segunda-feira, 27 de julho de 2009

Adriano Nunes: "In locus" - Para Mário de Sá-Carneiro

"In locus" - Para Mário de Sá-Carneiro


Converso com as gavetas.
Paquero mesmo as paredes.
Os armários? Posso amá-los,

Sem medo. Movem-se os móveis
Pelo quarto. São só quatro
Horas da tarde e tudo arde,


Em segredo, sob silêncios.







domingo, 26 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Oligoego" - Para Dr. José Mariano Filho

"Oligoego" - para Dr. José Mariano Filho


Expor apenas poemas
Prematuros, pensamentos
Ainda indefesos, versos
Placentários, sem espíritos,
Sem reflexos, para quê,

Feito feto cianótico,
Sem choro, quase chocando,
Sem as tais linhas impressas
Do tempo, da gestação,
Sufocado pela pressa

Espessa, por esse sonho
De vir à luz, dando a face
À porrada, à roda-viva,
Enquanto, à tez do papel, 
Desesperado, vencido,

Um preguiçoso poeta?

Parafusos soltos, sumo
De conversa, esconderijo
De rimas, masturbações
Turbulentas -  as lembranças
Engessadas em meu cérebro -

Essas quimeras quebradas,
Essas metáforas frágeis,
As fórmulas desgastadas,
As estrofes repetidas,
Estradas sempre trilhadas...

Tinta destile esse tino;
Tela desfalque essa falta;
Forma deforme essa força;
Ego desgaste esse gozo;
Elo desloque esse calo;

Frase desfrute essa fresta;
Traço destrua essa treva;
Timbre destranque esse trinco;
Fala desfolhe esse laço;

Folha desfaça essa farsa!








sábado, 25 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Testamento"

"Testamento"


Tempo
Passa

Tempo
Pêndulo

Tempo
Plástico

Tempo
Pênsil

Tempo
Prêmio

Tempo
Plácido

Tempo
Prisma

Tempo
Pinto o

Tempo
Pasmo o

Tempo
Pássaro

Tempo a
Pressa o

Tempo
Pondo o

Tempo
Trânsito

Tempo
Trégua

Tempo
Triste

Tempo
Tendo o

Tempo
Traço o

Tempo
Trago o

Tempo
Trapo

Tempo
Tento o

Tempo
Passo a

Passo o
Tempo

Todo
Tempo

Tenso
Tempo

Templo
Túmulo

Tempo
Tudo

Para o
Tempo.







quarta-feira, 22 de julho de 2009

Adriano Nunes: "R i s c o'

"R i s c o"


E u
V i v o
D e n t r o
D a
C á p s u l a -
T e m p o, a-
T e n t o.

V e n ç o o
M e d o
D e
S e r
Q u e m 
M e
P e n s o. O

Q u e
S i n t o e
P e s o, o
Q u e
M i r o e
Q u e r o, 
V e r s o. E

T u d o à
P a r t e, 
A l t o
P r e ç o
P a g o,
P o r
S e r

U m
B a r d o.
R i s c o e
R e g r a, u m
R i n g u e: e o
 m a g o
R a s g o.

E m
M i m,
O
A t o,  i n-
T a c t o
F a z - s e
M á g i c o.

N a
P á g i n a
I n d a
A l v a,
V i n g a a 
H o r a
G r á v i d a

D a
V a s t a
D á d i v a,
D a
M é t r i c a
D a
M á x i m a,

S e m p r e,
Q u a n d o 
P a s s o
P e l a
P o n t e
D e
S o n h o e

L e v o à
L í n g u a
O
Ê x t a s e e m
Q u e a
L i d a
P o n h o.





segunda-feira, 20 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Memória"

"Memória"


Volto dos versos
Em convulsão.
Que vultos são
Esses dispersos


Em minha mente?
Que vozes vêm
Varando o além,
Tão de repente,


Amedrontando-me,
Apavorando-me,
Nessa manhã?


Por que não some,
De vez, seu nome,
Ó musa vã?




