quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Adriano Nunes: "ego"

"ego"


eu quer ser só mais do que eu
eu quer ser só mais do que
eu quer ser só mais do
eu quer ser só mais
eu quer ser só
eu quer ser
eu quer
eu
e
eu
eu não
eu não sei
eu não sei ser
eu não sei ser só
eu não sei ser só mais
eu não sei ser só mais um
eu não sei ser só mais um eu



Adriano Nunes

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Adriano Nunes: "Os homens violentos vêm com a Morte"

"Os homens violentos vêm com a Morte"


Os homens violentos vêm com o vento.
Eles não tardarão em chegar às portas
Do agora. A violência é a sua força.
São extremistas os homens violentos.

Eles não se aceitam e querem impor
Aos outros a sua funesta moral.
Apenas toleram o ser mesmo igual.
Nada se importam com o que vem do amor.

Os homens violentos vêm com a Morte.
Eles não tardarão em as cartas dar
Para que dúvidas não haja de que são
Os homens violentos, sem coração.

Em lares põem fogo, existências ceifam,
Sem quaisquer escrúpulos, sequer remorsos.
São feras em fúria que apostam no óbvio
As fichas últimas da persuasão.

Eles irão matar por amor ao ato
Em si: matar por matar. Eles matarão
Inúmeros cidadãs e cidadãos.
É esta forma de amar que sabem dar,

Enquanto queimam ou decaptam pessoas,
Enquanto atiram em vulneráveis alvos.
Eles, os monstros, a vida implodirão
E explodirão os prédios tidos pagãos.

Os homens violentos vêm do grã fracasso
Humano, das ambições mais funestas...
Eles não tardarão em chegar às frestas
Dos sentidos para logo aniquilá-los.

A violência total é o que só soa.
Símiles a Aquiles, homens violentos
São. Herdeiros da Vingança e do Terror,
Querem apenas a vez e a voz ter não.

Eles, os do Báratro Infinito, odeiam
As verdades das Ciências e dos fatos.
Seres violentos não sabem perder,
Já não sabem do perdão. Saber por quê?

Os homens violentos no mundo estão.
Para eles, a existência é dicotômica:
O lado dos adversários é o errado.
São bárbaros de distorcida visão.

Filhos de tradições, de ideologias,
Os homens violentos querem robôs
Fazer de todos, por poder e prazer.
Eles temem o que a alegria engendrou.

Os homens violentos vêm com o Tempo.
Eles não tardarão em chegar às portas
Das Leis. A violência é o seu princípio.
Tiranos os homens violentos são.


Adriano Nunes

Adriano Nunes: "normalidade" - para Marielle

"normalidade" - para Marielle


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Adriano Nunes: "Quando iremos chegar lá?"

"Quando iremos chegar lá?"


Eu tenho os meus muitos medos.
Ontem eu roí as unhas
Porque tenho muitos medos.
As unhas crescer irão.
Os medos podem ou não
Aumentar. Sequer supunha
Que tantos medos eu tinha.
Quando as unhas têm tamanho
Que dê pra cortá-las, corto-as.
Medos não são algo à toa.
A liberdade também
Não é. Que nem minhas unhas,
Liberdades são cortadas.
Medo de perdê-las tenho.
Ah, quanta gente está presa
A desejos, a si mesma!
Ontem eu roí as unhas
Porque algum medo até tive.
Marielle era livre e
Morreu porque era livre.
Há quem não tolere quem
É livre, quem vive bem.
Boétie disse que já
Nascemos livres. Rousseau
Isso também depois disse.
Símile Kant afirmou.
Quando iremos chegar lá?
Ou será tudo crendice?
Minhas unhas crescerão.
Liberdades defendidas,
E pessoas libertadas -
Eis a regra mais sensata!
Tenho alguns medos, mas não
Tenho medo de sabê-los.
Eu sei que sou livre, mesmo
Quando o mundo grã prisão
Quer tornar-se. A Poesia,
Sim, não tem medo de nada.
A Poesia não tem
Medo mesmo de ninguém.
Contra o horror, versos à mão.


Adriano Nunes

Adriano Nunes: "A manhã que nasce"

"A manhã que nasce"


É quase manhã...
E a manhã se abre
Ao pensar. É mágico
O esperar manhãs!

Perante o anteparo
Do olhar já reparo
A manhã saltar
Do infinito báratro.

É clara a manhã.
"É manhã!" declara
O pensar. É claro
O pensar manhãs.

Oh, que instante raro
Ver morar no olhar
A manhã que nasce
Para todos os Fados!


Adriano Nunes

Adriano Nunes: "Do que dói fundo"

"Do que dói fundo"


Vem madrugada...
Eis o ruído
De existir mundo,
Quase silêncio,
Mistério imenso!

O que compor
Com os fragmentos
Do que dói fundo,
Do que mais arde
Pra tudo e nada?

Haverá isto
No pensamento
Apenas, tido
Qual grave amor,
Oh, furor mítico,

A mais sonhar-te?
Com quais vestígios
De ilusão pôr
A engendrar tempos
O sol da Arte?

Oh, verve alada,
Como agarrar-te
Intacta, dentro
Do acolhedor
Devir fecundo?

Já madrugada.
Este ruído
De sumos, mínimo,
Mesmo silêncio
Faz-se supor.


Adriano Nunes

Adriano Nunes: "ars poetica"

ars poetica


do in stante nasce
do in stante nasc m
do in stante nas ma
do in stante na mag
do in stante n magn
do in stante magna
do in stant magna f
do in stan magna fe
do in sta magna fel
do in st magna feli
do in s magna felic
do in magna felici
do i magna felicid
do magna felicida
d magna felicidad
magna felicidade


Adriano Nunes

Adriano Nunes: "Mishima" - para Gal Oppido

"Mishima" - para Gal Oppido


O infante sem ter ainda
Um brinquedo que possa engendrar
Uma existência distinta,
Outra existência
Que se faça plena no Outro.
Talvez, a mísera.
Talvez, a mítica.
Talvez, a mínima.

O falo próprio posto ao óbvio.
O toque tático.
O toque-espanto.
O toque quântico.
As coisas trágicas por detrás do prazer
- A máxima máscara - .
O gozo estético, o esperma-espelho.
Qualquer consciência à deriva.
Qualquer consequência à prima vista.
O cheiro da possibilidade do múltiplo.

O adulto pronto para as instruções de uso.
O quadro de Guido Reni,
mais que quadro,
Símbolo do ato futuro.
A relação íntima com a fotografia
Como se o Devir devesse seguir
Plástico, paralisado, capturado,
Ao menos, por um
Instante.
Como se tudo isso fugisse
Da alegoria.
O ser mais livre.

A tentativa irreprimida
De alcançar o Outro em si,
Os tantos Outros sem fim de toda a vida.
O falo liberto de leis, de ser
somente falo.
O falo liberto de ais, machucado.
O falo entregue à dor, fetichizado.
O falo sendo vácuo, semente soando.
O olhar a vagar pelos cantos...
O Teatro dos Acasos preparando a Morte.
A foice-flecha
- indiferente a tudo -
Decapta o momento absurdamente mudo.


Adriano Nunes