quinta-feira, 16 de julho de 2015

Adriano Nunes: "Antes do ser"

"Antes do ser"



Portanto, quando a minha formosura
Causava-te incontrolável loucura,
Insaciável eras, áurea Aurora,
Amavas-me sem fim. És fria agora!

 A cada branco pelo, a cada ruga
Na face que em mim vês, como me julgas
Envelhecido e feio! Mas, outrora,
Era o desejo ardente, a tua glória, 

 Pois, decerto, o mais belo homem tinhas,
Até chegaste a Zeus pedir a minha
Imortalidade, cega, deveras,
Por beleza que em mim não mais se atesta!

 Hoje, ainda te ouço, de amor tonto,
Chamando-me: Titono! Meu Titono!
Esqueceste-me! E a grácil juventude
Já não há. Como os amantes se iludem!

 Neste quarto lacrado, a Zeus imploro
Que me acalme o peito, seque meus olhos,
Liberte-me de mim, quebre as amarras,
E transforme-me em cantante cigarra.

Nenhum comentário: