quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Pablo Neruda: "El otro"

"El otro" - Pablo Neruda


Ayer mi camarada
nervioso, insigne, entero,
me volvió a dar la vieja envidia, el peso
de mi propia substancia intransferible.

Te asalté a mí, me asalta
a tí, este frío de cuchillo
cuando te cambiaría por los otros,

cuando tu insuficiencia se desangra
dentro de ti como una vena abierta
y quieres construirte una vez más
con aquello que quieres y no eres.

Mi camarada, antiguo
de rostro como huella de volcán,
cenizas, cicatrices
junto a los viejos ojos encendidos
(lámparas de su propio subterráneo):
arrugadas las manos
que acariciaron el fulgor del mundo
y una seguridad independiente,
la espada del orgullo
en esas viejas manos de guerrero.
Eso tal vez es lo que yo quería
como destino, aquello
que no soy yo, porque
constantemente cambiamos de sol,
de casa, de país, de lluvia, de aire,
de libro y traje,
y lo mío peor sigue habitándome,
sigo con lo que soy hasta la muerte?

Mi camarada, entonces,
bebió en mi mesa, habló tal vez, o tuvo
alguna de sus interrogaciones
duras como relámpagos
y se fue a sus deberes, a su casa,
llevándose lo que yo quise ser
y tal vez melancólico
de no ser yo, de no tener mis ojos,
mis ojos miserables.







"O outro" (tradução de Adriano Nunes) 




Ontem, meu camarada
nervoso, insigne, íntegro,
voltou a dar-me a velha inveja, o peso
de minha própria essência intransferível.

Assalte-te a mim, assalta-me
a ti, este frio de punhal
quando te alteraria pelos outros,
quando tua insuficiência se esvai
dentro de ti como uma veia aberta
e queres construir-te uma vez mais
com aquilo que queres e não és.

Meu camarada, antigo
de rosto como efígie de vulcão,
cinzas e cicatrizes
junto dos velhos olhos abrasados:
(lâmpadas de seu próprio subterrâneo),
enrugadas as mãos
que acariciaram o fulgor do mundo
e uma segurança independente,
a espada do orgulho
nessas veteranas mãos de guerreiro.
Isso talvez seja o que eu queria
como destino, aquele
que não sou eu, porque
constantemente mudamos de sol,
de casa, de país, de chuva, de ar,
de livro e traje,
e o pior de mim segue me habitando,
sigo co' aquilo que sou até a morte?

Meu camarada, então
bebeu em minha mesa, talvez falou, ou teve
alguma de suas dúvidas
duras como relâmpagos
e se foi a seus deveres, à casa,
levando aquilo que eu quisera ser
e talvez melancólico
de não ser eu, de não ter os meus olhos,
meus olhos miseráveis.










In: NERUDA, Pablo. "Defectos escogidos".

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