Poema inédito, postado pelo meu amigo Domingos da Mota em seu belo blog Fogo Maduro  em 16/07/2009.








sábado, 18 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Vida"

"Vida"


Vida: quase dada a
Quase tudo, fado
Indeterminado,
Quimera adorada,

Macondo, Eldorado,
Ítaca, Pasárgada,
Mágica emboscada...
Das Moiras,  legado

Legítimo, exato,
Quântico ultimato,
Homérica saga

Que mitos esmaga.
Ou que a paz propaga
No último ato.





sexta-feira, 17 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Incontesti"

"Incontesti"


Compreenda
Que o poema
Sequer pensa
Sequer pesa
Sequer tenta
Ter qualquer
Consciência

Compreenda
Que o poema
Sequer sente
Sequer serve
Sequer segue
Qualquer regra
Ou ciência

Nada deve
Ao papel
Nem ao lápis
Só se impregna
De sanguínea
Prece - o instante -
Tangencia

O infinito
Do que é dito
Nada prova
Nada quer
Nada prega
Tudo traga
Da alegria

Compreenda
Que o poema
Sequer sonha
Sequer sabe
Que quer ser
Sequer é
Vibra apenas

Não tem pressa
Leis dispensa
Não se prende à
Penitência
Do que pode
Ser só, brilha,
Cabe em si.








quinta-feira, 16 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Qualquer parte" - Para Nelson Ascher

"Qualquer parte" - Para Nelson Ascher


Qualquer ponte
Que me leve
Dessa neve
Para longe

Qualquer pista
Inventiva
Que me sirva
Que me assista

Qualquer traço
Do universo
Que atravesso
Se te abraço

Qualquer beijo
Dessa língua
(Sol do Lácio!)
Só desejo

Qualquer rumo
Qualquer parte
Que me farte
Desse sumo

Qualquer fenda
Qualquer fresta
Que ao que presta
Mais se estenda

Qualquer vida
Que me lace
Qualquer face
Concebida

Qualquer trilha
Que me trague
Que me afague
Porque brilha.




terça-feira, 7 de julho de 2009

Adriano Nunes: "ÁTOMO(GRAFIA)"

ÁTOMO(GRAFIA)











Observação: para ler o poema, clique na imagem!

domingo, 5 de julho de 2009

Adriano Nunes: "Calos" - Para Marlos Barros

"Calos" - Para Marlos Barros

"A kiss may ruin a human life." -- In “A Woman of No Importance”
Oscar Wilde


Essas gretas construo
Com todos os meus gritos
E concretos de lágrimas,
Laringes de grafite,
Pranto, prece, papéis...
Que importam para mim

Os túneis sob as trevas?
Por que neles adentro,
Com medo? Por que em tudo
Trago o triste lembrar
De inúmeros tropeços?
Feito cego, de pedras,

De quedas, com os braços,
Por que me desvencilho?
Por que não me protejo
Do susto insuportável?
Por que nunca me lanço,
De vez, a todo risco,

À vasta vida? Nada
É possível querer?
Sonhos... Eis a metáfora
Que mui me ilude e fere-me,
Que me ilumina e forja-me,
Eis alma, seiva e carne,

Despidas, desgastadas, 
Entre tantas promessas,
Momentos e mancadas,
Dentro do labirinto
De palavras, sentidos,
De itinerários íntimos.

Por que não me refiz
Co' a alegria do encontro
Co' a métrica, co' o ritmo,
Quando estive sozinho,
Perdido, entregue às rimas,
À imensidão dos versos,

Entre as estalactites
De ferro dos acervos
Das livrarias todas,
Entre os fungos e os ácaros,
Ante as estalagmites
Das divisas dos sebos? 

Quantos mundos busquei, 
Quanto alimento e alívio,
Em segredo, sob sonos,
Consumindo-me, vivo,
Escavando um abismo
Sem fronteiras, infindo!

Meu ser em tudo pus,
Em tudo me finquei...
Supus-me assim Proteu.
Acreditei na forma in-
Alcançável do tempo,
No silêncio de Sísifo.

Amei o amor e quis
Fechar-me nos exílios
Dos impulsos, da angústia.
Afastei-me de mim...
Posso agora explodir:
Sou a faísca e a pólvora.