRANSPAR
ENTERADIOPACORADIOTRANSPA
NTERADIOPACORADIOTRANSP
TERADIOPACORADIOTRANS
ERADIOPACORADIOTRAN
RADIOPACORADIOTRA
ADIOPACORADIOTR
DIOPACORADIOT
IOPACORADIO
OPACORADI
PACORAD
ACORA
COR
O
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Antonio Cicero: "Guardar" (Começo o blog em sua homenagem!)
Guardar é o primeiro livro de poemas de Antonio Cicero
(Vencedor na categoria poesia do Prêmio Nestlé de Literatura Brasileira 1997)
Antonio Cícero
"Guardar"
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.
Do que um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.
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ANTÔNIO CÍCERO,
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